Crítica | O Esquadrão Suicida (2021)

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Para suspresa de todos, saiu um filme de verdade.

“O Esquadrão Suicida” de 2021 nasceu com muita desconfiança por suceder o pior filme do gênero que se tem lembrança. Funcionando como reboot da história vemos aqui alguns velhos e novos personagens numa história diferente do que tínhamos visto. Escrito e dirigido por James Gunn é a prova que ainda é possível fazer blockbusters de super heróis divertidos e criativos com o nome certo tendo liberdade artística para contar sua história. Se a versão antiga era um roteiro que partia de uma premissa incompreensível com uma narrativa incoerente dilacerado por refilmagens e edições, aqui temos o oposto disso: um filme coeso em que a história segue uma linha bastante explícita e todos elementos como trilha sonora, efeitos especiais, fotografia e arte trabalham juntos para o longa funcionar. Pela primeira vez em um filme da DC a personagem de Margot Robbie, Arlequina, me conquistou e é um dos pontos altos de “O Esquadrão Suicida” junto com outros atores de peso como Idris Elba, John Cena e Sylvester Stallone.

Em 2014, quando James Gunn dirigiu sua primeira contribuição para o Universo Marvel com “Guardiões da Galáxia” uma luz piscou para os estúdios: há demanda para comédias de quadrinhos voltados para adultos. Humor ácido, metanarrativa, gore e outras artimanhas adultizantes são sucessos em páginas de revistinhas de heróis há muitos anos, mas havia receio em hollywood de colocá-las num gênero que até então era pra toda família. Ainda que as aventuras de Peter Quill e seus colegas sejam classificadas como PG13 (para maiores de 13 anos) foi a partir desse filme que a Fox decidiu lançar seu “Deadpool” (2016) e a Warner começou seu “Esquadrão Suicida” (2016), os dois classificados para maiores de 16 anos. O filme dirigido por David Ayer fez uma boa bilheteria e apesar disso foi considerado um dos piores filmes de todos tempos (homenageamos ele no episódio 3 do nosso podcast). Histórias de terror nos bastidores do filme contribuíram para arrastar a imagem do iniciante Universo Extendido da DC para o ralo, a partir disso a franquia da Liga da Justiça tem uma mudança nítida de tom, abandonando o sombrio realismo que Zack Snyder propunha em troca de humor rápido e colorido. Mas se a ideia é apostar em uma comédia sangrenta protagonizada por super vilões, nada mais justo que a Warner tenha buscado James Gunn para uma nova tentaiva com o grupo.


A partir daqui vou dar spoilers.


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“É só uma distração” nos conta a personagem de Viola Davis quando vemos um segundo grupo de personagens desembarcando em uma praia com explosões e tiros sendo ouvidos em segundo plano.

Nos 10 primeiros minutos somos apresentados há um novo grupo de vilões formado por Amanda Waller, que conta com Arlequina, Capitão Boomerang (Jai Courtney) e Rick Flag (Joel Kinnaman) além de novas estrelas como Michael Rooker interpretando “O Sábio”, Pete Davidson como “Blackguard” e Nathan Fillion como “O.C.D.”, porém aos 15 minutos do filme (quase) todo o primeiro Esquadrão está morto nas areias de uma ilha sul americana. Esse é o cartão de visitas de Gunn para o espectador: a diversão e o gore são o centro do filme.

Eu ter gostado desse filme em parte mostra como a régua para as adaptações de HQs é baixa, o que é bem verdade, sendo que a melhor parte de “O Esquadrão Suicida” é o fato de não se levar a sério, de James Gunn ter eleito para seu time personagens obscuros e totalmente desconhecidos do público, assim suas interações podem ser mais orgânicas e partir do mesmo pra quem assiste e pros seus colegas de equipe. Com flashbacks e diálogos recebemos informações sobre o passado, sabemos que o “Homem-Bolinha” foi criado para ser um super-herói e seus traumas com isso resultam diretamente na solução do personagem no terceiro ato e isso parece ser muito pensando como esses filmes normalmente funcionam. Desde que chegam na ilha, até o final, cada obstáculo, cada plano, cada inimigo contribui com o enredo de um jeito limpo sem abrir mão do bom humor, como por exemplo a cena em que matam um acampamento inteiro de gente para depois descobrir que eram seus aliados. Essa cena mostra a equipe trabalhando em conjunto pela primeira vez e ainda dá pano para eles trabalharem sozinhos, pois matam agentes que deveriam ajudá-los. Um callback para o filme de 2016, interessante em termos narrativos, é assumir que a chefe Amanda Waller (Viola Davis) é bastante incompetente e excessivamente bélica (como oficiais de segurança costumam ser), isso não só é apontado mas serve para o clímax do filme, quando os personagens descobrem que sua missão na ilha era apenas apagar os registros da participação dos EUA na criação do vilão e não ajudar a combatê-lo.

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James Gunn emprega suas melhores ferramentas nas sequências de ação, nas duas chamam atenção: a primeira quando Arlequina foge da sua prisão. Pela primeira vez no DCEU a essência de desenho animado da personagem foi plenamente projetada, misturando cores e uma personagem leve e bem humorada com muita violência e doses pesadas de suspensão de descrença, exatamente como deve ser. Margot Robbie também parece finalmente ter achado o ponto ideal para interpretação sendo mais carismática do que nas versões anteriores da franquia.

A outra grande cena não pode deixar de ser a última em especial pelo super-vilão extraterrestre estela do mar gigante, ou Starro, o Conquistador, que além de ter um visual sinistro representa uma ameaça real e que parece afetar até o público, e aí outra vantagem de trabalhar com personagens do porão da DC, não sabemos quais podem morrer ou sobreviver. Se em “Liga da Justiça” há certeza que o Batman será imortal pelo tamanho do personagem na série de filmes, aqui não há nada segurando Gunn de fazer o que achar certo para seu roteiro, ainda que nesse longa-metragem possamos criar uma relação com eles e torcer para ficarem vivos. Por último, chama atenção a relação de antagonismo tensa entre Pacificador e Sanguinário, no primeiro momento dá a impressão de ser apenas proveniente da masculinidade como fator predominante na disputa entre os dois por liderança mas ao final do filme eles mostram que têm ideias diferentes sobre o que o grupo deve fazer com as informações obtidas.

“O Esquadrão Suicida” de James Gunn chama atençao por cumprir aquilo que se propõe: é engraçado, é violento, tem uma história bem escrita e nos permite ver um intercâmbio verdadeiro entre Marvel e DC (atualmente Gunn está de volta à Marvel para dirigir “Guardiões da Galáxia 3”). O diretor, com origem nos filmes B, ainda comprova que há espaço sim para criadores praticarem Cinema nos blockbusters e eu espero que isso incentive outros bons diretores a tentarem lutar por suas ideias. Não teremos um mundo com bons filmes de super-heróis, mas com filmes aceitáveis que deixaram uma marca mais consistente no mundo. Eu demorei quase dois meses para concluir essa crítica e várias imagens de “O Esquadrão Suicida” estão muito nítidas na minha cabeça mesmo que tenha visto só uma vez e o filme não tenha chegado a ser um hit, o mais importante pra mim, é que temos uma nova régua do que é o mínimo que esperamos das adaptações de HQs, espero que venham mais com essa.

6.5

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