Crítica | Extermínio (28 Days Later)

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Após assistir um filme desses e ver como foi a pandemia no Brasil, tenho certeza que estaríamos mortos em menos de duas semanas.

“28 Days Later”, ou sua péssima tradução “Extermínio”, acompanha Jim, 28 dias após um vírus atingir Londres e, aparentemente, o mundo todo, e como este acorda em um hospital vazio em uma cena que já se tornou icônica e reproduzida em diversas mídias. Em busca de qualquer coisa, Jim encontra outros sobreviventes e tem de continuar a fazer o mesmo sem ter qualquer certeza do futuro.

De cara, não sei se sou um fã de zumbis ou apenas gosto de histórias pós apocalípticas, mas por mais repetitivas e clichês que sejam, constantemente me pego magnetizado por obras como esta de Danny Boyle. Infelizmente, o próprio acabou abraçando algumas tendências da época, musicais principalmente, que comprometeram um filme que tinha tudo para ir além de ser um dos melhores do gênero. Pense bem, a cena inicial começa de maneira perfeita: uma cidade gigantesca vazia, um personagem que não sabe o que aconteceu, qual a melhor trilha sonora para isso? Definitivamente não o rock pré-Emo utilizado (a resposta certa, caso não tenham pego de primeira, é o silêncio, é claro).

Mas Boyle comanda tão bem a narrativa e compõe seus quadros de tal maneira que mesmo estas escolhas clichês não a estragam. Em uma cena em particular, vemos os sobreviventes trocando o pneu em um túnel escuro, e apesar de todos sabermos que algo de errado vai acontecer, quando acontece ficamos ansiosos do mesmo jeito. Fotografado com cores lavadas por Anthony Dod Mantle (cujo trabalho anterior em filmes do Dogma 95 casaram perfeitamente aqui), a falta de vida em uma cidade já cinzenta por natureza tornam cada pequena cena em uma espécie de calabouço, como se não importa onde estejam, os personagens estivessem encurralados, algo que Boyle ressalta ao filmar em ângulos distorcidos, plano holandês e ao constantemente fechar prédios, paredes e estradas em torno do grupo - novamente, o silêncio absoluto aqui tornaria este filme devidamente intragável.

Impressionando também do ponto de vista dramático, o longa é recheado de momentos onde os personagens questionam a si mesmos quais os motivos de se continuar vivo em um mundo morto, com diálogos simples, mas inevitavelmente eficazes (estava pensando que nunca mais vai ver um filme que já não tenha sido feito?) e momentos onde eles parecem aprender a apreciar as pequenas coisas (“Zumbilândia” falaria mais sobre isso), como um supermercado intacto e um bando de cavalos livres, correndo (e é um mérito do diretor sempre nos fazer pensar que algo de ruim irá acontecer em cada cena). Além disso, o roteirista Alex Garland ainda acha espaço para comentários políticos e sociais, que mostram como, volta e meia, o vírus é o menor dos vilões da humanidade.

Mais importante, ele escreve personagens que, a primeira vista, nos desafiam, mas que aprendemos a nos importar e, por isso, tememos ainda mais por seus destinos. Cillian Murphy encarna Jim como um jovem que poderia até ser um pouco babaca e artificialmente desprendido, mas que mostra valores morais e compaixão que o tornam em um homem imperfeito, mas um herói relacionável. Naomie Harris, por sua vez, encarna uma forte mulher em Selene, que ainda dá um tapa na cara da audiência, e de Jim, ao informar que a grande quantidade de remédios que carrega é por ser química formada e ter acesso a eles. O veterano Brendan Gleeson chega a nos fazer desconfiar no começo, mas logo se mostra um daqueles grandes pais do cinema, ao fazer questão de cuidar de todos e da forma como fala com a filha em determinada cena, uma pena a Hannah de Megan Burns ser um pouco engessada e sem emoção.

Sucedendo em pintar o mundo com cores fúnebres e em retratar o quão fácil é para o homem recorrer à barbárie, o longa falha apenas em transformar seu final em um thriller de ação quase barato, mesmo que não deixe de ser intenso e visualmente fascinante.

Começando de forma quase brilhante e influenciando a retomada do gênero, “Extermínio” é um ótimo filme de zumbis, mas um estudo sobre a humanidade ainda mais afiado.

8.2

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