#ID: Chance The Rapper - Os 10 dias de suspensão que vieram a colorir o mundo

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O que torna um artista relacionável? Não necessariamente fazer músicas com que você se identifique com casos específicos, apesar de também ser uma maneira, mas sim se abrir pra você. Se abrir, como um amigo faria, lhe contando histórias que ao fim de uma jornada te farão sentir como confidentes daquela pessoa.

Não sou das pessoas mais religiosas do mundo, mas me apaixonei a primeira vista por “Coloring Book”, e como diz um amigo meu, “é o tipo de álbum que faz a pessoa mais ateísta reconsiderar sua falta de fé”.

Alguém que consegue transpor minuciosamente, em forma de rimas guiadas pelo seu flow único, o que passa em sua cabeça e na sua vida em determinado momento. É durante uma Mixtape, mostrar um pouco sobre seus 14.440 minutos no colégio e seus 10 dias de suspensão por porte de maconha que deram origem ao nome de seu primeiro trabalho conhecido; em outra falar um pouco sobre seus demônios, auto-descobrimentos, marcas de cigarro e o período nostálgico que anteciparam uma realidade com mais responsabilidades; e por fim, conseguir transmitir o seu amadurecimento (“Nós não usamos as mesmas drogas mais”), o quanto ele odeia e não vai ser rotulado por nenhuma gravadora, e principalmente sobre a importância de Deus em sua vida.

Chancelor Bennet, a pessoa, um nome peculiar, não é diferente do artista Chance, The Rapper. Talvez isso seja a coisa mais fascinante sobre ele. Chance é genuinamente alguém tentando fazer o bem através de suas músicas ou ações sociais e pessoais.

I DONT MAKE SONGS FOR FREE, I MAKE IT FOR FREEDOM

Não acredite em reis, acredite no povo.

Inevitavelmente, na indústria musical, assinar com uma gravadora é por determinado limite na sua liberdade de criação. Basicamente sua criatividade em troca de dinheiro. Para o próprio Chance, mais do que a sua liberdade de criar, o risco alcançaria sua liberdade de se conectar com as pessoas.

Isso gerou frutos e coisas jamais alcançadas. Chance foi o primeiro e único artista que por meio de streaming viu seu trabalho entrar no Top 100 da Billboard, se tornou o primeiro artista independente a ganhar um Grammy sem vender nenhuma cópia física de sua música (com Coloring Book) ou sem assinar com uma gravadora e além disso foi o primeiro artista independente a se apresentar no Saturday Night Live.

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Essa independência dá a Chance a liberdade de trazer consigo quem ele quiser em suas músicas.

Coloring Book contou com uma até então desconhecida Noname e um não tão popular SABA, uma ainda não conhecida e ótima Eryn Allen Kane e até mesmo sua prima Nicole.

Fica claro que não se trata só do fim alcançado aqui, mas sim dos meios e da mensagem que Chance passa, até porque, sinceramente, menos e menos pessoas ligam para premiações racistas e seletivas que descredenciam artistas negros como o Grammy. Se trata da inspiração que Chance the Rapper é para o mundo da música. Por um momento é saber que Depois de 3 Mixtapes extremamente bem sucedidas, ele produz e cria batidas em um estúdio local e solta suas músicas no SoundCloud. Se trata de saber que ele faz música para o povo e pelo povo.

“ Let's make it so free and the bars so hard
That there ain't one gosh darn part you can't tweet ”

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IM IN LOVE WITH MY CITY BITCH I SLEEP WITH MY HAT

Chance tentou se mudar pra Los Angeles. Viveu la durante 4 meses e dividiu um teto com James Blake (que nos rendeu um ótimo remix de “Life Round Here”), mas no fim das contas o único lugar que o Rapper se sente em casa é em Chicago. E não é a toa, Chance The Rapper respira Chicago e faz questão de ser uma presença política e cultural para uma cidade inundada de violência.

Em “Somewhere in Paradise” - Faixa não mais disponível em serviços de streaming porque Chance resolveu retirá-la após descobrir as acusações sobre R.Kelly, além de pedir desculpas por ter trabalhado como alguém como ele - ele rima: They screaming Chano for mayor, I'm thinking maybe I should.

Brincadeiras a parte, ele é extremamente ativo em tentar fazer de sua cidade um lugar melhor e menos violento. Desde pequenas coisas, como comprar um cinema para passar de graça o filme “Get Out (Corra!)” por achar que todos deveriam vê-lo, até ações mais factuais como começar uma campanha contra armas, que parou a violência armada em Chicago por 2 dias, algo quase sem precedentes tendo em vista os altos índices de violência que a cidade enfrenta.

Além disso, Chance arrecadou 2.2 milhões de dólares e doou 1 milhão pro sistema de ensino público de Chicago em 2018, e planeja cada vez mais investir na educação em sua cidade.

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“LOOK AT LIL’ CHANO FROM 79th”

Esse verso em questão é a concretização do músico Chance, The Rapper. Ela trata do fato do pequeno Chance, da Rua 79th de Chicago, ter chego ao ponto de dividir uma música (talvez a melhor música de 2016) com seu ídolo, Kanye West. O verso em “Ultralight Beam” assusta de tão bom. Aquela era a sua parte e ninguém mais poderia falar. Ninguém mais deveria falar.

“Ultralight Beam” foi uma das colaborações mais pontuais da década. Mais do que sua própria letra expressa, representou uma passagem de bastão. Não que de alguma maneira Kanye estivesse pronto pra parar, mas no sentido que em uma corrida juntos os dois sairiam vencedores. Yeezy deu o espaço necessário para Chance se estabelecer como uma força musical e, três meses depois, “Coloring Book” nasceu e a participação de Chance em basicamente qualquer faixa se tornou sinônimo de sucesso comercial. Seja com Cardi B, John Legend, SZA, Skrillex, Jamilla Woods ou na global “I’m the One, de DJ Khaled”. Sua voz é memorável, assim como as eventuais risadas entre um verso e outro; suas estrofes, mesmo que nas músicas mais fúteis do mundo, são inevitáveis; e suas rimas, assim como seu flow, inconfundíveis.

Chance então cada vez mais aprimora sua voz. Cada vez se torna mais versátil como artista. Hoje, canta, do seu próprio jeito (como tem sido durante toda sua carreira) com extrema facilidade, como em “Same Drugs”.

Chance não esquece de suas raízes. Tenta ao máximo fazer de sua cidade menos violenta e musicalmente falando, possui um lindo projeto com músicos e amigos de Chicago. SURF conta com Donnie Trumpet, a incrível Jamila Woods e o resto da banda que o acompanha até hoje.

Chance não esquece quem é. Do jovem suspenso 10 dias do colégio por portar maconha e cantar em ‘‘open mics’’ à figura com grande representatividade para o povo negro americano, para músicos em geral, para sua cidade e para seus fãs enquanto se apresenta em todos os talk shows mais famosos do mundo. A crítica ama Chance justamente por ele ser exatamente quem é. É simples assim. Em qualquer review sobre suas mixtapes vão estar destacados inúmeros elogios sobre seu excepcional trabalho lírico, o que torna as coisas um pouco irônicas. Chance apenas vai escrevendo as páginas de seu livro e nos mostrando em forma de música a linda forma como enxerga o mundo.

Nós sinceramente não poderíamos ser mais gratos por ele dividir um pouquinho de seu livro para colorir o nosso.

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