Crítica | Os Excêntricos Tenenbaums

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Wes Anderson tem a singular qualidade de fazer filmes para a familia inteira, mesmo que a maioria das famílias jamais se sentariam em um sábado a noite para assistir à suas excentricidades.

Dirigido por ele e co-escrito por um de seus muitos parceiros habituais, Owen Wilson (que também atua aqui), seu terceiro filme é uma das coisas mais esquisitas que você pode assistir: uma família disfuncional que habita o paralelo universo onde os filmes de Anderson acontecem.

Ninguém, absolutamente nenhum personagem se comporta como um ser humano comum. Todos são traumatizados por uma infância marcada pela péssima influência de um pai egoísta, mentiroso e maquiavélico, capaz de mentir sobre a própria vida e morte apenas para tentar se reaproximar dos filhos. O fato de Gene Hackman ainda conseguir soar sincero em seu afeto com todos é talvez um dos maiores feitos de sua carreira - e com certeza do filme.

É por sua personalidade odiosa que somos obrigados a simpatizar com todos aqueles a quem afeta: sua filha depressiva (Gwyneth Paltrow) que nutre sentimentos pelo irmão adotivo - relacionamento que o pai chega a tratar com naturalidade em devido momento -, seu filho ex-jogador de tênis (Luke Wilson) e paródia clara de Bjorn Borg e seu filho viúvo (Ben Stiller) que agora superprotege os filhos. Todos são esquisitos de uma maneira própria e pouco fazem, em tela, para que gostemos de cada um, mas é por entender que o verdadeiro vilão é o pai, e graças ao roteiro elevado a enésima potência de ironia, que acabamos nos afeiçoando por aquela estranha família que a todo momento parece caminhar para a destruição absoluta. Anderson, inclusive, deixa clara a preocupação do filme com esse caos eminente na cena inicial, ao som de “Let It Be”, enquanto apresenta seus personagens.

Embora sua habilidade de tratar seus filmes como livros - os dividindo em prefácios, capítulos e prólogos - seja magistral e rara no cinema, seu capricho visual chegou a se tornar piada interna entre os cinéfilos minimamente dedicados e que conhecem sua obra: pan shots laterais e de cima a baixo, uma simetria quase neurótica, uma composição de cenários que beira o barroco e que esconde, em cada canto da tela, os muitos fragmentos que compõem os estranhos mundo que cria. Assistir à qualquer de seus filmes é como uma experiência imersiva e aqui não é diferente.

Porém o maior feito de “Os Excêntricos Tenenbauns” vai além de seu valor técnico e das boas performances oferecidas por seus atores - todos sob a tutela de Anderson que raramente permite que emoções aflorem a pele, o que exige talento e dedicação do elenco. Mas o que mais me impressiona é que, ao terminarmos de assistir as desventuras desta “família” que só se une por conta da obrigação sanguínea, sentimos como se, no fundo, eles ainda sentissem algo uns pelos outros e conseguem fazer com que sintamos o mesmo. Podemos não gostar genuinamente de nenhum deles, mas nenhum esforço é necessário para acompanha-los e, até mesmo, torcermos por suas respectivas felicidades.

Figurando como um dos melhores e mais duradouros trabalhos de sua filmografia, talvez Anderson nunca tenha chegado tão perto de fazer um filme com algo que vários de seus outros tanto faltam: sentimentos e emoções.

E se não chegou, ainda foi de propósito.

9

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