Crítica | Tyler, The Creator - Flower Boy

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Por que, em pleno 2017, alguém se importaria tanto com a sexualidade de uma pessoa como a mídia andava obcecada pela de Tyler antes mesmo do lançamento de "(Scum Fuck) Flower Boy"? Talvez justamente por essa pessoa ser Tyler, The Creator. O mesmo artista que, apesar de mostrar um talento promissor, explícito no visceral e indômito "Goblin" (seu primeiro álbum de estúdio), havia marcado a sua carreira até então por comentários misóginos e homofóbicos, tanto em sua música como publicamente.

Após o ''término'' do Odd Future, grupo cujo Tyler foi fundador, tivemos a oportunidade de conhecer os trabalhos solo dos integrantes Frank Ocean, que é um dos melhores amigos do rapper, a extremamente inovadora e carismática Syd e o peculiarmente talentoso Earl Sweatshirt. Basicamente, se Tyler, the Creator não existisse e não fosse uma influência para esses artistas, não há como saber se esses três existiriam. Mera suposição? Talvez, mas tente imaginar um mundo sem "channel ORANGE".

Tyler, dos 4 artistas citados no parágrafo acima, foi o único que em seus trabalhos mostrou falta de coesão e por que não dizer, falta de um objetivo final. Sempre teve músicas pontuais de muita qualidade, porém, no geral, era um alguém esbravejando e liberando sua raiva para ninguém específico. Tentativas de canções de amor até aconteceram, mas os resultados soaram vazios e imaturos.

Mas as coisas mudam.

"Flower Boy", muito mais do que Scum Fuck, é o primeiro trabalho do rapper que nos permite tentar, verdadeiramente, ler quem é Tyler, The Creator. É reflexivo, imersivo e extremamente colorido, uma mudança para melhor, onde, em uma mensagem para todos e provavelmente para si mesmo também, ele diz :“tell these black kids they can be who they are,” trecho da emblemática "Where This Flower Blooms".

Em "Foreword", Tyler começa o álbum com muito a dizer. A crítica ao materialismo nunca foi um tópico no qual ele tivesse nos demonstrado interesse, mas que aqui, o faz com surpreendente facilidade. A voz, introspectiva e arrastada lembra muito o gosto que ''Bastard'' deixou. É quase como se fosse um discurso, despreocupado e não ensaiado, sem qualquer pretensão arrogante. Apenas liberar o que tem na mente sobre nosso apego às coisas físicas e sonhar com uma utópica ''floresta cheia de flores e arco-íris''. E é com essa batida nostálgica e um bom flow que Tyler rima:

How many raps can I write 'til I get me a chain?,
How many chains can I wear 'til I'm considered a slave?,
How many slaves can it be 'til Nat Turner arrives?,
How many riots can it be 'til them Black Lives Matter?

A instrumentalização é um dos pontos fortes do projeto, que flui de uma maneira tão natural e bem executada que chega a ser visual, imagética. Vasta, complexa, original e nos permite perceber a grande influência que o Jazz tem sobre o rapper. O constante encontro entre esse Jazz suave e os vivos e nostálgicos sintetizadores é uma das diversas virtudes do álbum, que consegue transportar o ouvinte, sem muito esforço, para o campo onde o amarelo predomina, campo no qual o rapper se encontra na capa de seu disco.

Tyler consegue ser agressivo, para aqueles que amam e não querem que a mesma pessoa que fez "Goblin", "Wolf" e "Cherry Bomb" seja esquecido em uma possível nova fase. Embora levemente fora de lugar no contexto desse LP, as faixas "Who Dat Boy", "Pothole" e "I Ain't Got Time!" não deixam de ser excelentes.

A facilidade de fazer canções expondo os sentimentos, neste trabalho, é surreal. "See You Again", "Garden Shed" e "Glitter" são três das músicas mais bonitas de 2017 até então. "Where This Flower Blooms" e "911", ambas com participações de Frank Ocean, são expressionistas e melancólicas na medida certa. "Boredom" talvez seja a melhor música e o melhor retrato da característica principal do álbum e talvez seja o que o artista sempre tentou alcançar como músico e que ainda não tinha conseguido. Ela flutua, seus versos e memorável refrão se encaixam perfeitamente. É a maior amostra do que Tyler pode ser como produtor: envolvente e original.

Nada melhor que acabar uma Review sobre Tyler, The Creator com algo que marcou muito sua carreira até então: seu Twitter. Tyler postou em sua página que espera que, quando você for ouvir o álbum, você esteja na estrada, viajando de avião, ou andando de bicicleta - não mexendo no seu celular nem falando com alguém. Siga esse conselho.

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