Melhores Filmes da Década: 2010s | Terror

Categorizar obras em gêneros específicos é uma tarefa árdua em qualquer área da arte, mas, no cinema, isso se torna ainda mais difícil. Porém, ainda na nossa série de melhores da década, decidimos listar os melhores filmes de alguns gêneros (os quais conseguimos juntar exemplares o suficiente) que se mostraram mais relevantes na sétima arte nestes últimos 10 anos.

Confira nossas outras listas temáticas:

Musicais

Suspenses

Ficção Científica

Romance


No último Halloween dos anos 2010, decidimos olhar para trás (algo que não é muito aconselhável se estiver sozinho no seu quarto agora) e listar o que de melhor o cinema de terror teve a oferecer nestes últimos 10 anos.

Entre espíritos, monstros, entidades e outras tantas criaturas, apenas escolher as fotos para este top já foi uma tarefa árdua, então caso queiram comemorar o Halloween da melhor maneira neste final de semana, aqui vão os dez melhores filmes de Terror dos anos 2010.

E, é claro, alertamos para spoilers moderados.


10 | a entidade

insidious.jpg

O primeiro plano de A Entidade já demonstra algo de diferente. Uma sensação de desconforto já nos é imposta instantaneamente e simplesmente não há para onde olhar. Ela não cria dúvidas ou estranheza, apenas choque.

No mais, que grande pai se mudaria com a sua família para uma casa onde recentemente um casal e dois filhos haviam sido brutalmente assassinados e a terceira criança havia sumido apenas como inspiração para escrever seu próximo livro. Ethan Hawke, por falta de uma boa nova história em seu currículo, insiste em ignorar todo e qualquer sinal de que algo está errado. Mais que isso, quando o protagonista acha uma caixa com filmes familiares gravados com uma Super 8 o fascínio pelos assassinatos que aconteceram naquele local e por uma criatura aterrorizante começam a tomar conta de seu espírito. A partir daí, o filme fomenta medo através de sua atmosfera arrastada e gira em torno do personagem de Hawke. O ritmo aqui é lento, a ponto de tornar a nossa própria respiração um grande fator.

Mas como a maioria dos filmes do gênero, A Entidade não foge dos clichês. Talvez isso seja o mais impressionante. Com todas suas convencionalidades e previsibilidades o filme ainda é mega efetivo. Daqueles que te fazem ter medo de sair da cama pra ir ao banheiro no meio da madrugada.


9 | as boas maneiras

anomalisa.jpg

O Brasil nunca foi um país conhecido por seus filmes de terror e fantasia. São as comédias, dramas e filmes baseados em histórias reais que costumam se destacar nas bilheterias e na crítica. Então a surpresa foi grande quando Juliana Rojas e Marco Dutra lançaram um longa de terror fantástico que só poderia ter sido feito aqui.

“As Boas Maneiras” mistura o drama social com o terror clássico, incluindo elementos do folclore nacional. Com isso, o longa cria um universo fantástico que, apesar de incorporar muitos elementos da fantasia, consegue retratar relações de trabalho, raciais e de gênero do país com muita fidelidade.


8 | invocação do mal

invocação.jpg

Um dos maiores sucessos recentes do gênero, este filme de James Wan não é, de forma alguma, inovativo nas convenções que aplica. Você sabe que os móveis vão se mexer, você sabe que as luzes vão se apagar, você sabe que não se deve, em hipótese alguma, ir ao porão no meio da noite.

Mas, ainda assim, você se assusta do mesmo jeito.

Graças às habilidades de seu diretor, este é um filme que, além dos sustos e do impacto duradouro que provoca, também é eficaz em sua reconstrução de mundo, ao passo que constrói uma dinâmica verdadeira e plausível entre o casal Warren. É raro, também, o filme de terror que consegue, ao final de sua projeção, deixar uma mensagem ressonante que serve mesmo quando nossos principais problemas não são fantasmas, monstros ou espíritos.


7 | it

it.jpg

Não é necessário ter lido a obra de Stephen King para ter medo de palhaços. Eles são assustadores por si só. Se você leu, bom, pior pra você.

Dito isso, IT não é propriamente um filme de terror. Há muitos elementos cômicos e dramáticos - e porque não, românticos - andando lado a lado com o medo que o filme passa. Logo, temos algo que dificilmente vemos em filmes do gênero: Peso emocional e bons personagens.

Logo de cara nos são apresentados os irmãos Georgie e Bill. Um dia chuvoso em uma cidade sombria e Bill, ao invés de, como toda pessoa sensata, coagir seu caçula a ficar em casa, construiu um barquinho para Bill brincar debaixo de uma tempestade. Na sequência a seguir - uma das melhores de 2017 - nos são apresentadas três principais pontos que viriam a mover a narrativa. A morte de Georgie - tido como desaparecido -, a apresentação de Pennywise e a culpa que Bill carregaria. Essa mesma culpa o juntou com outras 6 crianças que não se encaixam no padrão e que suportam seus próprios problemas pessoais. Tudo sobre o grupo de “perdedores” é cativante e todos os seus traumas são sentidos pelo público, o que só amplifica o terror quando Pennywise aparece em tela para inflamar esses traumas e transformá-los no pior pesadelo das crianças.

Falando em Pennywise, tudo sobre o palhaço é aterrorizante. Seu visual, voz, risada e principalmente seus olhos, enormes e inertes, e seu sorriso desconfortante são paralisadores. Além disso, Pennywise não é o tipo de criatura que ataca suas presas a noite e a fotografia do filme faz questão de destacar as características mencionadas. Composições visuais claras e sem distrações secundárias prendem a atenção na expressão do palhaço, como se nos impedisse de buscar alguma válvula de escape.

Enfim, Stephen King supervisionou tudo aqui. Claro que o filme não consegue criar a mesma atmosfera das palavras de um dos maiores autores de histórias de terror da geração, mas, com ele concordando com o resultado final da produção, IT se traduziu das páginas para as telas como um dos melhores filmes de 2017 e um dos melhores terrores da década.


6 | um lugar silencioso

quiet.jpg

O primeiro filme dirigido por John Krasinski, que teria tudo para cair em território de nepotismo ao escalar a esposa, Emily Blunt, e a si mesmo, se mostrou um dos filmes mais inovadores e originais do gênero em muito, muito tempo.

Tecnicamente, é um filme de terror inovativo e apavorante, que apresenta um design de som minuciosamente trabalhado e é capaz de te fazer saltar da cadeira com o menor dos barulhos. Alegoricamente, é um filme sobre família, sobre paternidade e maternidade, sobre ir ao limite para proteger aqueles que ama, sobre sacrifícios e, também, sobre ter fé mesmo nos piores momentos.

Ao juntar estas duas faces, temos um filme de terror único em sua concepção e que funciona em diversas escalas e que, tomara, não caia na armadilha de acreditar que um universo expandido seja a melhor forma de explorar seus temas.


5 | hereditário

hereditario.jpg

Volta e meia, filmes de terror lançados na temporada de festivais tendem a ser comparados, favoravelmente, a um dos maiores clássicos do gênero. “Hereditário” foi um destes a ser chamado de o novo “Exorcista”.

Aterrorizante e capaz de te deixar perturbado muito após o final dos créditos, este filme de Ari Aster talvez nem tenha como forte seu componente do medo, mas sim o drama central envolvendo a família Graham que, representada principalmente pela performance agoniante de Toni Collette, começa a se destruir por não saber lidar com a perda de um de seus membros.

É um longa que mostra como a depressão, e o remorso, podem ser mais perigosos do que qualquer espírito maligno. Que mostra que, na maioria das vezes, as coisas que nos aterrorizam talvez nem sejam reais e que as pistas para remontarmos a nossa vida está escondida em cantos que preferimos ignorar.

Sugestivo, ambíguo, e tecnicamente impecável, “Hereditário” é um filme sobre a morte e sobre como lidamos com ela, como ela nos muda e como não devemos viver nossas vidas nos preocupando em excesso com algo que sabemos que, um dia, vai chegar.


4 | corrente do mal

it follows.jpg

Clássico no terror slasher é a presença da ‘final girl’, a garota “pura” e inteligente que consegue se salvar de todos os assassinatos e, ensanguentada mas vitoriosa, sobrevive. E se sabe que, para que a sua rotulação como ‘final girl’ seja completa e ela se mantenha protegida do assassino, a personagem deve ser virgem, possuir características “masculinas” e ser moralmente e intelectualmente superior a todos aqueles ao seu redor. Em “It Follows”, esse clichê é um dos primeiros a ser subvertido: a protagonista Jay, feminina e ingênua sem ser culpabilizada por isso, luta bravamente contra uma entidade perseguidora assassina e descobre que a única maneira de se proteger é, vejam só, transando com alguém.

Além da originalidade no roteiro, um outro grande acerto desse terror é a sua ambientação. É fácil perceber que o universo singular da história cria o aspecto ilusório de sonho através do seu posicionamento em um período de tempo indeterminado, uma fotografia autêntica e uma trilha com sintetizadores que nos deixa angustiado e admirado.

Revitalizando a linguagem dos slashers, “It Follows” traz a mensagem de que a morte é inevitável e vai continuar nos seguindo para sempre, não importa o quanto corrermos. Por isso, o melhor a fazer é caminhar com tranquilidade.


3 | babadook

SPIDERVERSE.jpg

A diretora australiana Jennifer Kent é um dos bons exemplos positivos do que foi possível fazer nessa década por causa da popularização do acesso aos filmes. Seu filme “O Babadook” (2014) apesar dos destaques em festivais não foi distribuído mundialmente e mesmo em países de língua inglesa teve circulação restrita, mesmo assim foi um grande sucesso. Tem sido cultuado entre os fãs do gênero e fãs de cinema no geral pelas suas qualidades técnicas e a capacidade de tocar em temas importantes com esmero e sensibilidade.

A verdade é que os temas de maternidade, depressão e outros abordados podem e têm sido desenvolvidos em diversos gêneros o que faz a escolha da diretora pelo terror empolgante e criativa. A história de Amelia e Samuel Vanek (Essie Davies e Noah Wiseman), mãe e filho que lidam com a perda do pai no dia do nascimento de seu filho. Samuel tem pesadelos e é incontrolável o que torna a vida de sua mãe pesada, com dificuldade ela vai tentando criar seu filho sozinha da melhor forma possível. A vinda do monstro Babadook direto de um livro da estante de Samuel para matá-los cria os tons de terror, bastante efetivos, e fazem Amelia se confrontar com ela mesma e suas dificuldades enquanto mãe e mulher na sociedade. 

As metáfora com depressão são precisas e aterrorizantes, porque tal qual a doença, o Babadook é um monstro, que não deixa você escapar e em qualquer momento e lugar, por mais seguro que pareça, lá estará ele para desestabilizar e amedrontar a protagonista. “O Babadook” é um filme capaz de não só assustar, mas aterrorizar a audiência, pois além de um monstro muito bem construído em tela, ele conversa com os medos dentro de cada um de nós, de certa maneira sua maneira sua narrativa se constrói no subjetivo do seu espectador tanto quanto na tela. É um excelente filme realizado com perícia cada vez mais rara no cinema, uma brilhante experiência.


2 | a bruxa

the witch.jpg

Se tem um gênero que povoa o imaginário sobre as possibilidades do cinema em discutir tabus morais, certamente terror é ele e apesar de nem sempre os filmes cumprirem esse potencial, há de tempos em tempos um filme de terror que tome ação nos temas sociais mais centrais. Esse é o caso de A Bruxa (2016) dirigido pelo estreante Roger Eggers. O filme traz a história de uma família na colônia da Nova Inglaterra durante o começo do Século XVII (primeira geração a colonizar o território da América do Norte). As colônias britânicas nas américas foram, nesse período, carregados de forte dados do Puritanismo, uma corrente do calvinismo. Entre as principais doutrinas religiosas desse grupo estava a predestinação: uma ideia de que se o destino não for favorável, o problema é da própria falta de fé em Deus e dedicação ao trabalho. Ao fim do Século XVII, as práticas que ficaram conhecidas como “Caça às Bruxas” tiveram como motivo, também, a falta de sorte dos colonos economicamente e a necessidade de encontrar culpadas por terem enfraquecido o amor de Deus.

“A Bruxa” já parte com todas essas considerações históricas e religiosas pois no filme, a escolha temporal não é apenas estilística ou visual, Eggers integra nos diversos aspectos narrativos elementos para recriar o ambiente dos puritanos pós colonização. A utilização dos textos religiosos e produções morais sobre o corpo e a ética clamam o filme como um comentário sobre a formação da sociedade norte-americana e seu imaginário constitutivo. A história se dá em torno de uma família expulsa da sua cidade que precisa construir sua vida fora dos muros de proteção e dependem apenas de sua fé para isso. Os dois adultos, quatro crianças e seu bode preto tem a sua própria jornada e à medida em que a situação deles vai piorando cada um revela a sua própria identidade e desmoronam moralmente em frente a câmera. 

Não há intenção de criar qualquer expectativa no público que a história vá se desenvolver para além de uma grande tragédia. Desde o primeiro minuto a atmosfera é opressiva e ofegante, a fotografia é construída meticulosamente para criar uma sensação de vazio e preenchimento refletido sobre cada personagem e preparar o público para a degradação que está por vir. Por fim, traz como seu maior fruto a possibilidade de diversos debates sobre moral, costumes, machismo e religiosidade, executando cada uma dessas camadas simultaneamente de maneira que as interpretações podem se completar e funcionar separadamente. Roger Eggers certamente fez em “A Bruxa” um filme marcado no hall de clássicos do cinema e merece todos méritos por isso.


Menções Honrosas: Sobrenatural (2010); O Segredo da Cabana (2011); A Visita (2015); Fragmentado (2016); O Homem Nas Trevas (2016); Invocação do Mal 2 (2017); No Cair da Noite (2017); Nós (2019).


1 | corra!

get out.jpg

Quando nasceu a polêmica sobre “Get Out” ter sido incluído no gênero Comédia ou Musical para a premiação dos Golden Globes, Jordan Peele brincou twittando que seu longa era, na realidade, um documentário. O que é engraçado - ou não - é que tanto a sua piada quanto a situação absurda que o fotógrafo Chris vive na história do filme têm um fundo de verdade. “Get Out”, indiscutivelmente, mete medo no espectador. E esse medo não vem do lado mais imaginativo do filme, mas sim de todas as cenas que já são, dolorosamente, um retrato racial da realidade contemporânea.

“Get Out” mostra um horror muito sentido, mas pouco contado. Os medos de um homem negro nos Estados Unidos são completamente opostos aos da família branca residente de uma casa enorme que já estamos fartos de assistir. E quando os papéis são invertidos e a família branca se torna a vilã da história, surge este terror de thriller-social aflitivo e incisivo, capaz de utilizar a linguagem clássica do gênero ao seu favor.

Um dos clichês usado extensivamente em filmes de terror, por exemplo, é aquele em que o carro da polícia chega no final da história para sinalizar que tudo vai ficar bem. As luzes azul-vermelha piscam dando a entender que o final feliz proporcionado por um ambiente seguro se aproxima graças à justiça dos oficiais. Nas cenas finais de “Get Out”, o roteiro brilhante de Peele desconstrói esse sentimento de tranquilidade e consegue nos deixar apavorado assim que o carro da polícia chega. Graças ao contexto, as luzes são ressignificadas e tudo o que sobra para nós e nosso herói é a apreensão, o pessimismo e o terror. Ser negro na América (sim, no continente todo) é assim.

Como todo bom filme, este nos coloca na pele do protagonista. Como todo ótimo filme, este o faz de maneira subversiva. E é por isso que “Get Out” é o melhor terror da década.

Anterior
Anterior

Crítica | Stroke Of Genius

Próximo
Próximo

Blade Runner… 2019