Os 10 Melhores Filmes de 2002

Estamos no final do primeiro quinto do século 21, e então decidimos retornar a todos os anos e trazer listas dos melhores filmes de cada um, em busca de, ao final de 2020, termos uma lista com os melhores do século até agora.


De todos os anos, 2002 talvez seja o que tenha a caída mais drástica entre os filmes da lista, que em cima se igualam a qualquer ano, mas, em suas últimas posições se tornam escolhas meio que por eliminação.

Dos filmes considerados aqui que acabaram não entrando na lista, mas ainda valem o seu tempo, estão os britânicos “Um Grande Garoto” e “28 Dias Depois”, um sobre, bem, um grande garoto e o outro um dos melhores filmes de Zumbi de todos os tempos. O primeiro “Homem-Aranha” continua sendo uma das melhores histórias de origem do gênero e, caso vocês gostem de filmes experimentais, “Arca Russa”, literalmente FILMADO EM UM ÚNICO TAKE merece toda sua atenção. Já “Irreversível”, de Gaspar Noé, é um dos filmes mais difíceis de se indicar da história do cinema. Caso tenha um estômago forte, aconselho que tente, o meu não aguentou 15 minutos.

Mas as principais menções honrosas vãos para os documentários, que tendo em não colocar nestas listas porque, infelizmente, não assisto um número suficiente para me sentir confortável em recomendar. Entretanto, “Ônibus 174” é um dos retratos mais tristes e chocantes da realidade brasileira, enquanto o Austríaco “Eu Fui Secretária de Hitler” e o Canadense “Tiros Em Columbine” também merecem destaque.

Agora, vamos aos dez selecionados e, como sempre, alerta moderado de spoilers.


OS MELHORES FILMES DE 2002

10 | longe do paraíso

Em sua crítica do filme, Roger Ebert disse que este era o melhor filme de 1957 que jamais fora feito, e eu não podia concordar mais.

Todd Haynes, que adora voltar no tempo para falar de problemas que ainda vivemos hoje (como fez em “Carol”, por exemplo), constrói o filme com uma linguagem datada de maneira proposital, desde o figurino, à movimentação de suas cenas e câmera, às performances, principalmente a de Julianne Moore. O que torna revisitar essa obra um exercício fascinante: assistimos um filme de 20 anos atrás feito como se tivesse sido feito há 60 anos atrás, uma experiência que não lembro ter tido.

Mas se essa proeza técnica impressiona, é ao mostrar como muitas pessoas ainda mantém o pensamento retrógrado apresentado no longa - onde um personagem gay é considerado “doente” e lhe é dito que, com terapia, pode superar sua homosexualidade - que Haynes cria um filme atemporal.


OS MELHORES FILMES DE 2002

9 | minority report

Dono de uma premissa intrigante e que pode gerar horas de discussão em qualquer roda de amigos, “Minority Report” é um sci-fi, no mínimo, esquisito.

Dirigido por Steven Spielberg, o longa utiliza de várias batidas comuns de Hollywood (incluindo Tom Cruise), mas parece a todo momento querer se desprender para algo mais experimental, seja pela fotografia com uma exposição exacerbada que torna o filme excessivamente claro, ou mesmo por algumas sequências com escolhas musicais, e visuais, nada convencionais.

Ainda assim, “Minority Report” faz pensar enquanto entretem, algo que poucos blockbusters conseguem hoje em dia. A frase professada por Cruise: “o fato de você ter pego a bola não muda o fato de que iria cair” segue sendo uma das minhas favoritas do gênero.


OS MELHORES FILMES DE 2002

8 | embriagados de amor

Se os dois filmes acima alcançam proezas técnicas singulares, nenhuma proeza é tão grande quanto extrair uma boa atuação de Adam Sandler.

E Paul Thomas Anderson faz isso como ninguém, justamente por suprimir a persona que Sandler utiliza em todos os seus filmes a um homem tímido, que fala para dentro e jamais deixa suas emoções, ou humor, ou qualquer coisa extrapolar. Surpreendentemente me afeiçoei por Sandler neste filme e torci por sua felicidade.

Felicidade esta que vem pelo romance que divide com Emily Watson, o qual funciona por conta da estranheza individual do casal que, quando combinadas, se tornam mais do que a soma de suas partes.


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7 | o pianista

Evito elencar qualquer diretor que tenha casos não resolvidos, mas decidi abrir uma exceção para Roman Polanski neste ano de 2002.

Por que? Porque apesar de acreditar que, sim, ele é culpado em várias de suas acusações, acredito também que “O Pianista” tem algo de valor para a humanidade e, mais importante, talvez explique um pouco do ser humano conturbado que seu realizador se tornou.

Pois muito antes de perder Sharon Tate em um dos casos mais macabros dos Estados Unidos, Polanski teve de sobreviver à uma Guerra Mundial onde viu diversos semelhantes serem assassinados sem piedade, e é isso que “O Pianista” mostra.

Se eles justificam a pessoa que Polanski supostamente se tornou? Não. Mas para entendermos o ódio, temos que saber de onde ele vem, pois se apenas cancelarmos seus fins sem conhecer seus meios e origens, estaremos apenas nos cegando para o mundo a nossa volta e, principalmente, permitindo que o ciclo continue.


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6 | o filho

Talvez em um mundo onde todos fossem “versados” na linguagem cinematográfica, “O Filho” seria um dos maiores clássicos de seu tempo.

Pequeno em escala, mas gigantesco em seu interior, poucos filmes são mais comoventes que este sobre um carpinteiro que aceita o assassino de seu filho como aprendiz em um reformatório.

Se cineastas inferiores não resistiriam em criar um thriller, os irmãos Dardenne criam um drama paciente, pesaroso e profundo, onde as emoções ficam tão escondidas que é como se seus personagens tivessem se esquecido de demonstrá-las. E isso é perfeitamente plausível dada suas trajetórias de vida e o incidente que os conecta, logo se torna uma tarefa quase torturante vermos ambos descamarem tão rápido, em uma das cenas mais trágicas que já assisti.

Porém, surpreendentemente, o filme termina de uma maneira que ninguém poderia prever, mostrando que além de amor e ódio, o ser humano é capaz de sentir emoções que nem mesmo temos nomes para descrever.


5 | adaptação

OS MELHORES FILMES DE 2002

No cinema, uma arte visual, o autor é sempre o diretor.

Exceto quando o roteirista for Charlie Kaufman.

Um filme sobre si mesmo (no caso o filme sobre o filme), “Adaptação” traz uma das melhores performances da carreira de Nicolas Cage, na pele de gêmeos escritores que, para qualquer pessoa que tenha tentado escrever um roteiro na vida, vão parecer representações exatas de seus momentos de procrastinação, preguiça e o eventual desespero com a deadline - além da famosa negociação “devo comer um biscoito antes de escrever para me dar energia ou depois para me parabenizar por ter escrito?”

Mas, além disso, o filme de Kaufman, dirigido por um dos poucos diretores capazes de visualizar suas loucuras em Spike Jonze, funciona como suspense e, em uma escala mais profunda, como uma análise da condição humana - assim como todos os filmes escritos por Kaufman - tudo isso enquanto diverte cena após cena.

Para utilizar seu belo título - e maravilhoso pôster -, é um filme que se adapta conforme acontece e, ao fazer isso, se torna na melhor adaptação possível do material fonte.


4 | a última noite

OS MELHORES FILMES DE 2002

É estranho apontar um filme de Spike Lee que não seja sobre questões raciais como um dos melhores de sua carreira, mas farei isto sem problemas.

Não que “A Última Noite” não seja também sobre discriminação, como evidenciado pelo aclamado monólogo do personagem de Edward Norton, mas não é seu tema principal. Assim como em outras de suas obras, Spike aqui representa o complicado cenário social e político dos Estados Unidos, traçando um paralelo entre os problemas pessoais de seus personagens e o atual estado do país pós 11 de setembro

E o cineasta sucede em ambas as coisas, entregando um filme que funciona em seus dois espectros e que comprova sua visão única sobre o país onde mora, auxiliado por performances seminais tanto de Edward Norton como de Philip Seymour Hoffman, ambos interpretando homens extremamente falhos, mas que, graças ao filme, podemos simpatizar com suas trágicas personalidades.

Assim, Spike Lee nos dá mais uma lição e mostra que há muito além do preto e do branco (mesmo que ambos estejam sempre ali), tanto em nossa pele, como dentro de nós.


3 | fale com ela

OS MELHORES FILMES DE 2002

O cinema de Pedro Almodóvar pode ser extremo demais para os não acostumados, mas entre o choque provocado por obras como “A Pele Que Habito” e a sinceridade de um filme como “Dor e Glória” (para citar os mais recentes), o cineasta sempre consegue utilizar dos elementos macabros de suas tramas em prol da mensagem que quer passar.

Similar à Tarantino nesse quesito, esta mensagem quase sempre tem a ver com o amor que nutre pelo próprio cinema e, neste maravilhoso “Fale Com Ela”, Almodóvar utiliza a sétima arte como uma solução parcial para as dores provocadas pela vida, mas, mais do que isso, como a razão pela qual seus personagens sobrevivem e seguem em frente.

Poucos filmes conseguem ser tão bonitos, de maneira tão pura, como este que começa e termina dentro de um cinema, e a frase se faz verdadeira também quando substituímos a beleza pelo choque provocado por certos atos que vemos em tela. Ao balancear isso, o cineasta mexicano faz um filme bizarro em sua superfície, mas sincero e singelo em seu coração.

Observação: há uma bela passagem envolvendo Caetano Veloso no meio da narrativa.


2 | o senhor dos anéis: as duas torres

OS MELHORES FILMES DE 2002

Muitos gostam de diminuir o segundo filme da trilogia por conta das diferenças que tem do livro, porém quando analisamos um filme estamos falando dele, e não do livro em que fora baseado. Por isso, posso dizer que “As Duas Torres” é ainda mais impressionante que “A Sociedade do Anel”.

Talvez não tão bem amarrado e com uma narrativa mais difícil de se lidar por se dividir em duas tramas distintas, mas o esplendor desta continuação supera o de seu antecessor ao nos mostrar a rápida transformação que o Um Anel proporciona não apenas em seus personagens, mas no mundo que habitam. Antes ensolarado e mágico, agora a Terra Média parece caminhar rumo ao caos e a destruição, em uma das construções de mundo mais arrebatadoras já vistas em uma tela de cinema.

Também contando com uma das cenas de batalha mais incríveis já filmadas e compondo arcos dramáticos extensos de seus personagens principais, “As Duas Torres” consegue ser muitos filmes em um só sem nunca deixar de ser o mesmo: a segunda parte de uma trilogia praticamente perfeita.


1 | cidade de deus

OS MELHORES FILMES DE 2002

Talvez o maior erro da história do Oscar tenha sido a não premiação daquele que considero nosso melhor filme.

E por que isso importa, sendo que “Cidade de Deus” já se provou um dos filmes mais influentes e reconhecidos do século 21?

Bem, gosto de imaginar o quão mais o filme poderia ter feito por nosso cinema caso este reconhecimento fosse mais imediato, pois a verdade, ao menos aos meus olhos, é que nada lançado em 2002 se equipara e, de todas as listas que fiz, talvez esta tenha sido a primeira posição mais fácil de decidir.

Pois o filme de Fernando Meirelles não serve apenas como um retrato da pobreza, corrupção e do tráfico no Brasil, mas como entretenimento, drama, comédia e, principalmente, uma história de amadurecimento em um local onde a menor das decisões erradas pode ser também a última. Do Trio Ternura até a Molecada da Caixa Baixa, acompanhamos personagens que se tornaram imortais no momento em que nasceram, aprendemos a nos importar com todos, a repetir suas falas, a compreender suas origens e lamentar por seus inevitaveis destinos.

Assim como eles, “Cidade de Deus” já nasceu um clássico e, ano após ano, basta revisitarmos a obra para perceber como todo este reconhecimento é mais do que merecido.

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