Os 10 Melhores Filmes de 2014

A segunda década do século 21 está chegando ao fim e para comemorar (?) decidimos retornar à todos os anos desde 2010 e listar os melhores álbuns, filmes e músicas de cada um.

Listas dos anos anteriores:


A simples ideia de listar obras de arte é um exercício de futilidade. Porém, a vida não vale a pena ser vivida se não for, também, comentada, analisada e pensada. Por isso, muitos de nós somos apaixonados por listas dos mais variados tipos mesmo que raramente, se alguma vez, elas reflitam com exatidão nosso gosto pessoal.

Portanto, e dentro da proposta do site de listarmos os melhores de cada ano da década, decidi me entregar à tarefa de listar os melhores filmes de cada ano, assistindo e re-assistindo dezenas, até centenas, de obras no processo.

Abaixo, falo sobre aqueles que considero os melhores de 2014, ano do infame 7 a 1:


10 | o abutre

night.jpg

Em umas das primeiras aulas na faculdade de jornalismo, aprendemos que o que mais vende em relação aos noticiários é o SS, sigla para sexo e sangue.

Você já se perguntou do que seria dos noticiários televisivos sem a tragédia? Como os mesmos atrairiam tanta atenção, ou até mesmo influenciariam o comportamento de toda uma nação sem histórias e imagens chocantes que, contadas da forma mais benéfica para quem as distribui, mudam totalmente seu contexto e sugerem verdades tão sensacionais que temos o prazer de acreditar em sua veracidade?

Com mais uma performance magistral de Jake Gyllenhaal - terrivelmente esnobado na temporada de premiações -, vemos um filme que, acima de tudo, é sobre a natureza obscura do ser humano e como todos nós somos, de alguma forma, consumidores e produtores deste mundo podre que vemos na tela.

Confira a crítica completa


9 | selma

LOBO.jpg

Poucas figuras históricas são tão santificadas como a de Martin Luther King, principal líder da luta por direitos civis da comunidade negra nos Estados Unidos. Talvez exatamente por isso o filme de Ava Duvernay seja tão raro, pois apesar de mostrar a integridade dos valores defendidos por King, faz questão de colocá-lo como o um ser humano que, assim como todos os que o seguiam, possuía medos, receios e dúvidas.

David Oyelowo - terrivelmente esnobado na temporada de premiações² - encarna Martin Luther King com uma força avassaladora, desde a semelhança física à paixão no modo de falar, mas, principalmente, na sabedoria e paciência, nunca acreditando que seu tão sonhado sonho estivesse realmente próximo, mesmo que nunca o perdesse de vista.

A maior virtude de “Selma” é mostrar como a luta por direitos não passou pelas mãos de um único homem que, mesmo com multidões à seu lado e com um legado vivo na sociedade, não conseguiu erradicar um problema que ainda a aterroriza, mais de 50 anos depois.

Confira a crítica completa


8 | o lobo atrás da porta

FROZEN.jpg

O cinema brasileiro é como aquele pequeno e velho quiosque, na beira de Copacabana, que os mais afortunados da população tiveram a oportunidade de passar por, mas não o interesse de entrar por acreditar que tudo que foram para ver estava do outro lado calçada ou no topo dos morros. Porém, todo aquele que sentou e, de lá, apreciou o belo mar a sua frente enquanto tomava a melhor água de coco da sua vida, jamais conseguirá pisar na cidade sem retornar àquele lugar que parece só seu. Já os que passaram reto, vão torcer o nariz sempre que tentarem ser convencidos de que deveriam, sim, dar uma chance.

Após uma metáfora longa demais para um top 10 atrasado de filmes de tal respectivo ano, é uma pena que este longa dirigido por Fernando Coimbra não tenha sido descoberto pela grande maioria do público brasileiro. Impulsionado por uma performance assustadora de Leandra Leal - facilmente uma das cinco melhores performances femininas do ano, no mundo - , “O Lobo Atrás da Porta” é um exercício de tensão absoluta justamente por esconder a índole de sua personagem principal até o final.

E se pensar que as próximas duas moças não seriam as personagens mais aterrorizantes desta lista…

Confira a crítica completa


7 | sob a pele

DALLAS.jpg

Já presente em nossa lista de melhores ficções da última década, o longa de Jonathan Glazer é um projeto único e ousado. Além de sua temática repleta de metáforas e alegorias sobre a figura da mulher perante a sociedade - e a si mesma -, ao se utilizar do recurso das câmeras escondidas o diretor extrai de Scarlett Johansson a melhor performance de sua carreira até então, encarnando uma criatura com complexos conflitos internos que nunca são verbalizados justamente por serem alienígenas para a própria.

Com um final perturbador e indubitavelmente marcante, “Sob a Pele” é um filme difícil e quase inacessível, mas que, dado a devida atenção, deve marcar profundamente todos aqueles que, assim como os muitos seres humanos reais que vemos na história, se sentirem irremediavelmente atraídos pela beleza e performance magnética de uma das mais belas e talentosas atrizes de sua geração.


6 | garota exemplar

A cena inicial de “Garota Exemplar” é uma das mais bem construídas da carreira de um diretor responsável por clássicos e mais clássicos neste gênero que tomou para si desde os anos 90. Com uma narração tranquila de Ben Affleck, descobrimos que ele queria apenas uma coisa: quebrar a cabeça da esposa para saber o que ela estava pensando.

É verdade, sou um fã confesso do diretor e, por isso, exemplifico meu apreço pela Amy de Rosamund Pike ao constatar que ela seria capaz de encarar de frente Tyler Durden, Jon Doe ou o Zodíaco sem piscar ou tremer, enquanto podemos nos deliciar com a ideia de um confronto entre ela e Lisbeth Salander, onde seria impossível dizer qual das duas é mais implacável.

Um retrato distorcido, mas estranhamente verídico sobre o casamento, “Garota Exemplar” vai te deixar tenso e, mais do que isso, vai te provocar calafrios ao ver que entrou de cabeça em uma história onde ninguém merece sua confiança.

Poucos fazem - ou fizeram, na história do cinema - suspense como David Fincher. E digo isso da forma mais imparcial possível.

Confira a crítica completa


5 | o grande hotel budapeste

AVENGERS.jpg

Poucos diretores são tão obcecados com suas próprias singularidades como Wes Anderson.

Dono de uma filmografia repleta de filmes que apenas ele poderia ter produzido, é quase seguro dizer que criou um gênero para si, afinal, mesmo “O Grande Hotel Budapeste” sendo uma comédia, é, antes disso, um filme de Wes Anderson e sua mente altamente colorida e imaginativa.

Mas, mais do que em qualquer de suas obras, este lugar, dentro de suas características próprias, parece realista demais para ser chamado de fantástico. Palavra essa que, quando usada como adjetivo e não gênero, ilustra perfeitamente o efeito que as já conhecidas técnicas do diretor têm sobre o espectador, que pode sair quase cansado da extensiva e minuciosa composição visual neuroticamente simétrica e quase inteiramente rosada.

E é uma pena que este design de produção magnífico, por vezes, nos faça esquecer que a própria narrativa é tão rica que chega a dar vida ao hotel que dá nome ao filme. Pois, apesar de ser conhecido por criar personagens multidimensionais extremamente bem desenvolvidos, julgo que a maior habilidade de Wes Anderson é dar vida à lugares que nem bem são.

“O Grande Hotel Budapeste”, definitivamente, respira.


4 | birdman (ou a inesperada virtude da ignorância)

BIRD 1.jpg

A segunda (ou terceira) comédia da lista é um dos filmes mais ambiciosos em um ano cheio deles. Afinal, por mais que recursos já comentados como a câmera escondida e o Wes Andersonismo sejam menos comuns que a ilusão de se assistir à um filme rodado em uma única tomada, há algo sobre esta técnica aplicada por Alejandro G. Iñáritu e Emmanuel Lubezki que sempre há de funcionar.

Como dizia o grande Roger Ebert, se o cinema é, por vezes, um sonho, então cada edição é como um despertar. Alie isso ao fato de a narrativa de “Birdman” confundir ainda mais sua cabeça sobre se o que está assistindo é real ou apenas mais uma visão da perturbada cabeça de Riggan Tompson e você se vê em uma experiência tão conectada com o mundo real que as vezes nem bem sabe se continua sendo uma ficção ou uma biografia da vida de Michael Keaton.

E, por mais que a ignorância seja realmente uma virtude, o que move cada um destes personagens e torna este filme tecnicamente impecável em uma experiência tão valorosa é o mesmo que dita as regras para a grande maioria de nós, seres humanos: o amor ou, neste caso, a percepção da falta dele.

Confira a crítica completa


3 | o homem duplicado

enemy 2.jpg

*filme que percorreu o circuito de festivais em 2013, mas fora lançado em 2014.

Fãs de Dennis Villeneuve (eu!), sedentos por mais filmes do diretor ao serem apresentados à obras futuras dele, como “A Chegada” e “Blade Runner 2049”, podem julgar esta foto, já tão popular de “O Homem Duplicado”, de forma errada.

Antes de lidar com criaturas de outro mundo e com o futuro do nosso próprio nas gigantescas escalas dos dois filmes citados acima, ele produziu um dos filmes mais introspectivos e auto-reflexivos do século 21, transformando o livro de José Saramago em uma jornada ainda mais dualista e complexa que sua intrigante premissa já oferece.

É um filme que, além de insuportavelmente tenso e instigante durante seus curtos 90 minutos, deve permanecer martelando em sua cabeça por dias, semanas, até que o desvende por completo ou ceda à tentação de assistir-lo novamente, apenas para descobrir coisas que não havia percebido e que o enigma não apenas não se resolve, como se torce indefinidamente.

Com outra performance magistral de Jake Gyllenhaal que apenas não figura como a maior esnobada de sua carreira por conta de “O Abutre”, “O Homem Duplicado” requer muito mais do que apenas atenção - o que vai, definitivamente, ter de quem quer que o assista - para que possa ser totalmente compreendido. Pois entender por completo a mensagem filosófica que Villeneuve extrai com perfeição da história de Saramago é quase tão difícil como entender a si mesmo.

E olha que a maioria de nós está há anos tentando.

Confira a crítica completa


2 | relatos selvagens

wild tales.jpg

Seis contos, seis histórias, seis filmes, um conceito. Damián Szifron conseguiu, ao juntar alguns exercícios de escrita que não foram feitos para serem mais do que isso, criar um retrato ao mesmo tempo verossímil e surreal da essência do ser humano. Pense bem, quantas vezes e em quantas situações diferentes uma briga, um conflito, uma discussão ou uma decisão errada poderiam ser evitadas caso você, ou qualquer pessoa que estivesse envolvido em tal momento, fosse capaz de controlar suas emoções.

Por mais que as muitas portas da mente ofereçam um desafio maior para o nosso compreendimento que a natureza das emoções que sentimos, somos evoluções racionais de seres puramente irracionais e movidos à sensações que, se levadas ao extremo, tendem a sempre falar mais alto. É por isso que cada uma destas seis histórias, filmadas com maestria pelo diretor argentino, conversa diretamente com todos que as assistem, pois já vivemos ou conhecemos alguém que viveu qualquer coisa parecida.

Com uma variedade de grandes nomes do cinema argentino, incluindo Ricardo Darín e uma performance fenomenal de Érica Rivas, “Relatos Selvagens”, um dos mais ambiciosos filmes em um ano cheio deles (acho que esta frase já foi dito anteriormente nesta lista) chega muito próximo da primeira colocação daquele que julgo ser o melhor ano para o cinema nos anos 2010. Tão próximo que é uma pena que este trabalho magistral, feito fora de Hollywood, mas com uma precisão que seus poucos 4 milhões de orçamento não sugerem, não clame de fato este troféu dado por este humilde site.

E por que isso? Bem, porque…


10 Menções Honrosas Sem Ordem Específica: O Ano Mais violento; Guardiões da Galáxia; Babadook; Vício Inerente; Whiplash; Foxcatcher; O Expresso do Amanhã; Ida; Interestelar; Uma Aventura Lego.


1 | boyhood

her.jpg

… considero “Boyhood” um dos melhores filmes que já assisti.

Ao menos o mais ambicioso em um ano cheio deles (é preciso reforçar!), “Boyhood” é a obra da vida de Richard Linklater. Filmado ao longo de 12 anos e com um roteiro tão planejado como a frivolidade dos pequenos momentos que vivemos sem planejar, é um documento não apenas de sua época, mas de toda a trajetória de milhões de meninos e meninas à vida adulta.

É claro que muitos diretores já trabalharam com esta temática anteriormente, neste gênero (coming of age, ou vinda da idade) que, particularmente, aprecio tanto e ainda nos entregaria belos exemplares em anos subsequentes (“Moonlight”, “Ladybird”, “The Edge of Seventeen”, “Califórnia”), mas poucos deixaram seu filme apenas ser.

Pois afinal, por mais que “Boyhood” emule todas as trivialidades da vida, não há um objetivo de comunicar nada em específico, nenhuma lição de moral, nenhuma mensagem especial. O que Linklater e seu belíssimo elenco - com os veteranos Ethan Hawke e Patricia Arquette liderando - faz aqui é nos levar em uma viagem por diversos momentos que talvez tenhamos subestimado e que, de qualquer forma, nos fizeram o que somos hoje. A vida, assim como a mostrada em “Boyhood”, não é composta por discussões finalizadas em frases de efeito, mas por momentos que, quando acontecem, parecem apenas isso, momentos.

É um dos poucos filmes na história que, assim como a vida, simplesmente acontece.

Anterior
Anterior

Crítica | O Abutre

Próximo
Próximo

Crítica | Selma