Crítica | Paterson
O mistério do cotidiano.
De certa maneira, “Paterson” me lembrou de um filme que seria lançado apenas em 2018, o maravilhoso “Under The Silver Lake”. Naquele filme, o protagonista, enfastiado com uma vida de mesmices, faz de tudo para se entreter buscando significado no vazio da cultura Pop a seu redor. A diferença é que Paterson, o protagonista de “Paterson”, residente da cidade de Paterson, jamais se enfastia a ponto de quebrar o ciclo vicioso que o faz perder as horas, borrar os dias, e até ficar paranóico enxergando coisas que fariam o protagonista daquele filme surtar completamente.
O mais incrível: Jim Jarmusch faz de tudo para acreditarmos que, em algum momento, a ruptura irá acontecer. Construindo uma atmosfera escura, quase sombria, e apostando em graves na trilha sonora que chegam a sugerir um perigo eminente, o cineasta chega a colocar sugestões no próprio roteiro, envolvendo o cachorro principalmente, mas cada vez que esperamos que algo aconteça, lá estamos nós de novo, acordando com Paterson e Laura. Também se assemelhando ao trabalho de David Robert Mitchell, que pode ter tido nesse uma de suas muitas inspirações, está o uso de símbolos, desde os padrões pintados por Laura, aos gêmeos que Paterson encontra a todo o momento - e ver o casal mirim de “Moonrise Kingdom” foi sensacional.
Com poemas propositalmente sem inspiração, ou sem qualquer rima mesmo, estes são perfeitos porque exemplificam o senso de mediocridade conformada que atinge Paterson, que resiste em tentar vender ou mostrar ao mundo sua arte, assim como muitos de nós que, por insegurança ou conforto, ou qualquer coisa mesmo, resistimos em tentar qualquer coisa diferente. Por isso a inexpressividade no rosto de Adam Driver é perfeita, porque representa a ideia do filme e é confrontada pelo jeito apaixonante de Laura, que acredita até demais em seu potencial. E é incrível como ela se anima com pequenos momentos, seja por uma simples noite de Cinema, ou pelo sucesso que seus cupcakes fazem na feira do final de semana.