Crítica | Valsa Com Bashir
Um de meus temas favoritos no cinema reside na busca inerente por memórias.
Certamente um dos assuntos mais abordados por cineastas que, ao longo dos anos, relembram, criam, modificam e contam estas das mais diversas formas. Porém, poucos filmes são como “Valsa Com Bashir”, uma obra auto-biográfica, escrita, dirigida, animada e interpretada por Ari Folman, onde o mesmo tenta recordar um momento chave de sua vida: sua experiência na guerra do Líbano.
Porém a forma como Folman decide fazer isso é o mais fascinante, pois “Valsa Com Bashir” é um raríssimo documentário animado que, apenas por isso, já deveria ser conferido.
Justificando sua peculiar escolha, Folman não deixa de aproveitar a infinidade de possibilidades que as animações proporcionam: a primeira sequência do filme é uma das melhores representações de um pesadelo que já assisti, com uma combinação de cores sóbrias (tons frios de azul) e urgentes (um tom meio mostarda, meio macabro de amarelo), um bando de cachorros corre em direção a um lugar específico, assustando todos por onde passam e causando o caos mesmo sem jamais desviar sua atenção do objetivo final. “Eles vieram para me matar”, um ex-companheiro de guerra de Folman o fala, em um bar escuro, com olhares suspeitos. Mas então aprendemos que o único motivo de o homem sonhar com os animais é porque ele os matou, olhando nos olhos de cada um (exatamente 26) o que o fez se lembrar meticulosamente de cada um. É a primeira sequência do filme, e oferece duas das muitas emoções que Folman procura passar durante o longa. O terror do passado e a dor por tê-lo vivido.
Infelizmente o cineasta jamais atinge o mesmo patamar, mesmo que se aproxime em diversos momentos. Em uma cena um soldado escapa da morte nadando no mar escuro, apenas para se arrepender por ter sobrevivido e não morrido ao lado dos seus - o que rima com a primeira conversa do diretor, quando este vê que seu amigo olha para o mar revolto em sua frente de maneira preocupante, mas ao invés de voltar a ele, Folman segue seu caminho. Em outra, um homem atira, desesperado, para todos os lados, em um momento que batizou, irônica e poeticamente, o filme. Na mais recorrente, Folman e dois de seus companheiros, os quais ele não recorda exatamente quem são, levantam de um banho no mar enquanto a cidade bombardeada zela os mortos a sua frente, iluminada apenas pelas luzes, novamente laranjas, lançadas sobre ela. A trilha é fúnebre, como se estes homens caminhassem em direção à morte, mesmo que não sejam as suas.
Os diálogos não deixam de ser interessantes por si só, depoimentos verdadeiros que, por mais que visualmente impressionem menos do que as tais sequências, são tão importantes quanto. Ainda assim, há uma sensação de arraste considerável durante diversos momentos, e ao menos duas escolhas musicais que, para mim, não funcionaram (ambas envolvem rock). Porém elas são mais do que bem balanceadas e o final do longa, onde Folman utiliza de imagens reais para nos lembrar que a única coisa que a animação não pode fazer, é reproduzir o horror gráfico de uma guerra.