Crítica | Pose (2ª Temporada)

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“POSE” RETORNA COM FORÇA E BELEZA PARA SUA SEGUNDA TEMPORADA.

OUTROS TÓPICOS DA MARGINALIZAÇÃO DA POPULAÇÃO TRANS E AS CONSEQUÊNCIAS DA CRISE DA AIDS NA VIDA DA COMUNIDADE SÃO O FOCO NO SEGUNDO CICLO DA SÉRIE.

Um ano depois do início da série que fez barulho entre os telespectadores estadunidenses, “Pose” retorna com uma temporada mais calma, lenta e com maior desenvolvimento. Essa foi a resposta da posição firme da FX e de Ryan Murph para manter a série por mais algumas temporadas confirmadas, aumentando o número de episódios para os dez que contam as novas tramas envolvendo as personagens da obra. Só para já avisar: não é tão poderosa quanto a primeira temporada, mas é tão brilhante e maravilhosa quanto.

Pose - 2 temp - critica

O clima nessa temporada já começa diferente. A primeira possui episódios iniciais de superação, cumplicidade e um clima, que dentro do possível, é feliz se comparado aos episódios finais, que adentram mais na trama dramática e são terrivelmente tristes. Na segunda temporada, temos um início já terrivelmente devastador. As consequências da crise da AIDS dentro da comunidade LGBTQIA+ é exposta sem nenhum pudor e a perseguição lgbtfóbica, mesmo dentro de tamanha tragédia, é também mostrada em praticamente todos os episódios doloridos do início da temporada. É aqui, mais do que nunca, que a série vê uma oportunidade de colocar em palco a relevância do personagem Pray Tell (interpretado pelo brilhante Billy Porter) para a comunidade e na luta política que envolve as pessoas com as quais ele vive junto.

Há um passo estratégico e inteligente de se envolver, meio a este cenário, personagens mulheres cisgêneras lésbicas que foram tão importantes para o suporte da luta que os homens gays e as mulheres trans estavam traçando nos anos 80. E há a inserção na história de movimentos políticos importantíssimos para a luta dos direitos da comunidade soropositiva: o Act Up de Nova York é um marco na história e foi muito bem pautado na segunda temporada. É este o foco do episódio inicial, “Acting Up”: revelar a história do Act Up como uma aula de como os movimentos civis LGBTQIA+ se comportaram e criaram estratégias brilhantes, das linhas pacifistas ou radicais, durante os anos 80 e 90.

É desta forma que, novamente, Pose se posiciona mais uma vez não somente como uma série romântica, mas também como um retrato e documento de algo que a comunidade LGBTQIA+ viveu e ainda repercute até hoje. Os direitos alcançados na contemporaneidade têm a palavra e os corpos de cada um daqueles personagens. O mais deprimente disso é levar a agressão a cada 40 minutos da série para que seja possível perceber quantos morreram para que fosse palpável alcançar os avanços que a comunidade vive hoje.

Pose - 2 temp - critica

Após um acontecimento que muda a dinâmica da série no episódio 4, a segunda metade da temporada tem um caminho menos pesado e dramático, dando destaque às belezas de difíceis conquistas e lutas travadas das personagens femininas. É aqui que a relação das personagens Angel, Blanca, Elektra e Lulu vai no auge da química, o que torna assistir as quatro em uma conversa no carro algo tão prazeroso quanto os aprendizados sobre a história LGBTQIA+. Todas elas têm arcos muito bem estruturados nesta temporada, e são visíveis o crescimento e a facilidade das atrizes de lidar com algo tão bonito de se ver como a possibilidade de testemunhar mulheres trans ganhando visibilidade e relevância em um cenário nacional, cada uma de sua forma.

Com novas relações românticas e a inclusão da pauta sobre a arte drag, a série caminha muito bem na segunda metade, focando menos na crise da AIDS, e resolve afirmar discussões aprofundadas sobre masculinidade e representatividade. É bonito vivenciar uma série na qual não é pautada uma rivalidade, mas sim a cumplicidade de estar no mesmo poço que a sociedade coloca a comunidade LGBTQIA+. O caminho de Ricky e Damon é uma prova clara de que a série tem o poder de mostrar relações humanas complexas, e não simplesmente os padrões homo românticos já pautados várias vezes na TV e no cinema.

Para coroar tudo, os últimos 15 minutos da temporada são um tapa na construção imagética do sonho americano, um posicionamento político declarado contra os poderes que comandam o país. Os momentos finais demonstram que os marginalizados se comportam e lutam pelo patriotismo também, com menos exclusão e mais diversidade, como representado de forma brilhante no corpo da magnífica Blanca, mulher trans negra e de linhagem dominicana, interpretada por MJ Rodriguez. Mais do que o encerramento da primeira temporada, o final aqui é uma afirmação de esperança de dias melhores para os personagens que se encontram em um mundo ainda pior para a comunidade na qual estão inseridos, e para os nossos, os marginalizados ainda em 2020.

Ainda que menos poderosa que a primeira temporada, “Pose” não sai do salto alto e entrega beleza acima da grande maioria das produções lançadas atualmente. É, novamente, um marco. Poderoso, belo, surpreendente e imperdível.

9,5


Segunda temporada de “Pose” disponível na Netflix.

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