Os 10 Melhores Álbuns de 2014
2014 não foi, nessa década, um dos melhores anos para a música.
Sim, tivemos diversos acontecimentos importantes e alguns lançamentos musicais de altíssima qualidade, no entanto, em quantidade menor em relação aos outros anos. Fazer a seleção dos 10 melhores discos desse ano foi razoavelmente mais fácil do que dos outros. Contudo, isso não tira em nada o mérito dos álbuns escolhidos.
Estes são os melhores álbuns de 2014:
10 | The Hotelier - Home, Like Noplace is There
Em uma década não muito vantajosa para o gênero, a banda americana The Hotelier conseguiu emplacar alguns bons álbuns de emocore, boas letras, boas melodias e arranjos muito bem trabalhados. Nada novo, o emo continua no ostracismo, esperando algum tipo de revival para dar aquela sobrevida ao gênero, mas Christian Holden com certeza o eleva ao seu nível mais alto nesse disco. Letras com metáforas interessantíssimas como a doce “Housebroken”, Holden fala da experiencia de observar um relacionamento abusivo de longe e comparar com a relação - também abusiva - de um filhote de rua resgatado pelo seu dono violento.
“And when you were a pup, I watched you so close
You ran straight to the distance allowed by his rope
You got kicked, you got choked, phrases crept up your spine
When he said "we must keep our bitches in line"
And on his poker nights he says the same of his wife
He's the top dog/pack leader/true alpha-male”
Com as obvias influencias de seus antecessores: Cap n’ Jazz, American Football e Brand New. A banda consegue um feito poucas vezes atingido no emocore: um álbum sério, emotivo, mas sem ser imaturo ou ansioso. Um álbum que tem plena noção que os ouvintes do gênero não são mais adolescentes, já são adultos com problemas reais, filhos e família.
9 | Mac DeMarco - Salad Days
Mac DeMarco, quando lançou Salad Days, já tinha nos apresentado o que existia de mais pessoal em seu trabalho. A voz descompromissada, as letras bobamente doces e as guitarradas que lembram o que poderia ser um ensaio qualquer de Lou Reed. No entanto, seu álbum de 2014 se mostra um ponto de virada no que diz respeito a sua maturidade como artista. Não há uma faixa descompensada aqui, ou que não faça sentido dentro do álbum. Alguns dos melhores trabalhos de Mac se encontram em “Salad Days”, um disco sobre amor e emoção na contubarda vida urbana que muitos de nós levamos. Tudo isso, fazendo parecer que o mundo inteiro não passa do seu pátio.
Melhores faixas: Salad Days, Let Her Go, Blue Boy, Chamber of Reflection.
8 | Lana Del Rey - Ultraviolence
Quando Ultraviolence foi lançado, Lana Del Rey ainda não tinha tomado a proporção como cantora, compositora e estrela, que tem hoje. Porém, o status de queridinha estabelecido pelo disco anterior, “Born to Die”, e seus hits, forneceu expectativa para um segundo lançamento bombástico. Lana decidiu virar essa expectativa de cabeça para baixo. Sim, “Ultraviolence” se mantém pop e razoavelmente acessível, mas não segue as mesmas fórmulas e batidas de “Born to Die”. A produção é injetada por rock, Lana está melhor vocalmente e produz um trabalho que, apesar de não chegar a conceitual, estabelece uma narrativa mais concisa. “Ultraviolence” é Lana Del Rey incorporando a personagem da amante de um astro do cinema dos anos 60 ao último nível. Um disco que exala glamour, Califórnia e relacionamentos abusivos de um jeito tão romantizado que quase nos faz esquecer o quanto de errado esses tempos tinham - só não nos esquecemos pois a crítica é, mesmo sem ser explicita, constantemente presente
Melhores faixas: Cruel World, Ultraviolence, Shades of Cool, The Other Woman.
7 | Sun Kil Moon - Benji
Absolutamente não é limites entre a intimidade de Mark Kozelek e do ouvinte em “Benji". Mark nesse projeto conta 11 histórias diferentes, sobre a vida e morte de 11 pessoas diferentes, nas 11 músicas que constituem o álbum. E além da narrativa completamente imersiva e incrível nas letras das musicas, os arranjos são de enorme bom gosto e mínimos no melhor sentido da palavra, sem nenhum elemento desnecessário que possa tirar a atenção completa das palavras e melodias de Kozelek.
Melhores faixas: Carissa, I Can’t Live Without My Mother’s Love, Ben’s My Best Friend.
6 | Travis Scott - Days Before Rodeo
Days Before Rodeo foi a primeira amostragem de Travis para o rap mainstream, e também a mais consistente e ousada até agora. Com pouquíssimos recursos disponíveis para a gravação da mixtape. Scott conseguiu reunir nomes talentosíssimos para a produção de suas batidas. Nomes renomados como Metro Boomin’, FKi e WondaGurl ajudaram a construir a atmosfera escura, quase como um thriller dos anos 90. A tematica do álbum é constituída em cima dos graves, os 808 kicks fazem questão de martelar com violência a cada faixa. Participações inusitadas e interessantes dão a pitada de sal necessária para um dos melhores projetos de rap do ano. Big Sean, Migos e a banda britânica de pop punk The 1975 fazem participações importantes e pontuais.
Melhores faixas: The Prayer, Mamacita, Drugs You Should Try It, Grey.
5 | Freddie Gibbs & Madlib - Piñata
O primeiro projeto em conjunto do lendário produtor Madlib com o rapper norte-americano Freddie Gibbs. Desde 2013 entregando projetos consistentes, o Freddie faz sua melhor performance, sem ser ofuscado nem um minuto pelas beats de alto nível de Madlib. As batidas consistem em uma variedade de samples de soul, jazz e música latina. Os samples doces de músicas da década de 70, 80 e 90 em contraste com as letras agressivas de Gibbs: que faixa sim, faixa não, fala sobre a vida do crime, falta de confiança nas autoridades e ostenta o dinheiro, também oriundo da vida marginalizada que Gibbs levava antes da sua carreira musical.
Melhores faixas: Real, Shitsville, Deeper, Thuggin’
4 | FKA Twigs - LP1
R&B, pop, electronica, dance. Palavras que não costumam ser atribuídas a um disco denso, noturno, intimista e até mesmo soturno, em alguns momentos, como esse.
O disco de estreia de FKA Twigs está entre um dos melhores de 2014 e da década. A artista e compositora britânica ganhou a atenção da indústria com seus primeiros EP’s, “EP1” e “EP2”, e em seu primeiro álbum, Twigs parece ter tido o tempo e os recursos hábeis para entregar um trabalho extremamente bem acabado. O que temos aqui é pop experimental de altíssima qualidade. A compositora aborda temas amorosos, sexuais e sociais com sagacidade, e é possível perceber a influência de Janelle Monáe em suas composições. Contudo, a sonoridade e as experimentações musicais que Twigs realiza são, no mínimo, autênticas. Um disco atemporal, desprendido das tendências de sua época e que marca o início de uma discografia com um potencial brilhante.
Melhores faixas: Two Weeks, Pendulum, Lights On, Give Up.
3 | Sharon Van Etten - Are We There
Sharon Van Etten tem uma das discografias mais respeitáveis desse século, e novamente figura aqui, dessa vez numa posição de destaque que realmente merece, no top 3. Are We There é um dos mais, se não o álbum mais especial dessa carreira de muitíssimos altos e poucos baixos. Delicado, as vezes; mas sempre emocionante, sem falta. Are We There fala sobre o fim de ciclos, no caso de Sharon, de um relacionamento de longa data; mas também o fim daquela chance que você desperdiçou com dor no coração, daquele grupo de amigos que você sente saudades até hoje, e nunca entendeu muito bem o porquê do afastamento; o fim daquele ciclo de ócio que você sabe que não vai mais sentir igual até o dia da sua aposentadoria. Sharon aborda esses assuntos tão delicados com a naturalidade já conhecida dos seus ouvintes.
Are We There é ao mesmo tempo tão diferente dos seus álbuns anteriores, mas ao mesmo tempo mescla elementos de todos. A produção, mais calculada e de maior porte, não disfarça completamente a característica natural de singer-songrwitter da nossa querida Sharon.
Melhores Faixas: Afraid Of Nothing, Your Love Is Killing Me, Nothing Will Change, Everytime The Sun Comes Up.
2 | D'angelo - Black Messiah
A volta de D’Angelo depois do hiato gigantesco de quase 15 anos quase não poderia ser mais épica. Michael Eugene Archer, tesouro americano, rei do R&B moderno e do Soul psicodélico, dono de uma das vozes mais inconfundíveis do gênero e também um músico de individualidades marcantes; dessa vez com a banda The Vanguard, agregou suas individualidades com a diversidade de gêneros da banda norte-americana. O soul cadenciado se divide, se molda, se transforma; mesclado e muito bem escondido no meio dos baixos marcados e das guitarras agressivas e hiperativas, que estão presentes em todas as faixas do disco, sendo o maior pilar de sustentação das composições nessa volta de D’Angelo. A banda é virtuosa e claramente fica em evidência como um destaque positivo, assim como a postura mais madura das composições e dos vocais, os falsetes tão aclamados no seus trabalhos anteriores, aqui dá lugar ao registro médio da voz do cantor.
A pluralidade de ritmos, gêneros, e instrumentos explorados de maneira impecável em Black Messiah é assustadora: neo soul, rock psicodélico, jazz, funk. É um acréscimo valiosíssimo na discografia de Michael Archer, e uma audição quase que obrigatória a qualquer apreciador da boa música.
Melhores faixas: Ain’t That Easy, 1000 Deaths, Really Love, Prayer.
Menções Honrosas: Justin Timberlake, The 20/20 Experience; James Blake, Overgrown; Haim, Days Are Gone; Chance The Rapper, Acid Rap; Earl Sweatshirt, Doris.
1 | St Vincent - St Vincent
Tradicionalmente, os artistas musicais costumam lançar seu primeiro disco como o auto-intitulado. Como se o fato de estar lançando um álbum pela primeira vez fosse razão para que, este disco, seja o marco definidor de quem você será como artista. Talvez essa ideia fizesse mais sentido até os anos 90, quando ainda havia uma hegemonia de poder das gravadoras, hoje, parece um hábito datado na indústria.
Da mesma forma que Beyoncé fez em 2013, St. Vincent também aguardou um ponto de clareza e autoconhecimento artístico para lançar seu álbum auto-intitulado. Só em 2014, como seu quarto álbum de estúdio, lança “St. Vincent”.
Annie Clark é uma exímia guitarrista, cantora e compositora. Até hoje, não lançou nem um disco ruim, tudo que a artista produz costuma ser acima da média. Seu álbum de 2014, no entanto, é sua obra mais experimental. Seus talentos aqui somam-se, um complementando o outro, num álbum que não tem uma narrativa mirabolante ou um grande conceito: é apenas um punhado de músicas excelentes, com produção coesa e ordenadas de forma perfeita.
A experimentação leva seu rock psicodélico de encontro ao eletrônico, utilizando de múltiplos recursos de produção para criar o que parece um protesto robótico contra sua própria existência. Os temas abordados nas letras são cuidadosamente tratados dessa forma também, mesmo as faixas mais sentimentais parecem “cautelosas”, como se escritas por uma “aprendiz” de humanidade, há um quê de “Wall-E”.
Com certeza, não é um disco feito para todos. Com guitarras pungentes e uma produção arrojada, é quase difícil chamar de pop o que St. Vincent entrega nesse álbum. Porém, aqueles que se propuserem a ouvir a obra buscando entender a proposta, tem maior probabilidade de se apaixonarem por este trabalho. Levaram anos para Annie Clark “definir-se” artisticamente, e a espera por esse álbum auto-intitulado parece ter valido a pena. Se fosse preciso explicar como St. Vincent se define com esse disco, uma possibilidade seria dizer que ela integra o clichê, mas real, grupo, de artistas “a frente do seu tempo”.
Melhores faixas: Rattlesnake, Birth in Reverse, Huey Newton, Digital Witness, Psychopath, Several Crossed Fingers.