Crítica | Abaixo de Zero

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Encontrei poucas informações sobre “Abaixo de Zero”, novo sucesso da Netflix no Brasil.

Dirigido por Lluís Quílles (que não conheço), o longa é um dos mais de 60 títulos prometidos pelo serviço em 2020, mas acredito que nem eles próprios esperavam que se tornasse o mais assistido em qualquer lugar. Girando em torno de uma tentativa fracassada de transferir prisioneiros, “Abaixo de Zero” mostra os esforços do oficial Martin (Javier Gutiérrez) para completar a missão sem que mais baixas aconteçam durante o ataque sofrido pelo caminhão forte.

Procurando tornar toda a experiência em algo claustrofóbico e tenso, Quílles aposta em um filme com cores mórbidas e mergulhado na escuridão, obviamente para nos condicionar a sentir o mesmo desespero que seus personagens. Não que a estratégia funcione sem soar óbvia, ainda mais graças a dificuldade do cineasta em criar planos memoráveis, que acabam marcando mais pela violência gráfica do que pela forma como tais cenas foram filmadas. No entanto, a edição faz um bom trabalho de passear pelos ambientes fechados, sendo que a melhor cena do longa, ao menos visualmente, é aquela onde Martin tem de enfrentar os presos em um corredor estreito e com várias portas obstruindo a visão de todos. Destaco, também, a sequencia que envolve o afundamento do caminhão, por mais que os efeitos não sejam perfeitos.

Co-roteirizado por Quílles e por Fernando Navarro, não se pode dizer que é uma história original, mas isso pouco importa, pois a melhor habilidade de Quílles como diretor, aqui, é conduzir a narrativa com energia e antecipação, mesmo que não consiga transformar suas revelações em momentos de catarse ou aproveitar o dilema que vivem seus personagens ao máximo. Isso se dá justamente pela falta de desenvolvimento da maioria destes personagens, que com a exceção de Ramis (Luis Callejo) jamais apresentam qualquer motivação ou complexidade. Martin, o protagonista, quer apenas cumprir seu dever e jamais descobrimos nada sobre ele, que serve apenas como bússola moral do longa (embora sua troca de postura ao descobrir um detalhe importante sobre um jovem, ao final, enriqueça o debate provocado pela obra). Além disso, alguns momentos chegam a gerar vergonha alheia, como aquele onde Montesinos (Isak Férriz) mexe a mão e depois parte em uma perseguição ilógica, ou quando Martin está no meio da estrada e, ao perceber que está sendo atacado, não esboça qualquer reação que um policial treinado exibiria.

E este é o maior problema de “Abaixo de Zero”, por mais tenso que seja, jamais me importei com qualquer daquelas pessoas. Por exemplo, quando Miguel (Karra Elejalde) revela sua motivação, já estamos nos últimos momentos da projeção, meio tarde para que possamos escolher qualquer lado. Enquanto o jovem Nano (Patrick Criado) acaba se tornando alguém apenas nesse momento, pois até então era um MacGuffin (um dispositivo do roteiro para fazer a história andar, como a maleta dourada em “Pulp Fiction” ou o dinheiro em “Psicose”). E se o objetivo era discutir qual o sentido de justiça, e a ineficiência desta como instituição, temos exemplares melhores em filmes como “Tropa de Elite” e “Vingança a Sangue Frio”, e outros medíocres como “Código de Conduta” e todos esses que envolvem personagens partindo em busca de vingança.

Não resistindo ao impulso de abusar de uma trilha sonora inexplicável que tenta adicionar camadas inexistentes, Quíllez delega à trilha algo que faltou em seu roteiro, tentando encontrar um senso de “grandeza” nos atos de todos os envolvidos, quando claramente todos são movidos por instintos quase animais.

Tenso o suficiente para entreter e com algumas cenas capazes de te deixar na ponta da cadeira, “Abaixo de Zero” é a prova de que nem a Netflix sabe o que vai fazer sucesso, pois entre assistir a este filme ou a outros clássicos da ação (e alguns nem tão antigos), é melhor revisitar outros que, mesmo já conhecidos, ainda vão despertar qualquer emoção além do agora.

4.5

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