Crítica | Nasce Uma Estrela

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Talvez nenhum filme nestes últimos anos tenha feito tantas pessoas chorarem como a quarta versão de “Nasce Uma Estrela”.

Recentemente reprisado na TV aberta, percebi que não temos crítica no site e, embora a princípio não fosse escrever, ao rever o filme percebi coisas que antes haviam passado desapercebidas e que me deixaram com vontade de expressá-las.

Dirigido por Bradley Cooper, que também canta, compõe e atua, a quarta versão desta história (e que não deve ser a última) nos mostra o relacionamento do cantor Country Jackson Maine e da mais nova revelação do Pop, Lady Gaga - e percebam como não precisaria explicar a piada para vocês entenderem que me refiro ao fato de Ally ser, em suma, uma versão de Gaga.

De cara, ainda não me convenço com a atuação da artista, que alterna bons momentos com outros inexplicavelmente amadores como aquele onde ela está em uma banheira e responde com uma ingenuidade digna de uma atriz de peça de escola (“você parece uma estrela” “SÉRIO?”), e outro quando acorda e enxerga Jackson a seu lado convencendo tanto como o emoji de “surpresa”. Porém, ao pegar um microfone na mão qualquer incerteza desaparece, pois a Lady Gaga cantora é uma das mais talentosas e comprovadas de sua geração - e, talvez não por um acaso, preferi sua fase Country à Pop, e gosto muito da Pop!. Cena após cena sua voz impressiona, mas não apenas isso, a atuação diante do microfone melhora, como quando cobre o rosto de vergonha ao deixar atônita uma plateia com a qual jamais havia imaginado.

Entendendo que Gaga é a estrela do filme, Cooper faz de tudo para que a enxerguemos como seu personagem a enxerga e o diretor estreante consegue uma proeza que nem todo filme romântico consegue: mostrar o exato momento onde um personagem se apaixona pelo outro e, aqui, a complexidade temática de “Nasce Uma Estrela” começa a aparecer. Sentado em uma boate LGBTQIA+ (espero não ter esquecido nenhuma letra), Jackson vê Ally cantar uma versão apaixonante de “La vie en Rose”, banhada por uma luz entre o vermelho e o rosa e se deitando exatamente a sua frente. Ao vermos seu rosto, olhando diretamente para câmera, é o suficiente para que nos apaixonemos por Ally no mesmo momento que Jackson.

Mas percebam como ela reluta em aceitar, ou demonstrar, qualquer sinal de compartilhar o mesmo sentimento. Na verdade, acredito que a melhor forma de descrever o que ela sente por ele é utilizando a expressão, em inglês, sweept off her feet, como se Ally estivesse maravilhada com a drástica mudança em sua vida e então seu sentimento por Jackson veio como acompanhante. Mas mais importante, e debatido do que isso, é a natureza da relação dos dois, pois enquanto Ally ascende para uma carreira meteórica, Jackson decai e contemplarmos a metamorfose que ambos passam ao longo do filme é fascinante.

Interpretando Jackson com uma intensidade que preocupa na mesma proporção que encanta, Cooper é o tipo de ator que toda mãe é apaixonada. Não me perguntem porque, elas apenas são (e não que seja difícil). E apesar de não ser um personagem real, é fácil perceber as inspirações para o personagem que incluem, principalmente, a voz de Sam Elliot, que protagoniza uma sub-trama comovente catalisada em uma cena que rendeu ao ator sua indicação ao Oscar. Oscar esse que Cooper poderia ter sido duplamente indicado, pois seu trabalho por trás das câmeras é quase tão impressionante como aquele a frente delas. Conseguindo ilustrar como Jackson e Ally parecem presos e oprimidos em cômodos fechados e desorganizados, Cooper os liberta apenas nos palcos, onde a câmera na mão dá um ar quase documental aos shows, sem nunca deixar de ser puramente cinematográfico. Com isso, ele cria cenas e mais cenas marcantes, com destaque para, obviamente, a primeira apresentação de “Shallow” e a cena final, da qual falo a seguir.

Acompanhada pela minha música favorita do longa, vemos Ally cantando uma música que havia composto junto à Jackson e, ao saber do final de suas trajetórias e sermos lembrados do início dela (com um raríssimo bom uso de flashbacks), fica difícil não se entregar ao choro, o que me fez perceber o quão impressionante é esta cena em questão. Talvez nenhuma das sete artes tenha tanta capacidade de provocar respostas emocionais como o cinema e a música, e a cena final de “Nasce Uma Estrela” funciona como canção, como cinema e, principalmente, como uma junção perfeita de ambos, com o filme terminando exatamente onde havia começado.

Pois apesar de vermos um pouco de Jackson e Ally antes dele entrar naquele bar, a estrela nasce ali, com o olhar fixado nele (na frente e atrás das câmeras). E se naquela cena o vermelho, do amor, era a cor principal, nada mais justo do que no final termos o azul, da tristeza.

8.7

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