Crítica | O Sonho de uma Família

Filme assistido durante a cobertura do Brasilia International Film Festival (BIFF) de 2020, disponibilizado online pela organização devido a pandemia do Covid-19.


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QUAL É O LIMITE DE MANIPULAR UMA FAMÍLIA PARA QUE SE CHEGUE AO IDEAL QUE VOCÊ SONHA?

“O sonho de uma família” é uma estória que você já escutou. Uma família separada pelo divórcio, deixa, em Roma, o pai Carlo, enquanto a mãe, Charlotte, vai para a França viver com seu novo namorado e os três filhos. Alma, Jean e Seb são irmãos próximos e muito afetivos à mãe, diferente da relação com o pai cineasta, que não veem há 2 anos. Após Charlotte descobrir uma nova gravidez, logo antes de se prepararem para uma mudança para o Canadá, a mãe obriga os filhos a passarem duas semanas com o pai na Itália.

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O filme é narrado na perspectiva de Alma, a mais nova dos três, que vive sonhando com a volta da sua concepção de família completa, com seu pai e mãe juntos e apaixonados. Além disso, a menina tem um olhar cínico sobre a religiosidade ortodoxa que a mãe adotou junto aos filhos ao se mudar pra França e vive sonhando com as paixões fulminantes que podem atravessá-la, mesmo tendo seus tenros 9 anos e 3 meses de idade.

A diretora inglesa, Ginevra Elkann, lança em seu primeiro longa dirigido um conto simples dessa criança que sonha em um ideal de família que só cabe em sua cabeça. A menina coloca a responsabilidade de criação em cima de um irmão mais velho, que com seus 15 anos só quer viver sua sexualidade e sua paixão por uma personagem inusitada da família. O que soa, é que após 15 anos de trabalho como produtora, o que carrega a narrativa não é o ideal de construção de um cinema que impacta, e sim, o medo de uma produtora de ter uma obra que fracassa. Em muitos pontos, isso deixa o filme como uma escolha segura para quem assiste, com a certeza que não será aquela obra que vai te deixar amargo por ter visto algo ruim.

Em entrevista de Ginevra à Nowness, a diretora também deixa claro a importância da construção das personagens femininas de suas obras. E por mais que o filme seja carregado pelas frustrações do adolescente Seb, é visível o arquitetado arco das duas personagens mulheres adultas, Charlotte (a mãe) e Benedetta (roteirista do novo filme do pai), como mulheres fortes e que servem de exemplo para Alma.

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Com falta da identidade cinematográfica italiana, usa-se de paisagens do belo país para que se construa uma fotografia agradável e mais conectada a este. Além disso, o filme carrega outros recursos cinematográficos já vistos e feitos com maior cautela. A narrativa de Alma, por mais que crie uma aproximação (como recurso cinematográfico), abre margem para uma comparação com a memorável produção “O Projeto Flórida” (2017), que usa este recurso de forma mais responsável, dramática e mais natural. Os problemas que são tratados no filme não são absurdos ou eticamente controversos para que seja necessária uma narrativa infantilizada. Por isso, o uso da narrativa de Alma não é algo essencial pro filme andar em torno de uma perspectiva de pureza, e mesmo que fosse, a obra anda com nuances deste recurso que se perde.

Em uma indústria cinematográfica tão identitária quanto a italiana, o novo longa de Ginevra Elkann sai de um rumo comum, mas cai em outro. No fim, é mais de um mesmo já apreciado pelo grande cinema, sem marcos e nem identificação. É fazer um cinema seguro, que não abre margens para grandes críticas nem grandes aclamações.

6,2

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