Crítica | Interestelar

Na véspera do lançamento de “Tenet”, estamos revisitando a filmografia de Christopher Nolan afim de termos críticas de todos os seus trabalhos no site.

Vocês podem conferir as críticas dos outros filmes aqui:

Batman Begins

O Cavaleiro das Trevas

O Cavaleiro das Trevas Ressurge

Dunkirk


critica interestelar Christopher nolan

talvez eu não seja inteligente o suficiente para gostar de “interestelar”.

O drama espacial de Nolan conquistou fãs da ciência pela forma como retratou as viagens espaciais, buracos de minhoca e física quântica, enquanto os cinéfilos se apaixonaram pela… bem…

Em uma Terra poluída e escassa em recursos, o ex-piloto da Nasa, Joseph Cooper, descobre variações na gravidade devido à poeira no quarto de sua filha Murph (sejam sinceros, vocês leram na voz de McConaughey não?) que ele interpreta como um código binário, levando-o à uma sede secreta da Nasa que precisava justamente (oras) de Cooper para pilotar uma espaçonave que pode descobrir como salvar a humanidade. Bem, é mais ou menos isso.

Roteirizado e dirigido por Nolan, um diretor avesso a projetos pequenos, “Interestelar” é um filme confuso consigo mesmo, por mais que tente te convencer de que é uma obra prima irrefutável. Por um lado, o cineasta cria composições visuais impressionantes que remetem, sim, ao “2001” de Kubrick, mas que jamais igualam seu esplendor (o que julgo ser impossível) e que, de certa forma, soam menos profundas do que aparentam. Pois se sua abordagem altamente científica propaga rápido em nossas mentes a ideia de que o universo é vasto demais para nossa compreensão, somos obrigados a aceitar com veracidade tudo que nos é dito, pois a grande maioria do público não é versada em física quântica - um erro da escola, se me permitem - e não é como se explorássemos conceitualmente esta vastidão.

Sim, é tocante ver Mathew McConaughey recebendo mensagens anos atrasadas dos filhos, já regulando com ele de idade, mas isto, por mais cientificamente plausível que seja (pelo que sei, é), me faz viajar a menos lugares do que os mistérios e metáforas oferecidos pela obra de Kubrick e a comparação, aqui, se faz mais do que necessária, pois claramente foi ali que Nolan mirou. Mas aquele filme vencia não por nos explicar como as espaçonaves se movimentavam, o que este faz a ponto do tédio (não mintam para si mesmos, poucos de nós realmente entenderam qualquer coisa que os atores, tão leigos quanto nós próprios, discutiram), e sim por nos apresentar horizontes e ideias e visões diferentes sobre a vida. Origem, evolução, fim, a inteligência humana, o que é um ser humano, estamos sozinhos, de onde viemos, para onde vamos?

Para um filme tão gigantesco em escala, seu alcance cerebral chega a ser… pequeno, pois se eu lhe perguntasse quais as questões que o filme realmente levanta, o que você responderia? Ao meu ver, seria a destruição do planeta - mostrada de forma visualmente interessante, por mais que vejamos apenas uma escala micro de seu impacto o que, em um filme macro, é uma falha -, pois o drama entre Cooper e Murph poderia ser o mesmo retirado o componente espacial da história. Tudo que “Interestelar” consegue é nos mostrar como funciona uma viagem entre estrelas, com uma trama por trás, cujos valor dos ensinamentos é tão raso como assistir a um vídeo do Kurzesagt (recomendo).

Contando ainda com um início cartunesco (“Estávamos esperando por você” enquanto o mundo apodrece) e um final muito menos catártico do que deveria (“Agora vá, vou ficar com a minha família”), Nolan ainda se contradiz ao derrubar toda a base científica em prol de mostrar como o amor é a resposta para tudo (é sério?) em um final que vai além da conveniência que posso aceitar.

Mas, caso você ame o filme e ainda esteja aí, saiba que eu gostei de “Interestelar”, mas odeio o fato de ele jamais atingir o potencial que tem.

As atuações são fortes (McConaughey poderia ter sido indicado ao Oscar) e o principal talento de Nolan está em evidência: tornar simples conversas em momentos grandiosos e muito mais importantes do que realmente são. Técnica que, a todo momento, deixa você ansioso pelo que está por acontecer, mesmo que os desdobramentos sejam sempre menores do que a antecipação. Visualmente é um filme marcante e, querendo ou não, já são seis anos discutindo-o, algo que jamais podemos ignorar em qualquer obra de qualquer meio de arte.

Nunca um filme ruim, mas longe de ser perto da maravilha que muitos pintam, “Interestelar” é, para mim, o pior filme de Christopher Nolan, um erro de cálculo em um projeto grandioso demais para falhar e que, independente de seus detratores, tem tudo para sobreviver ao teste do tempo.

6.4

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