Crítica | It Follows
ansiedade atemporal, paranóia atual.
Em uma década onde o terror teve uma revitalização tão grande graças à franquias e mais franquias, é esse pequeno filme de apenas dois milhões de dólares que mais me afetou.
Nele, a jovem Jay, após dar uma rapidinha com um garoto que estava saindo, começa a ser seguida por uma entidade que pode se transformar em qualquer pessoa. O detalhe: a entidade apenas anda, calmamente, atrás da pessoa que segue, mas nunca para.
Sem explicar, ou tentar explicar, o que é a coisa, David Robert Mitchell constrói um filme de terror que nos mantém tensos a todo momento, justamente pela natureza curiosa da entidade. O cineasta se utiliza de diversos planos abertos - e um magnífico plano sequência no início do longa - em ambientes com o número certo de pessoas para que consigamos ver alguém que caminha na direção da câmera à uma considerável distância e, assim, qualquer um em cena pode, literalmente, ser a coisa. Essa antecipação é maior em nós que na própria Jay, a única que pode enxergá-la, o que, de forma metafísica, chega a brincar com a nossa própria segurança.
Fotografado pelo promissor Mike Gioulakis, responsável por “Fragmentado” e “Nós”, aquela região suburbana tem uma atmosfera de sonho (no caso, pesadelo), e a sútil construção de mundo, que vai desde programas de TV à própria roupa dos personagens, mostra que a realidade do filme, assim como na época em que se passa, é incerta. A música eletrônica, pesada nos sintetizadores, é outro elemento que está ali para confundir, seja por atordoar os sentidos ou apenas para aumentar o suspense, mas por aludir para esse anacronismo que conversa diretamente com a ansiedade do nosso tempo, ansiedade que também toma forma na coisa e provoca uma melancolia que toma conta da encenação.
Uma brilhante maneira de renovar o slasher, “It Follows” cria um mito próprio ao tornar o assassino em algo amórfico, como se o medo instalado na nossa sociedade pudesse ser encarnado por qualquer pessoa alterada o suficiente para representar uma ameaça. Se relacionando ao sub-gênero também pela forma como pune aqueles que transam, as interpretações vão desde DST à inevitabilidade da morte, em um filme que se abre pra interpretação e que não tem interesse nenhum em se auto-explicar.
Lançado em 2014, e arrecadando 10 vezes mais que seu orçamento, inspirou uma série de teorias e uma sequência ainda não foi descartada (confesso que estaria na primeira sessão), mas quanto à respostas o próprio diretor disse nessa entrevista que tudo que vemos está aberto para interpretação, o que torna a experiência ainda mais prazerosa, especialmente por conta das cenas finais.