Crítica | A Chegada
Nada do que vemos em 'Arrival' é novidade. Baseado no conto "Story of Your Life" de Ted Chiang, 'Arrival' conta a história de diversas naves que pousam na Terra, e os esforços dos países ao redor do mundo para entender seu propósito. Os Estados Unidos decidem chamar a especialista em linguagens Dra. Louise Banks (Amy Adams) e o astrofísico Ian Donnelly (Jeremy Renner) para tentar estabelecer contato com as formas de vida dentro das naves. O que faz esse ser o melhor filme de ficção científica do ano, e o melhor de seu sub-gênero desde o início dos anos 2000 não é a novidade, e sim a forma como ele é contado.
Ao invés de centrar a história nos alienígenas, o roteiro de Eric Heisserer se utiliza dela para mostrar o drama da Dra Banks, que dentro da própria cabeça alterna o presente com o passado, uma personagem complexa e cheia de camadas. A direção acompanha essa decisão de forma inteligente, Dennis Villeneuve já havia provado seu talento em filmes passados, 'Sicario' o exemplo mais recente. Junto a fotografia de tirar o fôlego de Bradford Young, o diretor consegue dar a escala necessária a história, alternando bem entre planos abertos quando se quer mostrar o impacto dos acontecimentos, e fechados quando o objetivo é mostrar a tensão provocada pela invasão. A sensação de dúvida e caos provocada por um acontecimento desses é essencial para um filme assim, mas ele consegue recriar isso de forma natural, algo quase agoniante, é um mundo que reage inteiramente à seus acontecimentos, e grande parte da tensão presente é pela dúvida e pela espera, não pelo que realmente acontece. Ainda assim seu principal feito aqui foi deixar o terreno aberto para que sua estrela pudesse tomar conta do filme, e ela faz isso excepcionalmente.
Amy Adams é uma das atrizes mais talentosas de sua geração, e esta é uma de suas melhores performances. Se percebe claramente sua falta de ação com relação a tarefa que lhe é dada, seus olhares são surpresos, ela cria dúvidas momentâneas percebíveis, mas logo é tomada de uma força de vontade admirável. Seus momentos de sofrimento são tão emocionalmente desgastantes como suas pequenas conquistas são gratificantes. É uma atuação exemplar, e que deveria levá-la ao Oscar mais uma vez (vim do futuro, e digo que não levou). Jeremy Renner e Forrest Whitaker estão sólidos, e tiram o melhor de seus personagens, mas eles não foram escritos para serem profundos ou pontuais na história, o show é inteiramente dela, o que funciona em partes, sendo que coadjuvantes mais incisivos teria aumentado ainda mais o impacto de sua atuação.
Tecnicamente se vê pouco, mas o pouco que se vê impressiona. As naves são simples, mas quando as vemos de perto, sua estética é tão bem feita que pode se pensar que aquilo são na verdade efeitos práticos. Nada de raios, feixes de luz que vão até o céu ou dispositivos e luzes exageradas, o próprio design dos Aliens importa menos do que seus mistérios. Quando vemos o primeiro deles por completo a escala é quase ameaçadora, há um forte senso de perigo, mas que, sim, poderia ter sido melhor aproveitado.
Se falta algo a Arrival é a falta de conflito que toda a tensão e esse senso de perigoconstruíram durante todo o filme. Pelo trailer, imaginava que a primeira interação com os Aliens fosse tensa e problemática, mas é mais curta do que deveria ser. Quando se descobre a verdadeira intenção deles é algo plausível, mas corta a esperança por um clímax mais poderoso do que aquele do ato final. Mas 'Arrival' não queria impressionar por algo barulhento, seu objetivo é mais subjetivo, provocar a reflexão após o final de sua exibição. E apesar de seu final ser confuso e não fechar na mesma escala que o filme sugere, é impossível não sair do cinema com a cabeça virando diante dos conceitos explorados ali.
'Arrival' é um filme que vai te fazer pensar, e pensar por um bom tempo. Sua mensagem é proeminente, e questiona diversas coisas em que acreditamos, enquanto faz um estudo profundo sobre a linguagem e a condição humana. Com uma performance magistral de Amy Adams, é um filme de ficção científica que funciona principalmente por fazer do seu drama algo relacionável e interessante. Seu ato final não fecha o filme da melhor forma, mas não estraga o que é um dos melhores filmes do ano até aqui.