Crítica | Três Anúncios Para Um Crime

A brutalidade da vida humana é algo assombroso. A ideia de pensar que somos melhores que alguém por qualquer motivo e que temos qualquer poder sobre a vida de outra pessoa é o que prova que a evolução é um processo lento, talvez lento demais para que possa nos salvar realmente. 

"Três Anúncios Para Um Crime" ou "Three Billboards Outside Ebbing, Missouri" é dirigido por Martin McDonaugh e conta a história de uma mãe que sofre com o estupro e assassinato de sua filha, que ocorreu há sete meses, e que está inconformada com a falta de ação da polícia, o que a leva a  colocar a frase "Estuprada enquanto morria e ainda nenhuma prisão? Como pode Willoughby?" separada em três outdoors em uma estrada da cidade de Ebbing.

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O começo deste filme me trouxe dúvidas e certezas. Entre as dúvidas, estava o receio que tive diversas vezes de que o foco da história ficasse perdido entre a resolução do mistério e o drama que veio com ele. Mas não, McDonaugh sabia bem o que queria contar com seu roteiro. "Três Anúncios..." é um drama extremamente pesado, com um senso de humor irônico que, mesmo te fazendo gargalhar diversas vezes com uma efetividade impressionante, nunca tira o peso melancólico que uma história tão pesada, real e comum nos passa. Todas as sub tramas e arcos individuais de cada personagem são diretamente relacionados ao foco central, com uma quantidade frequente de surpresas e reviravoltas que te impedem de adivinhar qualquer coisa sobre o desfecho de tudo. 

Já entre as certezas, a principal delas veio logo no início. Desde o primeiro momento em que vi Frances McDormand, olhando pela janela de seu carro para os três outdoors, sabia que esta mulher não apenas sairia com o Oscar de Melhor Atriz, mas que marcaria para sempre minha memória. É um olhar perfurante, amargurado, que passa todos os sentimentos e a falta deles ao mesmo tempo. O tipo de olhar que apenas uma pessoa totalmente devota à um papel poderia lançar. Durante enervantes duas horas deste filme, o show é inteiramente dela. 

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McDonaugh, inclusive, escreveu o papel de Mildred, a mãe da jovem assassinada, pensando em McDormand, mas me pergunto o que mais ele já não havia arquitetado. Woody Harrelson não precisa de um bom roteiro para ser cativante e engraçado, mas a comovente e imprevisível história o envolvendo torna impossível não sentir uma empatia enorme por seu personagem. Ele e Sam Rockwell foram justamente indicados à Melhor Ator Coadjuvante, mas quem deve levar a estatueta é o último. Como um milagre, McDonaugh trabalha com Rockwell para criar a melhor história de redenção dentro de um único filme em muito tempo. É uma construção de personagem que mostra que o preconceito e a violência podem ser combatidos com atos simples, como alcançar um suco de laranja para quem não tem condições de se levantar e pegar. Em diversos casos as pessoas merecem sim uma segunda chance. 

Os poucos momentos de deslize se dão por performances mal aproveitadas (especialmente de Lucas Hedges), um par de momentos cômicos destoantes e um final inconclusivo, mas que, de certa forma, apenas incita mais nossa necessidade absurda de querer saber mais sobre estes personagens. McDonaugh tem tudo na mão e, se já não bastasse a maestria com que os principais elementos deste filme são orquestrados, a mensagem que ele passa vai além do tempo. Todos temos o bem e o mal dentro de nós e nossa vida só pode ser vivida plenamente de acordo com as escolhas que fazemos entre ambos. 

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"Três Anúncios Para Um Crime" é um filme que vai te fazer rir, vai te chocar e, acima de tudo, vai perfurar seu coração e alma com verdades cruas sobre o ser humano. Além de ser um espetáculo cinematográfico quase perfeito, que tende a fazer estas pequenas falhas não importarem com o tempo, é um modo de mostrar que, mesmo com a nossa sociedade fazendo diversas escolhas erradas, não precisamos nos moldar por ela. 

9.7

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