Crítica | Soul

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“Soul” é o novo convite à abstração oferecido pela Pixar.

Dirigido por Pete Docter (Divertidamente, Monstros S.A e Up) é também uma buddy comedy, em que dois personagens com perspectivas completamente diferentes precisam trabalhar juntos para alcançar seus objetivos, aprendendo uma valiosa lição ao final. O modelo é antigo, mas a maneira que “Soul” se formata para apresentar e defender sua visão de mundo é criativa e revigorante. Joe Gardner (Jamie Foxx) é um músico frustrado de Jazz e comanda uma banda escolar, mesmo com todos os golpes que a vida lhe deu, ele não deixa de acreditar na grande chance de se tornar uma estrela da música. Quando é aceito para tocar em um quarteto de muito sucesso na cidade vê, finalmente, a oportunidade sonhada diante dos seus olhos, a alegria o faz andar pela rua sem prestar atenção e cair num bueiro, levando sua alma para o além. Fugindo do destino inevitável, Joe, agora como uma alma, acaba sendo mentor da alma 22 (Tina Fey), um ser pré-vida que jamais achou sua “faísca”, o propósito necessário para ir à Terra viver.

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O filme tem uma estrutura clássica de três atos, viabilizadora da complexa história contada, no primeiro ato tem a maior parte da ação no além, lugar imaterial e abstrato, em que “Soul” apresenta os grandes conceitos que serão instrumentalizados para contar a história. Almas que ainda não receberam suas personalidades fazem o “Seminário Você” onde recebem mentores que vão ajuda-las. As melhores piadas do filme são flashbacks dos antigos mentores de 22, como Carl Jung, Aristóteles, Madre Teresa e muitas outras figuras históricas que não conseguiram lidar com a personagem. Outro conceito espetacular apresentado é o espaço entre o mundo material e imaterial que as pessoas vão quando estão em um estado de êxtase e foco, um atleta durante uma grande jogada, um músico no meio de um solo ou até um operador de ações fazendo day trades, ainda mostra o que acontece com as almas que buscam estar sempre nesse estado: se descolam das suas vidas e se tornam almas perdidas. Algumas pessoas que transcendem o mundo humano zarpam por esse universo enquanto seus corpos estão na Terra, para ajudarem as almas perdidas a se recuperarem.

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No segundo ato, o filme assume uma espécie de narrativa “Sexta-feira Muito Louca”, quando 22 acaba no controle do corpo de Joe e a alma dele entra em um gato, e aí podemos ter os momentos mais reflexivos da trama em que o protagonista pode se ver no mundo tanto agindo conforme ele agiria quanto com um olhar mais curioso e juvenil da sua companheira de jornada que, por sua vez, passa a ter uma nova visão do que é o mundo real. Ao experimentar coisas que seriam qualificadas como “cotidianas”, olhar para o céu, ver as folhas de uma árvore caindo, ser ofendida no transporte público e até caminhar, 22 passa a ter um propósito na sua vida. Esse belo roteiro é acompanhado de uma das grandes trilhas sonoras que a Pixar já apresentou (e são muitos exemplos), mas misturando sensivelmente à sonoridade dos personagens, com a música de Joe e os ambientes da terra e do além com fluidez. Outro destaque é a atuação, além de Fey e Foxx fazerem trabalho primoroso nos papéis principais, Angela Bassett e Phylicia Rashad emprestam suas vozes para duas personagens fortes e incríveis, trazendo mais sensibilidade para esse “Soul”.

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“Soul” oferece um contraponto a uma visão de mundo que opera diariamente no Cinema, na TV, na Música, nas Redes Sociais e no nosso imaginário, a visão que todo mundo tem um objetivo de ser uma pessoa importante ou relevante fazendo apenas uma coisa com maestria. Que devemos sempre traçar objetivos e segui-los independente de como isso pode afetar nossas vidas. Sonhar é importante, seguir nossas crenças, mediar nossas necessidades e possibilidades também e ter interesses objetivos e subjetivos é essencial, mas a  capacidade de renovar, redefinir ou resonhar nossas expectativas com nossas vidas é tão importante quanto. Se em “Soul”, isso pode literalmente, salvar nossas almas, na vida isso existe figurativamente também. Perseverança e foco têm que ser, no mínimo, tão importantes quanto amor e felicidade e se pendermos muito para o primeiro lado da balança, nós corremos o risco de deixar nossas vidas sem rumo. Essa é a bela tese de “Soul”,

Um remédio para a alma.




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