Os 25 Melhores Álbuns de 2022
2022 foi um daqueles anos.
Um daqueles anos que coloca o resto da década na terrível obrigação de tentar repetir, ou superar, o feito. Diversas estreias triunfantes, retornos de grandes nomes que não lançavam há tempos, álbuns inovadores e vanguardistas, álbuns tradicionais executados com técnica exímia.
Apesar de, novamente, completamente mal premiado e nada reconhecido pelo Grammy, o ano de 2022, e cada um de seus destaques, será ovacionado aqui no outrahora. Abaixo, os 25 melhores álbuns de 2022.
25
Wet Leg
“Wet Leg”
O debut auto-intitulado da banda Wet Leg chegou com os dois pés na porta nas listas de melhores do ano de 2022. Com uma sonoridade que mescla a urgência do rock dos anos 2000 com a personalidade e o apelo pop de atos do fim dos anos 2010, a dupla composta pelas talentosíssimas Rhian Teasdale e Hester Chamber entrega um disco enérgico, divertido e versátil, com hits como a irresistível “Chaise Longue”. Uma bela nova surpresa que vai agradar muito fãs de Courtney Barnett, Julia Jacklin e Wolf Alice.
Bernardo Liz
24
angel olsen
“big time”
Olsen parece incapaz de se repetir. Desde “My Woman”, de 2016, a artista muda de direção temática e esteticamente a cada album de forma radical. “Big Time” apresenta sua versão mais folk até então. Contemplativa, verdadeira, transparente em suas emoções e no que cada palavra de suas letras quer dizer, seja em tópicos profundamente íntimos ou em grandes declarações sobre o mundo ao seu redor. Mais um grande disco em uma discografia repleta deles.
Amanda Machado
23
the 1975
“being funny in a foreign language”
The 1975 dá um passo para trás tematicamente falando. As críticas ao pós-modernismo e seus reflexos prejudiciais na maneira com que o ser humano age, usado como tópico principal nos últimos trabalhos da banda, aqui chega no início da festa e vai embora antes do parabéns. Dessa vez Matt Healy não quer achar metáforas pra explicar o quão difícil é se relacionar na era digital, tampouco falar sobre drogas, sexo ou o niilismo de praxe. Não quer falar sobre sinceridade mas sim ser sincero da forma mais sucinta e direta possível - neste caso, falando sobre amor.
Pietro Stefani
22
the staves
“good woman”
O terceiro álbum de estúdio das irmãs Staves traz de volta tudo de positivo que já havia se apresentado nos lançamentos anteriores da banda, mas agora, de forma mais madura, sóbria e refinada do que antes. “Good Woman” não é inverno ou primavera, e talvez se enquandre melhor como um disco de início de outono. O folk de “Trying”, as harmonias da faixa título, tudo tem a cara de The Staves, mas sob uma nova faceta, mais consciente de si e muito mais entregue liricamente do que até então.
Pietro Stefani
21
terno rei
“gêmeos”
Os dias de juventude ficaram pra trás. A banda paulista apresenta “Gêmeos, o sucessor do aclamado "Violeta", onde guitarras e texturas acústicas tomam o lugar dos sintetizadores. Com canções delicadas como "Dias da Juventude", "Brutal" e "Aviões", o Terno Rei apresenta uma maturidade que solidifica tudo aquilo que foi esperado da banda, que é um dos maiores expoentes do rock nacional.
Nicholas Mendes
20
pusha t
“it’s almost dry”
O sucessor de DAYTONA não possui a mesma concisão de poucas faixas, mas entrega impacto da mesma forma. Pusha nos entrega em “It’s Almost Dry” seu trabalho mais maduro até então: variado, pungente, e apresentando o rapper em um lugar diferente de sua vida, dividido entre passado e futuro, mas falando sobre tudo com a competência narrativa e de flow usuais. A produção assinada por Pharrel e Ye apenas eleva um disco que, somente lido, já seria incrível.
Pietro Stefani
19
fka twigs
“caprisongs”
Pela primeira vez FKA twigs parece não ser refém de nenhuma pessoa figurativa ou sentimento melancólico e dolorido. Não é como ela afundasse em suas próprias palavras e produção e nos levasse juntos por obrigação. Carprisongs parece muito mais um convite para uma breve ida a praia, onde a playlist que toca no carro oscila em gênero, temperamento e intensidade apenas pela obrigação de não ser monótono, numa sucessão de músicas independentes postas juntas com o propósito de fazer a viagem rápida e agradável ao invés de torná-la um momento catártico.
E assim ela o faz: Caprisongs é uma viagem divertida, com paisagens convidativas e por vezes memoráveis, dependendo dos olhos de quem se põe a janela. Não é a praia ainda, tampouco um enunciado do que vamos ver quando chegarmos lá: é embaralhado demais para nos apontar a direção que estamos indo. Ainda assim, a rota é dinâmica e entusiasmante o suficiente para valer a viagem antes mesmo de pormos o pé na areia para contemplarmos o mar.
Pietro Braga
18
charli xcx
“crash”
Não é segredo para os fãs que Charli quis, com esse álbum, ostentar. Seu ciclo com a gravadora estava prestes a se encerrar, e por isso, “CRASH” abusa de timbres brilhantes, produzidos nos melhores estúdios do mundo. Tudo isso funciona a favor de um álbum provocante, divertido, que coloca a personalidade XCX aplicada ao pop mainstream com maestria. As participações são cirúrgicas, a atmosfera é contagiante e destaques como “Lightning”, “Good Ones”, “Yuck” e “Constant Repeat” são fruto desse caos organizado que só Charli sabe orquestrar.
Como todos os seus projetos, o conceito é extramemente bem executado e as faixas do disco, apesar de protagonistas, são parte de um amontoado maior de visuais e ideias que compôe a lore de CRASH. A temática automobilísitca sempre funciona com Charli, e apesar desse ser seu projeto mais acessível e menos vanguardista dos últimos anos, ainda entrega uma audição pulsante e vibrante do início ao fim.
Nicholas Mendes
17
denzel curry
“melt my eyez see your future”
Uma obra que transcende as fronteiras temporais e estilísticas, reunindo uma constelação de talentos do hip-hop e evocando seus grandes tempos. Em seu quinto disco, Denzel Curry mergulha em uma profunda exploração do mundo e de si mesmo, transformando seu som com influências que vão de westerns a filmes de samurai. “Melt My Eyez” é, acima de tudo, uma exibição das ideias mais ousadas de Curry, e o apresnta em uma jornada de, acima de tudo, autoaceitação.
Pietro Stefani
16
bala desejo
“sim sim sim”
A estreia do Bala Desejo tomou de solavanco o coração de fãs do Brasil e do mundo. A união de elementos da tropicália e da musica brasileira dos anos 60 e 70, com a luxúria reprimida durante a pandemia gerou um álbum que une gerações em torno de música boa, diversa, e excitante. Mesmo possuindo destaques instantâneos como “Lua Comanche”, “Baile de Máscaras” e “Lambe Lambe”, a audição completa é o que transmite da melhor forma as ideias e anseios por trás de “SIM SIM SIM”.
Bernardo Liz
15
ethel cain
“preacher’s daughter”
O primeiro álbum de Ethel Cain foi um dos estandartes do pop alternativo em 2022. A artista se estabeleceu como uma força narrativa que utiliza a mistura de diversos gêneros musicais para nos contar uma história arrebatadora sobre uma filha de um pastor que ao fugir de casa chega no inferno. Partindo de elementos da própria criação em uma comunidade baptista na Flórida em faixas com country e nostalgia, Cain chega ao final do álbum com Rock industrial e grunge sintetizando a nossa jornada musical e o movimnto da cultura norte-americana nas últimas décadas.
João Francisco Milani
14
beach house
“once twice melody”
É impressionante como o Beach House consegue sempre produzir um disco diferente e único, dentro da perceptível vontade de seguir fiel a sua própria sonoridade. Surrealismo, anos 60, 80, hip-hop, folktronica: esses são apenas alguns dos novos ingredientes que o grupo traz para “Once Twice Melody”, e eles funcionam como o toque final e diferencial em um prato que já estava fadado a ser delicioso. Em quase 1h30 de música, dividida em 4 partes, temos momentos de explosão art-pop, momentos cheios de swing, e momentos de quietude. Tudo funciona em perfeita ordem, e os destaques não tiram o brilho das faixas mais discretas. Porém, em uma carreira com faixas estelares, não tem como falar dos destaques daqui. “Once Twice Melody”, “Runaway”, “Sunset”, e, é claro, uma das faixas mais emocionantes e arrepiantes de 2022, “Superstar”.
Bernardo Liz
13
florence + the machine
“dance fever”
Florence tem uma qualidade única, sua música parece não pertencer a tempo nenhum, ou a todos. Ela é capaz de chamar a nostalgia e novidade ao mesmo tempo nas suas canções, e na voz suavemente grave da cantora que esses refrãos anacrônicos sobre grandes temas da música são entoados. No álbum pandêmico “Dance Fever”, coproduzido por Jack Antonoff, ela nos convoca para dançar até o fim do mundo, e é difícil não dançar com Florence + The Machine.
João Francisco Milani
12
kendrick lamar
“mr. morale & The Big Steppers”
Qual é a coisa certa a se dizer quando você está no topo do mundo?
Ou, no mínimo, no topo da cadeia cultural de seu tempo.
Após um elogiado início de carreira, que culminou no lançamento de duas obras-primas, uma seguida da outra (gkmc e TPAB), e um disco onde o artista combina o seu talento a participações e produtores escolhidos a dedo para entregar um dos melhores discos de crossover hip-hop/pop dos anos 2010, em DAMN.
As expectativas para o sucessor de DAMN., lançado em 2017, eram altas, e Kendrick não as decepcionou em “Mr. Morale & The Big Steppers”. Pela primeira vez em sua carreira Kendrick escancarou partes de sua vida pessoal, dilemas e reflexões emocionais. Com poucas metáforas, poucas voltas, direto ao ponto — e mantendo o altíssimo nível poético. Um presente para os fãs, e provavelmente, um presente a si próprio.
Bernardo Liz
11
Björk
“Fossora”
Nossa islandesa favorita usou as flautas de “Utopia” para escavar um buraco em seu jardim durante a pandemia. Chegando no fundo de seu jardim, encontrou uma boate. Os DJs eram fungos, e as caixas de som, cogumelos. Ao menos, é isso que “Fossora” soa aos meus ouvidos.
Entre os momentos de brilho e energia, há alguns dos cortes mais belos e contemplativos da carreira de Björk, como a faixa “Ancestress”, sobre a perda de sua mãe. Após o coração partido de “Vulnicura” e o charme da redescoberta do amor de “Utopia”, Björk parece estar de volta a sua forma mais natural: uma exploradora de sons e timbres, uma compositora que segue suas próprias regras, e uma artista incansável na busca pelo novo.
Amanda Machado
10
The Weeknd
“Dawn FM”
Em "Dawn FM", Abel aprofunda e escurece o som que começou a desenvolver em “After Hours”. O disco é uma homenagem às estações de rádio noturnas dos anos 80 e soa dessa forma do início ao fim.
Com colaborações que vão de Tyler, The Creator e Lil Wayne a Jim Carrey e Quincy Jones, “Dawn FM” tem produção exuberante de Max Martin, que parece ter se dedicado como não fazia a algum tempo a um projeto tão conceitual, se tornando dupla de Abel na criação de um power-house de synth-pop com a mão pesada nos timbres FM, como provenientes do sintetizador DX7 e de seus irmãos.
Um dos melhores de sua carreira até agora, adicionando mais e mais camadas à confusa, ambígua, difícil de ler figura que se chama The Weeknd. Cada vez mais artista, se é que isso é possível.
Bernardo Liz
9
Tomberlin
“i don’t know who needs to hear this”
Há algo de proibitivo nesse disco. Parece que ele não foi feito para ser reproduzido fora das quatro paredes onde suas faixas foram compostas e produzidas. O título do álbum diz “eu não sei quem precisa ouvir isso”, mas Tomberlin disse, em entrevista, que sabia. Talvez por isso “i don’t know who needs to hear this” tenha visto a luz do dia. Sua criadora sabe do que esse obra pode fazer, e deve estar fazendo, por tantas pessoas que poderiam estar precisando ouvir exatamente isso.
Bernardo Liz
8
tim bernardes
“mil coisas invisíveis”
A poesia de Tim Bernardes explora o amor, com introspecção e reflexão, enquanto a instrumentação cuidadosa complementa sua voz única. "Mil Coisas Invisíveis" é um exercício de autenticidade e uma evloução da capacidade de Tim Bernardes de evocar emoções profundas por meio de sua música. O álbum solidifica Tim como um dos artistas mais talentosos e inovadores da cena musical brasileira contemporânea, ganhando reconhecimento nacional e internacional por algumas das melodias e letras mais sensíveis e autênticas da MPB contemporânea.
Nicholas Mendes
7
Jockstrap
“I Love You Jennifer B”
Georgia Ellery está em dois discos dessa lista, e apesar de termos posicionado “Ants From Up There”, da banda Black Country New Road, da qual Georgia também é participante; a nível pessoal, seu grande trabalho de 2022 está aqui, em sua dupla com o produtor Taylor Skye.
“I Love You Jennifer B” poderia ser o álbum do ano. Assim como MOTOMAMI, discos tão ousados e desafiadores no que se propõe a executar, que seu único problema é, em certos momentos, não conseguir dosar da melhor maneira. Jennifer B é em certos momentos mais experimental que MOTOMAMI, e isso funciona a seu favor na maior parte do tempo.
Uma mistura de art-pop britânico, beleza orquestral, tradicionalismo musical inegavelmente europeu, com… Tamagotchis, gelatina, bolhas de sabão, cócegas bêbadas com um date muito gostoso, mas muito burro, do Tinder.
Há respiros de pop mais “normal” que brilham muito com o adorno da produção maluca e incrivelmente bem executada de Skye, como “Greatest Hits”, “Concrete Over Water” e “Glasgow”. Mas o todo é o que vale a pena. É pelo todo que dá vontade de ser amigo deles.
Amanda Machado
6
Rosalía
“MOTOMAMI”
Existiam boas expectativas para o sucessor de “El Mal Querer”, mas ninguém esperava o pé na porta que “MOTOMAMI” seria. O flamenco encontra o hyperpop, o reggaeton, o jazz, e até mesmo o techno nesse disco que cumpre a missão quase impossível de fazer tudo isso funcionar. E tudo funciona pela entrega emocional de Rosalía.
A espanhola nos convida para dentro de sua alma, coração e mente, e espera de nós a sensibilidade para compreender esse universo íntimo. Expandindo e unindo os conceitos de seus dois primeiros álbuns: se “Los Ángeles” cobria suas feridas com flamenco tradicional perfeitamente executado, e se “El Mal Querer” estava decidido a apresentá-la como candidata a estrela mainstream do pop latino contemporâneo, aqui, ela traz as virtudes do passado, deixa os pleonasmos, e mira no futuro. Vanguardista, verdadeiro, e portador de um conceito que, francamente, até agora não entendi, mas vejo claramente que está lá. Esse é o rugido e o desafio de uma obra cheia de gana, como poucas hoje tem a audácia de (e a competência para) ser.
MOTOMAMI é um disco que, na primeira audição, te atropela; e depois de algumas, te coloca pra dirigir a moto.
Bernardo Liz
5
Natalia Lafourcade
“De Todas las Flores”
Existem formas de arte as quais nos deparamos durante nossa passagem por esta vida que fazem da busca por palavras descritivas uma disputa que não pode ser vencida. Quanto mais se pensa em adjetivos que possam definir a beleza de “De Todas Las Flores” mais entendemos a magnitude desse álbum que não se pode explicar. A dissertação é desnecessária e a empolgação aqui deve ser vivida e não descrita.
É um álbum sobre viver, e assim deve ser vivido.
Pietro Stefani
4
JID
“The Forever Story”
Existe um fenômeno engraçado no Rap/Hip-Hop contemporâneo estadunidense que pode ser comparado com as categorias de base do futebol brasileiro. Muitos campeonatos, muitos jogadores, muitas promessas de inovar e mudar o jogo, mas são poucos os que conseguem de fato quebrar a barreira do estrelato.
O “próximo fulaninho” ou “estamos diante de uma estrela em ascensão” é constantemente martelado numa tentativa desesperada de se agarrar há algo que represente uma possível salvação de algo que vive muito mais do seu brilhante passado brilhante que do que do frustrante presente.
Em “The Forever Story”, JID não só quebrou a barreira, como a destruiu por completo. Confirmou todas expectativas que pairavam sobre ele desde seu primeiro disco lançado em 2017 e lançou não só um dos melhores álbuns do ano como um dos grandes da história do gênero.
Pietro Stefani
3
Big Thief
“Dragon New Warm Mountain I Believe In You”
A mistura de rock, folk e americana do Big Thief encontra equilíbrio perfeito no vasto e diverso “Dragon New Warm Mountain I Believe In You”.
Aclamado pela crítica e um favorito instanâneo dos fãs, o disco apresenta algumas das composições mais marcantes de Adrienne Lenker, com a banda trabalhando em direções variadas mas que, incrivelmente, funcionam juntas, entregando uma tracklist onde cada canção é seu universo particular.
Big Thief é uma dessas bandas que nos faz refletir sobre a vida, sobre nosso lugar na terra, e nosso lugar na sala de estar durante o café com a família. Por tanto impacto e por tantos trabalhos de qualidade irrefutável, também nos faz refletir sobre a incompetência da indústria musical — como essa banda não é uma das mais conhecidas da atualidade?
Bernardo Liz
2
Black Country, New Road
“Ants From Up There”
Despedidas nunca são fáceis. No segundo álbum de estúdio de Black Country, New Road, Isaac Wood nos deixa com um clássico moderno como lembrança.
O gosto não poderia ser mais agridoce. Black Country New Road é um coletivo de artistas em um mundo individualista que sempre irá clamar por super estrelas que ajam de maneira específica a ponto de suprir expectativas infindáveis. O mundo precisa de MCCartneys e Lennons; de Morrisays e Brian Wilsons. Por Deus, o mundo precisa de Chris Martin para falar de Coldplay. E sejamos sinceros, Wood era essa estrela, vindo a se tornar, após os dois maravilhosos discos da banda, uma Supernova, gigante e magnética, que deixa estupefato qualquer um que o observe em Ants From Up There.
O ponto em questão é que, junto a ele, na constelação artística que é BC, NR, há corpos celestes tão singulares e magníficos quanto. Nesse sentido, imagino que Isaac Wood tenha sido tomado pelo medo de não poder dar o que pediriam dele. E é nessa toada astrofísica que acontece o vasto universo de Ants From Up There. Por vezes denso e claustrofóbico, por outras jubiloso e frenético. Os 7 músicos controlam o tempo e o espaço como querem: dilatam os segundos na empolgante Chaos Space Marine e tornam os minutos mais morosos com a dolorosa e emocional Bread Song. É uma obra tão meticulosamente perfeita e harmoniosa que é difícil de acreditar que tenha sido gravada por inteiro ao vivo e em conjunto.
Pietro Braga
1
Beyoncé
“RENAISSANCE: act I”
Apenas o início, mas muito mais do que isso.
A renascença contemporânea liderada por Beyoncé está preses a ter continuidade, no ato II, onde os sinais visuais do country irão protagonizar a música também. Mas o ato I, lançado em 2022, foi o que projetou essa narrativa rumo ao futuro, e é ele o disco que segue ecoando de forma pulsante entre os fãs, e retumbando com influência na cultura.
RENAISSANCE: act I (ou Reny para os íntimos) apresentou Queen B se apropriando de um estilo que parece sempre ter sido seu lar, tamanha a familiaridade com que sua voz e persona se encaixam aqui. O disco e o house podem não ter tido protagonismo em sua carreira até então, mas conforme sua liberdade artística cresce, mais ela se permite abordar (e nos convidar) àquilo que conversa com sua verdade. Não à toa, o último single do ato I se chama “MY HOUSE”.
Tudo que RENAISSANCE se propõe a fazer, ele faz com maestria. Dance, house, disco, pop, R&B, tudo isso se reúne nesta pista de dança que ostenta timbres meticulosamente desenhados e escolhidos para tornar a experiência da pista de dança de Beyoncé irresistível. Chega a ser estranho pensar que após seis álbuns solo, ela nunca tinha adentrado a seara dance com tamanho foco. Mas se esse era o tempo que ela precisava para entregar algo a essa altura, a espera valeu a pena. Não há baladas aqui, o BPM é alto do início ao fim, e, por mais que uma grande parte das músicas funcione incrivelmente bem isoladamente, nada supera a audição completa desse disco.
Acima de tudo, a opção pelo disco-dance aqui é sobre o convite. Em um momento de libertação como o que, ao menos esperamos, estar vivendo, Beyoncé ocupa mais do que nunca o lugar de rainha, mãe, bastiã de um movimento que é preto acima de tudo; mas também é sobre auto-amor, feminilidade, sensualidade e um empoderamento que faz alguns feminismos brancos e liberais parecerem, francamente, uma piada.
Não há renascença sem redenção. Não há renascimento até a coroação. E não há castelo melhor para a coroação do que a pista de dança.
Amanda Machado