O Horror Contemporâneo e Contracultural de Tobe Hooper

Com O Massacre da Serra Elétrica, Hooper reflete um estado de espírito e visualiza novas possibilidades para um gênero em constante reinvenção


Lembro da primeira vez que vi O Massacre da Serra Elétrica (1974). Tinha 15 anos e adorava filmes de terror, mas na época estava mais acostumada a assistir os blockbusters. Com isso, acabei vendo a linha do tempo do gênero de trás pra frente e minhas únicas experiências com filmes slasher foram Chucky, Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo

Comecei a ver, e de início achei tudo exageradamente tosco (vale destacar que eu era adolescente). Os diálogos sem pé nem cabeça juntamente com a ideia vazia de viajar ao Texas para ver o túmulo do avô com um grupo de amigos era algo que não me desceu durante os primeiros trinta minutos.

E então, se iniciou a carnificina. Fiquei paralisada. E nem sei se é a palavra certa pra isso, mas foi como me senti. Após o filme, sentei e repassei em minha mente como todas as formas da obra se encaixavam com os clássicos dos anos 80 que eu adorava. Foi como estudar história.

É fato que O Massacre da Serra Elétrica marcou época com as inovações surgidas do baixo orçamento. Logo, também é verdade que o longa foi imprescindível para a nova fase do horror no cinema, uma fase mais gráfica e sanguinária que, nas mãos de Tobe Hooper, parecia um projeto de contra cultura.

Há quem veja o vilão e sua família como uma sátira ao governo dos Estados Unidos, o perigo mascarado fazendo coisas inimagináveis tanto abertamente quanto às escondidas.  Os anos 70 no país foram marcados por crises políticas, sociais e culturais. A Guerra do Vietnã e o escândalo de Watergate minaram a confiança do público nas instituições, e o cinema não ficou imune a esses eventos. Com o fim dos anos 60 e a crise de otimismo da potência norte-americana, o horror voltou a explorar de maneira mais profunda os medos coletivos. Os filmes passaram a canalizar os receios reais que permeavam a sociedade, trocando os monstros fantasiosos pelos horrores mais próximos da realidade, como a violência e a desordem social.

Portanto, a desconstrução do "sonho americano" fez filmes como A Noite dos Mortos-Vivos (1968) e O Exorcista (1973) mostrarem um público cada vez mais disposto a encarar narrativas ousadas e perturbadoras, em que o sobrenatural se mesclava com o realismo cru, criando um novo tipo de terror psicológico e visceral que, hoje, chamam de pós-horror.

É nesse contexto que O Massacre da Serra Elétrica emerge como um reflexo da alienação e da desesperança da época. Tobe Hooper utiliza um cenário rural desolado para simbolizar a ruptura entre o mundo urbano moderno e um interior esquecido e brutal. Assim, o filme retrata com clareza as falhas de uma sociedade à beira do colapso. Leatherface é assustador por ser humano — um produto de uma sociedade distorcida e falha. 


O experimentalismo de Tobe Hooper em meio às fórmulas da época 

Com um orçamento apertado, Hooper evitou muitos artifícios mais tradicionais do gênero. O uso de câmeras tremidas e a escolha de cores opacas e “sujas” intensificam a sensação de desconforto da realidade. Além disso, com a ausência de uma trilha sonora convencional, Tobe Hooper procurou alternar cenas de horror psicológico, gore e semelhantes criando um ambiente visual e sonoro imersivo, com sons do ambiente e a angustiante motosserra (e não serra elétrica).

E essa impressão da falta de sofisticação técnica acabou se tornando uma das grandes forças do filme, aproximando-o de um estilo quase documental, que sugere que os eventos narrados poderiam ser reais - o filme certamente é um dos precursores do found footage.

Essa estética de filme independente da época também refletia um desejo crescente de desafiar as normas da produção cinematográfica já predominantes. O que ajudou a abrir espaço para uma maior liberdade criativa e encorajou outros diretores a explorarem estilos próprios e ousados dentro do gênero.

Enquanto o filme de Hooper explorava o horror físico e brutal, outros filmes da época, como O Exorcista (1973 ) e Carrie (1976), mergulhavam no horror sobrenatural e religioso. Essa pluralidade de abordagens reflete como o cinema de terror dos anos de 1970 era uma verdadeira arena de experimentação. Diretores como Hooper aproveitaram esse momento para quebrar convenções e explorar novas formas de perturbar e envolver a sociedade diante de todo aquele caos. Não havia um único "jeito certo" de contar histórias de horror, e ainda não há.

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