Crítica | Positions - Ariana Grande

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Quem não ficou mais tarado nessa quarentena, não é mesmo?

Que fique claro: nenhuma megaestrela do cacife de Ariana Grande tem a capacidade de refletir sobre términos ou amadurecimento pessoal de forma tão acessível e comercial - e ainda assim esbanjando tanta competência. Ariana já assumiu o título de maior diva pop dessa geração e não há ameaça quanto o posto.

A partir dessa afirmação, é interessante perceber que sua evolução musical é, literalmente, cronologicamente gradativa. Ela, durante toda sua carreira, estabeleceu um limite com um álbum e o quebrou com o próximo. Esse é seu padrão. Sua constante evolução reflete no amadurecimento de seus projetos um após o outro, tanto na forma e conceito de suas letras quanto nas suas escolhas de produção, culminando no introspectivo e divertido, emocionalmente pesado por partes e elétrico por outras, Thank U, Next.

Tendo isso em vista, se torna inconsciente a expectativa que Ariana Grande irá necessariamente nos surpreender ou arrebatar a cada novo lançamento. Tal sentimento sempre vai estar presente porque ela nos acostumou a isso. Pois então: Não aconteceu. Musicalmente falando, Positions desce um degrau na incrível carreira da cantora, mas isso não é de todo mal. Seu 6º LP é muito mais passional do que racional, e, consequentemente, onde ela mais parece se divertir desde 2014 com My Everything, seja falando sobre sexo e que seus vizinhos terão certeza que um terremoto está acontecendo em “34 + 35” ou celebrando sua vida e seu talento na incrível “Just Like Magic”.

Há uma falta de coesão musical clara aqui. Por mais que exista linearidade narrativa durante suas 14 faixas, a falta de conectividade entre as músicas é gritante. Elas pouco conversam entre si e perpetuam a sensação de uma playlist organizada - nunca de um álbum bagunçado.

Positions começa com a exuberante, porém exagerada e pouco memorável “Shut Up”. A voz de Ariana (extremamente processada) ecoa e se sobrepõe a instrumentalização orquestral da música, criando uma atmosfera teatral apenas para mandar seus críticos, que tanto lhe cobravam antes de Sweetner e Thank U, Next, calarem a boca. Não faz muito sentido como um todo. A segunda faixa do álbum, que faz alusão a uma posição sexual, é cômica, no melhor dos sentidos. As cordas orquestrais reaparecem aqui, porém dessa vez evocando o som de uma música de abertura de Nintendo Wii ou de algum filme não tão popular da Disney. O contraste com a letra mais explícita da carreira da cantora é, em um primeiro contato, provocativo e estranho, mas aos poucos extremamente cativante. Durante a faixa ouvimos Ariana rir e isso em si é a coisa mais apelativa do álbum. Repito: ela está se divertindo consigo mesma.

Como consequência desse clima despretensioso há muito espaço para otimismo e amor. Aliás, as músicas que refletem a autossuficiência da cantora sempre são inegáveis. Chega a ser invejável o quão vibrante e confiante ela foi em “7 Rings” e o caso se repete - em menor escala - em “Just Like Magic”, que cintila com força e prepotência quando ela destaca que sucesso não é sempre sobre ética de trabalho. Aqui ela explica que acredita na Lei da Atração e que ela é naturalmente atrativa. Em simples palavras, você é o que você mentaliza ou positividade atrai positividade: “Just like magic (Oh), I'm attractive (Ah, yeah), I get everything I want 'cause I attract it ('Cause I attract it, babe)”.

“My Hair” transborda pessoalidade e possui um toque particular muito chamativo. Com seu baixo destacado na mixagem e elementos sedutores e magnéticos de Jazz, Ariana da a entender (“Usually don't let people touch it, But tonight, you get a pass”) que o auge de sua intimidade com algum amante é, nada mais nada menos, que soltar seu rabo de cavalo - que tanto estamos acostumados a ver -, independente da ocasião, e deixar seu cabelo exposto ao toque da outra pessoa. As notas agudas angelicais (seu famoso registro de apito) aparecem pela primeira vez no álbum e ainda assim são mostradas de maneira contida. A mistura entre a sensualidade da produção junto a vulnerabilidade da letra cria um dos melhores momentos de Positions.

Mas como já mencionado, o álbum é pouco coeso. Como as músicas não conversam entre si, elas funcionando isoladamente ou de forma muito potente ou de maneira simplesmente esquecível. “West Side”, “Nasty” e “Six Thirty” são claras tentativas de refinar um beat escrachado de Trap, que só existem para serem revividas com algum remix em parceria com qualquer Lil Baby que estiver mais em ascensão no mainstream daqui 3 meses. “Motive”, com Doja Cat, embora seja funcional, chega com fogos de artificio pro ano novo mas já é páscoa. Com elementos mesclados de House e Disco, parece um pouco desgastada, já que durante o ano ouvimos a mesma coisa executada de maneira melhor (Dua Lipa ou Jessie Ware). Safety Net simplesmente não deveria existir. É frustrantemente genérica em todos seus aspectos.

Porém, felizmente, Ariana, que sempre se sai muito bem em faixas de encerramento, cria um dos momentos mais bonitos do ano na música. Indiscutivelmente, “POV” resta em evidência em relação não só ao LP, mas a toda discografia da cantora. É uma de suas faixas mais maduras até hoje, e com certeza a mais emocionante. Não é surpresa pra ninguém que Ariana muda de namorado como troca de meias (como vimos em seu álbum anterior). Sabemos que ela é uma pessoa muito emocional, mas não houve uma única vez, na minha memória recente, que não apenas ela, mas qualquer outro artista, conseguiu definir de forma tão clara o entusiasmo arrebatador de estar começando uma nova relação, capaz de ressignificar todas as suas inseguranças e medos. Aqui conseguimos ver claramente a chave abrindo o cadeado. A melodia do refrão desce quase em forma de alívio quando ela canta “I'd love to see me from your point of view”. É extasiante e palpável. Sua performance é uma das melhores da carreira também. Além disso, o fato de ser a última faixa de um álbum elétrico e luxuriante agrega muito peso a ela.

No meio a toda empolgação sexual de um novo relacionamento há essa inerente inocência, linda e comovente, de alguém que frequentemente sofre por amor. Ariana pouco pensa aqui. É o impulso irrefreável de uma nova relação.

6,3



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