Crítica | Arremessando Alto

a paixão do homem comum

Com performance inspirada de Sandler, Arremessando Alto converte ao menos alguns de seus arremessos


Adam Sandler parece estar em uma nova fase da vida.

Talvez tenha percebido que, com mais de 50 anos de idade, é hora de começar a pensar antes de falar, ou talvez este tenha sido seu plano o tempo todo: conquistar uma legião de milhões ao fazer filmes burros demais para não serem compreendidos, e então começar a fazer filmes de verdade para que seus esforços em “atuar sério” fossem ainda mais amados.

Ele é talentoso, e embora eu não ache que ele tenha conseguido fugir do papel Adam Sandler nenhuma vez (em Embriagados de Amor ele se expressa ao mínimo, em Jóias Brutas, ao máximo), com certeza sua aura de homem-comum sonhador fazem dele o ídolo perfeito pro seu pai - que nunca atingiu o que queria na vida, é preguiçoso demais pra ir pra academia, e quer acreditar que é o cara mais legal do mundo. (Se esse comentário te atingiu pessoalmente, então definitivamente sabe do que estou falando.)

Sandler também ama basquete. Entre jogos com Mark Cuban, em praças famosas dos EUA, e referências em alguns de seus filmes (Golpe Baixo), fica visível que talvez o grande sonho da vida de um dos atores mais amados de sua geração fosse o mesmo que de tantos outros: ser profissional no seu esporte favorito. Quando, em Arremessando Alto, ele diz à Bo Cruz que o mês que passou treinando o guri foi o melhor de sua vida, é provavelmente a frase mais verdadeira que ele proferiu em toda a carreira.

Porque se qualquer coisa, o filme se aproxima tanto da NBA que seria impossível não absorver um tanto da veracidade de uma das Ligas que mais diferenciam seus atletas do ser humano comum. Fica claro com Bo (interpretado pelo jogador Juancho Hernangomez) que qualquer jogador da NBA é um alien perto de meros mortais, e a presença de um número considerável de estrelas, dentro e fora das quadras, ajuda a tornar o ambiente ainda mais convincente - além, é claro, de Sandler entrar junto ao Sixers em um jogo contra o Celtics, tamanha a influência do homem.

O curioso é que o nome escolhido para dirigir o projeto nem página na Wikipedia tem - e uma rápida consulta sobre sua carreira (não assisti mais nada dele) revela que a escolha se torna ainda mais curiosa: seus outros filmes pouco ou nada tem a ver com esporte e/ou Sandler. E talvez nem fique claro, em primeira vista, quais os traços autorais de Zagar, que ao menos consegue fazer um filme que não parece ter sido feito pelo algoritmo da Netflix, mas ainda soa restringido por imposições óbvias para um filme destinado ao sucesso na plataforma. Não poderia faltar uma #personalizada, go-pros na cara dos jogadores, uma montagem elétrica pra evitar que os fãs mais jovens de Sandler, viciados em Tik-Tok, se entediem olhando para o mesmo plano por mais de cinco segundos.

O problema é essa abordagem, em tese, pós-moderna, entrar em conflito com uma história que segue todas as batidas de algo tão simples como Gol: Um Sonho Impossível, que você assistia na Sessão da Tarde. Passando longe de pisar no território inspirador e intenso de um Creed, mas também se distanciando do tom mais solene de um King Richard, o filme se beneficia da habilidade com a bola de Hernangomez (medíocre na NBA, desumano no resto do mundo), mas esbarra em sua falta de talento para atuar. Zagar até tenta resolver isso ao tornar Sandler o ponto focal da história, mas fica evidente que o gigante quietão tem muito menos aptidão para o estrelato do que Anthony Edwards, que rouba todas as suas cenas - um problema é justamente criar conflitos e ou deixá-los sem resolução, ou resolvê-los fora da tela.

De certo modo, até gosto de como o filme evoca os bastidores de um Moneyball, e Sandler está ótimo mais uma vez, mas de sua richa com o personagem de Ben Foster, à sua relação com a sempre meia boca Queen Latifah, parece que o longa procurou ser econômico onde o melodrama embutido pedia alguns excessos. Esses, muito presentes na fotografia rebuscada, mas completamente ausentes em como filmam as partidas - e o basquete segue na fila de esportes que ainda não encontraram no Cinema algum filme que capture sua essência… ou melhor…

Se algo realmente vende nessa mistura de Jerry Maguire e O Caminho de Volta, é justamente o amor de Adam Sandler pela bola laranja, um que com certeza os fãs tanto dele, como do esporte, vão poder compartilhar. Das caras retorcidas ao ver uma enterrada, àquela sensação de fazer parte, mesmo pequena, da NBA, ao menos Arremessando Alto vêm de um lugar de afeto, o que já é mais que a maioria dos filmes de sua estrela… e de Hollywood nos dias atuais.

6

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