Crítica | HAIM - I Quit

Não existem términos que não se estendam mais do que o necessário.

Assim como o início de um relacionamento, o processo de deixar para trás é ultrassensível e passa por uma montanha-russa de emoções. Episódios maníacos e depressivos vem e vão, se substituindo de forma deliberada, como em uma partida de vôlei. Mas, diferente do procedimento padrão e melancólico que paira sobre grandes álbuns de término, o grupo das três irmãs Haim - que sempre teve facilidade em invocar o sol e evocar o verão com acordes otimistas, melodias solares e uma diversidade instrumental que parece uma injeção de vitamina C — entrega em I Quit uma ruptura categórica ao padrão da temática: independentemente do sentimento que permeia essa fase, a visão sobre a decisão é única e definitiva.

A enfática Down to Be Wrong é uma exclamação redundante dessa percepção. A admissão de poder estar errada é assombrosa por si só, e assumir sua irreversibilidade é um ato de coragem e necessita certeza. Como ouvimos no outro “Red lights are up ahead, but I’ll keep walking”, Danielle canta sobrepondo-se às harmonias de Alana e Este, encerrando a faixa e prontificando a narrativa.

Do outro lado do espectro emocional, a comunicabilidade entre os sentimentos contraditórios se encontra em Cry — a balada melodramática que diz respeito a eternidade dessas relações. O piano em loop ocupa o centro da mixagem mas se mantém contido, como pano de fundo, quase como se quisesse nos lembrar que, às vezes, reprimir pode ser uma forma legítima de sobrevivência.


A permissão para culpabilizar o outro pelo desfecho de uma relação surge nas duas faixas mais folks e sensorialmente acústicas do álbum, prezando muito pela forma como se comunica. Love You Right, conduzida pelo violão e pela percussão delicada, ainda abre espaços para acordes de piano lindíssimos no refrão, e pergunta com honestidade desarmante: “But to start, could you recognize / It’s hard to love you right?”

“We wanna see you smilin'”,
Said my mother on the hill,
But the distance keeps widenin'
Between what I let myself say and what I feel.
And my sister said, “It's alright,
You can stay with me,
If you need a place to calm down,
‘Til you get back on your feet.”

The Farm, na mesma toada, apresenta uma simplicidade lírica que se apoia em uma estética campestre e visual, enaltecendo a busca pela paz através da efemeridade da vida com algumas referências dylanescas, com pessoalidade/realidade trocando socos com metáforas verso após versos para descobrirem qual maneira menos (ou mais) doloridade de se contar uma história. A gaita de boca que surge antes do último verso é um pequeno lapso que começa a demonstrar a necessidade de explorar mas o medo de tentar.

Derradeiramente, como prerrogativa à experimentação, o disco segue tentando coisas novas. Lucky Stars, se apoia em elementos do shoegaze, Spinning flerta com o disco/dance oitentista, e Try to Feel My Pain mergulha no jazz - todas sugerindo uma expansão sonora que acompanha uma vácuo identitário completamente normal.

E, assim como qualquer término, o álbum se prolonga mais do que deveria, imerso numa verdade que reflete o seu próprio processo de criação. Em essência, é um momento de desconstrução. Um período em que decisões são tomadas a partir da ausência de um objetivo primário, salvo a abstrata e abrangente reconstrução de si. O primeiro álbum das irmãs Haim em 12 anos não produzido pelo ex-companheiro de Danielle pode não ser o melhor disco da carreira, mas é, sem dúvida, o mais verdadeiro.

7.5

Músicas Favoritas: Relationships, Down To be Wrong, Take me Back, Lucky Stars, Love you Right, The Farm, Try to feel my pain, Spinning

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