As 10 Melhores Músicas de 2016
2016 foi, para a música, um dos anos mais relevantes da década. A inventividade de novos artistas se estabelecendo na indústria, outros nos presenteando com obras primas depois de um longo tempo de espera e nomes consagrados, sem mais nada a provar, aumentando o nível de sua discografia.
10 | Radiohead - Burn the Witch
Mesmo em suas versões menos experimentais, Radiohead continua a aumentar o abismo presente na inventividade de sua discografia e no resto da indústria musical.
Por incrível que pareça, “Burn The Witch” é uma de suas músicas mais comerciais que, apesar de dar rápidos mergulhos nas viagens sonoras impostas pelo grupo em seus melhores trabalhos, se mantém suficientemente na superfície para que os ouvintes mais casuais possam apreciá-la - mesmo que não entendam exatamente o que estão ouvindo.
Essa sensação forasteiras, mas, ao mesmo tempo, convidativa, conversa diretamente com as letras (que perambularam aqui e ali na discografia da banda por mais de dez anos) que referenciam nosso preconceito milenar com o diferente.
9 | Mitski - Your Best American Girl
Simplesmente não há como definir a êxtase que Your Best American Girl causa, por mais melancólica que seja a música.
Como a própria Mitski mencionou em entrevista, “nós nascemos inseridos em um mundo com a inocência de acreditar que o amor vence qualquer barreira”. Infelizmente o mundo nu e cru é feito de barreiras onde nem o “gigantesco poder abstrato do amor” é capaz de superar, aqui representados sob o preceito cultural. Há certos costumes que se intrometem no meio de um relacionamento e algumas vezes não há o que fazer.
A dicotomia da produção ajuda a criar a frustração que a composição de Mitski busca alcançar. Quando sua guitarra explode no segundo refrão, a mixagem concorda em se perder, no bom sentido da palavra, na erupção de ânimo imposta, enquanto Mitski, embora tenha se lamentado por não conseguir evitar tentar ser algo que ela não é, agora consegue crescer espiritualmente, se entender e se aceitar.
8 | Angel Olsen - Shut Up Kiss Me
Angel Olsen fez o difícil parecer fácil em seu álbum “My Woman”, de 2016, e especialmente na faixa “Shut Up Kiss Me”. A urgência de um bom hit do rock está presente em sua forma mais pungente aqui, o desespero carnal transcrito em guitarras e vocais enervantes. A cantora vai do grave ao agudo, brinca com o arranjo, com os filtros e nunca deixa a melodia perder intensidade ou se tornar menos interessante.
Numa época de empoderamento feminino, vozes como a de Olsen se tornam extremamente importantes, pois são um megafone. A multi-instrumentista coloca suas influências e sua verdade artística lado a lado com a mensagem que deseja passar sobre suas vivências pessoais, e como elas podem refletir o mundo no qual acredita. Um mundo no qual ela, e qualquer mulher, não precisa esperar por ninguém para expor e buscar o que quer: inclusive se quiser ser beijada, e abraçada, agora.
7 | Chance, The Rapper - No Problem
Há 3 anos Chance tomava o mundo da música como uma avalanche e você definitivamente não ia querer nenhum problema com ele.
Features atrás de Features, parecia que tudo que ele tocava se tornaria Hit. Seus versos eram divertidos quando a música exigia ou afiados quando necessário. Comparações com seu ídolo Kanye West se tornaram inevitáveis a medida que seu timbre ressoava como o de Yeezy por vezes, mas mais que isso por seu verso em Ultralight Beam. Além disso, Chance desde “10 Day”, sua primeira !mixtape” sempre procurou trazer o máximo de gêneros possíveis para suas músicas, mesmo que sempre se entregasse para seu verdadeiro amor: Deus e elementos Gospel, assim como Ye.
“No Problem” é a exclamação de tudo de melhor que Chance construiu até o seu terceiro álbum. Independência musical, euforia e felicidade inexplicavelmente contagiantes que se opuseram a tudo que estava acontecendo no cenário. 2 Chainz e Lil Wayne contribuem com ótimos versos mas aqui é a facilidade de Chance em criar refrões e produzir uma sensação de invencibilidade que brilha. Além de tudo, se em “10 day” e “Acid Rap” problematizavam o timbre de Chance, aqui ele se torna mais um diferencial dentro da melhor música de um dos melhores álbuns de 2016.
6 | The Weeknd - I Feel It Coming
Dois dos melhores singles da década (presentes nas nossas listas de seus respectivos anos), “Can’t Feel My Face” e “Get Lucky” tiveram um caso, e o resultado foi a faixa final de “Starboy”. “I Feel It Coming” é, simplesmente, irresistível.
Com The Weeknd evocando o Michael Jackson dos anos 70, enquanto sua obscuridade temática dá toques sensuais para a musicalidade robótica do duo francês, esta é uma daquelas músicas que a primeira vista pode parecer apenas mais um hit perfeito para casamentos e festas em família, mas quando observada de perto revela uma história muito mais complexa.
Não que você vá realmente prestar atenção nela, pois, como dito antes, basta “I Feel It Coming” começar a tocar e você meio que esquece qualquer problema mais sério por alguns segundos.
5 | Childish Gambino - Redbone
Verdade seja dita: Donald Glover é melhor como um poli-artista do que em quaisquer das artes que ele empreste seus talentos.
Seu álbum, “Awaken, My Love”, é bom, suas atuações também, sua presença multifacetada na cultura também, mas é justamente ao transitar entre estes muitos meios que ele entrega seus melhores trabalhos. “Redbone” é uma música estranha, esquisita, com uma sonoridade quase cômica e vocais inexplicavelmente falsetados.
É, também, uma alegoria tão forte para o amor como para a repressão da sociedade afro-descendente nos Estados Unidos. Quando ele canta “my peanut butter chocolate cake with Kool-Aid”, ele a descreve tanto física como emocionalmente, enquanto o Redbone - gíria utilizada para negros com a pele mais clara - do título se referencia aos dois. Quando ele estica sua voz o máximo possível sem sair do falsete e grita: “Stay woke”, é tanto sobre a infidelidade em seu relacionamento quanto sobre a polícia, sendo que em ambas as situações ser pego dormindo é algo trágico.
“Redbone” não é nada convencional e sua dualidade é, quase, uma piada de mal gosto. Como um bolo de chocolate e manteiga de amendoim que parece meio seco no início, mas revela sensações inigualáveis que só uma mistura de amor, dor e medo poderiam proporcionar.
4 | Frank Ocean - Nights
Chega a ser engraçado ver hoje, depois de 3 anos do lançamento de “Blonde” a inacreditável influência de “Nights”. Claro que de forma completamente entendível. A música transcende o sentido auditivo e se torna uma experiência catártica no momento em sua batida muda completamente, assim como seu tom. Nights pode não ser a melhor música de 2016 nesta lista mas com certeza é a mais imersiva. Hoje, do momento em que se entra em redes sociais ou adentramos em conversas sobre música vemos referências intermináveis sobre ela em todo lugar. Frank Ocean, com duas obras e alguns singles vem definindo uma geração e delineou uma década.
Apesar de não ser a primeira vez que Frank usa a tal dita transição de beats em suas músicas - Pyramids em Channel Orange é um exemplo disso e talvez seja a melhor música de todo repertório do cantor - qualquer ouvinte demonstra perplexidade ao escutá-la. Durante 1 minuto e 40 segundos nos é apresentado essa passagem extremamente melódica e leve. A voz de Frank então muda e sintetizadores passam a acompanhá-la. “Wanna see nirvana, but don't wanna die yet”, seguido de um riff de guitarra alucinógeno que entra em loop e alguns segundos depois é como se tivéssemos uma música completamente diferente, ou melhor, como se estivéssemos em um local totalmente diferente. O tempo muda por completo, não só da track em si mas do álbum inteiro, além de sua atmosfera, de agora em diante extremamente sombrio e desiludido.
Frank Ocean conseguiu criar uma nova sensação com Nights, e é em razão dessa inexplicabilidade de sentir algo novo que ela ainda ecoa por todo lugar, dia e noite, constantemente.
3 | Kanye West - Ultralight Beam
A maior qualidade musical de Kanye West sempre foi extrair o melhor possível de seus muitos colaboradores. Dito isso, “Ultralight Beam” talvez seja a música com menos Kanye West em “The Life of Pablo”, mas a música mais Kanye West de toda a sua carreira.
Com sua participação sendo delegada à simples - e sob auto-tune- repetições e variações do título, cada elemento parece ter se originado de um movimento começado por West lá atrás, em “The College Dropout”. O coro, que complementa e finaliza a faixa, é resplandescente, as passagens faladas são arrepiantes, os instrumentos são grandiosos.
Mas é Chance, The Rapper, seu até então melhor prodígio, que rouba a cena entregando o melhor verso convidado em uma canção sua desde que Nicki Minaj ganhou a vida em “Monster”. Com um tom na mistura perfeita do grato, incrédulo e convencido, o chicagoense (haha) quase emula a voz de Kanye por completo, trocando de ritmos e vozes constantemente e entregando uma performance de tirar o fôlego do início ao fim.
Uma prece e uma benção, “Ultralight Beam” praticamente já nasceu um clássico.
2 | Solange - Cranes in the Sky
Desde o início dos tempos, grandes artistas acabam sendo ofuscados por conta do brilho incandescente de alguns de seus contemporâneos que, merecidamente ou não, se mostram mais populares, influentes e mais propícios a imortalidade.
Solange, além disso, divide o sobrenome com Beyoncé.
Irmã caçula de uma das cantoras mais importantes de nosso tempo, em “Cranes in the Sky” Solange parece estar além do tempo, falando sobre um período de trevas e dores com uma sabedoria permitida apenas à alguém que tenha vivido por muito. Sua voz é quase distante em emoção, enquanto suas palavras soam como uma única gota caída em meio ao oceano, mas que reverberam em ondas que são sentidas no coração daqueles sentados à praia.
Devidamente angelical e com um tom melancólico que jamais permite que os rompantes de energia de Solange a transformem, é uma música que, não apenas figura como a melhor de sua carreira, mas quase como o exato oposto da primeira colocada nesta lista que, ainda assim, vive no mesmo espectro. Se uma irmã encontrou a liberdade contemplando as próprias experiências de forma intimista, é apenas justo que aquela com maior apelo popular o use para o bem e nos entregue…
Menções Honrosas: Alessia Cara, Here; Alabama Shakes, Don’t Wanna Fight; Vince Staples, Norf Norf; Kendrick Lamar, King Kunta; The Weeknd, The Hills; Chance The Rapper, Sunday Candy; Selena Gomez, Good For You; Jack U, Where are U Now; Rihanna, FourFiveSeconds.
1 | Beyoncé - Formation
Parece que a carreira de Beyoncé se auto construiu para esse momento.
Se “Crazy In Love” foi a perfeita carta de boas vindas para uma esperada carreira solo, “Irreplaceable” representou seus primeiros passos na representação de independência feminina, “Love On Top” e “Countdown” foram saltos de ambição e singularidade, e o próprio “Beyoncé” foi como um grito de liberdade e manifesto feminista, “Formation” é a catarse, o hit que não define Beyoncé para a grande massa de fãs casuais, mas sim como um hino para todas aquelas que a tem como um modelo a ser seguido.
Instantaneamente inflamando públicos com suas já icônicas sirenes que dão início a faixa, “Formation” é a combinação perfeita da música que fez a década de 2010 com as influências que fizeram a música que fez a década de 2010. O Trap, o Hip-Hop, com um quê de Soul, Funk e R&B que não apenas faz Beyoncé relembrar as muitas artistas que vieram antes dela, mas se colocar ao seu lado como um símbolo cultural na mesma magnitude que se tornou uma das artistas mais renomadas de nosso tempo.
“Formation” é um chamado, um aviso, uma declaração. Alto como seus trompetes, ousado como poucos se atrevem. “Formation” é a melhor música de 2016, e ainda mais.