David Fincher | Do Pior Ao Melhor
David Fincher é meu diretor favorito.
Sendo, obviamente, um confesso fã de mistério e suspense, não poderia não amar a minha versão de Hitchcock, que sempre coloca entre seus trabalhos um tom de ironia sobre a nossa sociedade enquanto nos assusta com a obscuridade que encontra no ser humano.
Logo, não teria momento melhor de fazer uma lista com seus melhores filmes do que agora, na véspera da estreia de “Mank”, seu primeiro trabalho desde “Garota Exemplar”, e que será adicionado a lista após ser visto e revisto.
Mas, antes de irmos à lista propriamente, caso queiram conferir outros de nossos especiais, eles estão aqui:
Agora, vamos aos filmes. Como sempre, alerta moderado (no caso de Fincher, ALERTA MÁXIMO) de spoilers.
10 | alien 3
Seu primeiro filme nem é “dele” e o próprio diria, e diz, isso.
A continuação de dois dos melhores exemplares da ficção científica, “Alien 3” é uma bagunça do tamanho de sua produção, renegada por seu diretor que, ainda assim, fez o possível para o fazer parecer bonito e bem apresentado.
Mesmo assim, quando se fala em Fincher, é impossível não falar de seu primeiro “grande” filme, mas de maneira alguma ele faz qualquer diferença em seu legado.
9 | o curioso caso de benjamin button
Após duas de suas melhores performances terem vindo ao lado de Fincher, Brad Pitt envelheceu ao contrário, mas isso não o ajudou a conseguir o Oscar que viria apenas ao lado de Tarantino.
Baseado no conto de F. Scott Fitzgerald, “Benjamin Button” é um filme do medíocre para o razoável, que não deixa de ser impressionante tecnicamente e de provocar uma discussão hipotética capaz de municiar horas e horas de discussões e reflexões.
Ainda assim, um melodrama não é o que se espera de uma parceria anteriormente infalível, mesmo que os dois se esforcem como se esforçam aqui.
8 | quarto do pânico
É o que eu chamaria de filme conceitualmente econômico: uma situação inusitada e fascinante que, por si só, gera tensão o suficiente para duas horas.
Nascido de um roteiro não encomendado de David Koepp (o qual fora vendido por 4 milhões de dólares para a Sony) e baseado em notícias envolvendo quartos do pânico reais em diversas casas, “Quarto do Pânico” bombaria facilmente na Netflix se lançado hoje, mas empalidece perto do melhor material do diretor e principalmente de seu filme anterior (mas não podemos falar dele).
Um tanto balaqueiro demais em diversas sequências e abusando um tanto extra dos efeitos visuais em um filme que poderia facilmente ser feito sem eles, mas não deixa de ser uma sessão divertida, ainda mais em grupo e com boas performances de Jodie Foster, Kristen Stewart (!) e Forrest Whitaker.
7 | vidas em jogo
Poucos filmes vão te surpreender mais que este.
“Vidas em Jogo” se torna grandioso na mesma proporção que se torna introspectivo e, ao ir em duas direções completamente diferentes, te deixa na ponta da cadeira e sem quaisquer condição de descobrir o final.
Funcionando, literalmente, como um jogo dentro do filme e entre este e o espectador, falta pouco para chegar ao pelotão da frente de Fincher, e não chega apenas porque esse pelotão está, literalmente, em um patamar diferente.
Ainda assim, é um filme tenso, curiosamente complexo e com uma mensagem positiva sobre a escuridão da vontade humana. Fosse um pouco mais de acidez e… quem sabe.
6 | garota exemplar
Não sei se já vi qualquer personagem que me desse mais calafrios que a Amy de Rosamund Pike.
Adaptado por Gillian Flynn de seu livro de mesmo nome, esta legítima obra prima - que confunde gêneros na mesma proporção que confunde seu apreço por cada personagem - vai te deixar cada vez mais intrigado a cada novo desenrolar, apenas para descobrir que é ao assisti-lo de novo que finalmente perceberá o quão aterrorizante é tudo que assistimos.
Quase uma comédia romântica subvertida à enésima potência, “Garota Exemplar” pode ser melhor exemplificado por uma resposta oferecida por Amy à um questionamento de seu marido BatAffleck: “assim é um casamento”.
5 | millenium: Os homens que não amavam as mulheres
Colocá-lo a frente de “Garota Exemplar” e “Zodíaco” pode ser uma surpresa para muitos, mas não me incomodo nem um pouco em dizer que boa parte dessa decisão vem do meu apreço pessoal por toda a obra de Stieg Larsson.
Adaptado do primeiro livro de já conhecida trilogia e um remake do filme sueco, “Millenium” é a melhor série de filmes que nunca aconteceu, nos mergulhando no mundo frio e cruel onde seus personagens habitam e nos deixando magnética e perigosamente atraídos por ele e, principalmente, por sua protagonista, a magnífica Lisbeth Salander, trazida à vida por uma Rooney Mara desaparecida nas escuras profundezas da personagem.
Visualmente arrebatador, com sequências inesquecíveis, uma mensagem feminista mais do que atual e relevante, e tirando o melhor do complexo quebra cabeça montado por Larsson, o filme ainda se dá ao luxo de se estender por mais de 15 minutos após seu chocante clímax, sem jamais perder o interesse.
Os filmes de Fincher tem a rara qualidade de mostrar nossos mais profundos desejos, mas nenhum de forma tão latente como este que, de acordo com o próprio, mostra que todos somos, de uma forma ou de outra, pervertidos - e perversos.
4 | zodíaco
Indiquei Zodíaco a um amigo que ficou indignado comigo. “Como que no final eles não pegam o cara?!”
Bem, não deveria ser uma surpresa/decepção - ou spoiler - quando o filme é fielmente baseado em fatos reais.
E “Zodíaco”, por mais cinematográfico que seja, passa o mais próximo possível de simular a realidade do processo investigativo, de uma sede de jornal e, porque não, da influência e sensacionalismo criado em torno do assassino que nunca fora pego.
Uma história fascinante por si só, Fincher não quis ampliar seu impacto, optando por uma abordagem calculada, paciente e que culmina em uma das melhores cenas que já vi em qualquer filme do gênero.
Talvez seu filme mais difícil - e até burocrático -, “Zodíaco” é, praticamente, como uma viagem no tempo.
3 | a rede social
Essa biografia, listada em vários sites como o melhor filme da década, não recebeu tanta atenção por nada. Mas sim mereceu seu espaço em cada uma daquelas listas.
Jesse Eisenberg interpreta um Zuckerberg arrogante, misógino, solitário e odiável e a parceria de Fincher com Sorkin se provou fantástica em diversos níveis porque quando a direção, focada e sóbria de Fincher, se mistura com os diálogos perdidos, atravessados e cheios de significado de Sorkin, é mais fácil entender como funciona a mente de um poderoso gênio em Harvard que, na verdade, acabou de sair da adolescência.
Apesar de a história aqui parecer ser somente sobre a trajetória entre ele, Eduardo Saverin e o Facebook, fala muito de forma sútil, mas potente sobre a sociedade em que vivemos hoje. Até porque, se vivemos nas condições de vício por atenção na internet, completo descontrole sobre nossos próprios dados e relacionamentos moldados pela forma que a internet decide moldar, é porque há uns anos atrás um nerd cheio de problemas consigo mesmo decidiu criar um site para que todos pudessem compartilhar desses problemas também.
1 | clube da luta
Falo para quem quiser ouvir: “Clube da Luta” é meu filme favorito. E por muito pouco não o coloquei em segundo lugar na lista do meu diretor favorito. No fim, não consegui.
Talvez um dos filme mais falados dos últimos 25 anos (ironia, não?), é possível dizer que ninguém estaria preparado para um soco no estômago como esse, vindo de dentro, que te faz repensar e rever tudo que faz na vida, ou simplesmente te deixa irritado e, quem sabe, até enojado com o excesso de masculinidade que, com certeza, inspirou coaches e mais coaches por aí.
É possível que seus detratores não tenham o entendido, mas com certeza estes últimos não o entenderam.
A par de todo seu mérito técnico, interpretativo e autoral, David Fincher captura o espírito da obra de Chuck Palahniuk como ninguém poderia, em um filme que mistura gêneros, engana a todos e marca, para o bem, ou para o mal, todos que o assistem.
Todos vamos, inevitavelmente, desrespeitar as duas primeiras regras.
1 | seven
Várias vezes já tentei escrever sobre “Seven”, em nenhuma me julguei capaz de apontar qualquer coisa além do que Pablo Villaça fez em um dos melhores textos críticos que já li na vida, então os convido a o lerem também.
Então, serei breve.
O suspense é meu gênero favorito e me lembro claramente da primeira vez que assisti “Seven”, talvez novo demais para seu conteúdo pesado, mas certamente novo demais para compreender sua complexidade.
Se preocupando menos com revelações, mais com a construção da caixa de pandora, que seria aberta apenas na sequência final e revelaria apenas o caos, chega a ser impossível acreditar que David Fincher possa superar o nível absolutamente ridículo atingido no que foi, basicamente, sua estreia no cinema. Cada milímetro da projeção é repleto de significantes e significados, que tanto nos preparam para seu catastrófico fim, como nos fazem prestar atenção na crueldade de seus meios.
Por isso, quando o detetive Mills pergunta: o que há na caixa. Já sabemos a resposta muito antes dele. Mesmo que não saibamos ainda.
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