Melhor Música Nova | Jay-Z - The Story of O.J.

Talvez ainda seja muito recente para se ter uma ideia completa do que 4:44 é como um álbum, mas após a primeira ouvida já se pode presumir que é a melhor coisa que Jay-Z lança em pelo menos dez anos. Dentre as músicas, várias chamam atenção, mas talvez nenhuma seja tão incisiva na sociedade em geral como esta, que fala não apenas sobre Jay-Z, o rapper, o ex gangster, o magnata, o marido de Beyoncé, o pai, mas sobre o que sua pele diz que ele é. Ainda negro. 

Nesta, que é a segunda faixa de "4:44", ele usa a palavra (que todos sabem qual é) repetidamente, como de praxe em sua discografia, mas cada vez que ela é repetida no refrão vem junto de outro adjetivo. Claro, escuro, falso, verdadeiro, rico, pobre, de casa, de fazenda. Para cada um deles ele dedica pouco mais que uma simples linha na música, ou um frame ou outro no maravilhoso vídeo que é o melhor do ano até agora, e é o suficiente para construir uma narrativa de proporções gigantescas e profundas, ligando sua história à de todos os negros na América e na sociedade em geral. Você pode ser um negro claro, escuro, falso, verdadeiro, rico, pobre, de casa, de fazenda, mas você ainda é um negro.

O sample escolhido por ele e utilizado da melhor forma possível por No I.D., é a música"Four Women" de Nina Simone, que fala sobre quatro mulheres negras de tons de pele diferente, e suas dificuldades na vida. A atmosfera de jazz preenche o espaço em torno da batida, dinâmica conforme a performance de Jay acelera ou cadencia, e os vocais de Nina Simone reaparecem sempre aqui ou ali, trazendo o peso da faixa original. É uma musicalidade retrô, triste, mas com um toque de ironia pela falta de perspectiva que essa sociedade enxerga que é aguçada pela performance de Jay-Z, que parece ser uma figura onisciente com relação a esse assunto. 

O nome da faixa, a história de O.J., vem do ex-jogador de futebol americano O.J. Simpson, que fora acusado de assassinar duas pessoas em 1995. Em um vídeo, lançado exclusivamente no Tidal (obviamente), Jay-Z traz diversas celebridades e artistas negros (Kendrick Lamar, Will Smith, Michael B. Jordan, Chris Rock, Mahershala Ali entre outros) para comentar sobre o racismo, e explica a utilização da frase "I'm not black, I'm O.J.". De acordo com o próprio, muitos negros acreditam que quando sucedem não são mais negros, e sim são eles próprios. Nesta música Jay-Z atesta, que mesmo com todo seu sucesso, ele continua sendo negro, para ele próprio, e na visão pejorativa de tantos na nossa sociedade. 

"The Story of O.J." não vai ser um hit, não vai fazer mais barulho que "Kill Jay-Z" e sua briga com Kanye, "Smile" e a história de sua mãe lésbica, ou que "4:44" e sua reconciliação com Beyoncé. A luta contra o racismo não vende mais do que fofoca sobre a vida alheia. Mas essa é facilmente uma das melhores músicas em toda sua carreira, onde ele quer acima de tudo mostrar a realidade sobre o racismo na América, como ele enfrentou tudo isso em sua ascensão ao seu posto hoje, e como parece que suceder não é o suficiente nessa sociedade. Possivelmente o maior rapper que já existiu, o mais bem sucedido, pai de três crianças e marido de uma das maiores artistas da vida moderna, he is not a businessman, he is a business, man.

Ainda assim, negro. 

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