Crítica | Drake - Scorpion

Apatia, segundo o dicionário informal do Google: o estado de alma não suscetível de comoção ou interesse. Apatia é, também, o que "Scorpion" trata de entregar com sucesso durante grande parte dos 89 minutos de música.

O que não obteve tamanho sucesso foi a proposta de álbum que Drake propôs, álbum duplo, vinte e cinco músicas, um lado com foco no rap e outro com foco no R&B. Parece uma grande ideia, não? Drake já emplacou inúmeros hits de ambas vertentes musicais, o que ajudaria com os fãs que gostam de dividir o trabalho do artista dessa maneira. O que poderia dar errado? Bom, praticamente tudo, desde a produção até a entrega de Drake, tudo foi abaixo da média dessa vez.

O anúncio do álbum veio em meio as polêmicas com Pusha-T, talvez o tempo mais conturbado na carreira de 10 anos de vitorias, após o sucesso incrível dos hits “God’s Plan” e “Nice For What”. Um balde de água fria e tanto para o anúncio que Drake viria a fazer uma semana depois, junto a um terceiro single e clipe. “I’m Upset” não recebeu o carinho que os singles anteriores receberam e tudo começava a indicavar um caminho tortuoso para "Scorpion". desconfiança por parte dos ouvintes e a promoção de um álbum abalada por uma grande derrota.

A promessa de uma resposta para Pusha veio alguns dias depois, o mentor de Drake, J Prince falou sobre uma algo que poderia ser “o fim da carreira” de Pusha e Ye. Fãs especularam dia e noite, esperando por uma resposta a altura do cantor, buscando por tweets, stories, indícios que pudessem levar a algum tipo de resposta sobre o paradeiro da suposta resposta.

É... a resposta não veio, “8 Out of 10” é o mais perto que chegamos, onde algumas punch lines dão a entender que foi uma tentativa de resposta e algumas alfinetadas, com direito a um sample debochado de um vídeo viral Plies no final da música. e além disso, o esclarecimento de Drake sobre a acusação de Pusha sobre a paternidade do bebê foi embaraçoso e cínico. O canadense matou a derrota no peito, e simplesmente age como se nada tivesse acontecido, tratou apenas de esclarecer as polêmicas sobre Adonis e Sofia, sem disparar nada contra os versos de Pusha sobre 40, seu melhor amigo de longa data e produtor.

O lado A começa com “Survival”, uma beat com um riff de cordas e um sample digital, característico de Drake, uma música curta de 2 minutos e alguma coisa, que além de um par de punch lines e o sub-bass que entra ao tardar da música, não consegue empolgar por muito tempo. “Nonstop” apresenta um lado já testado em algumas faixas, porém, agora inaugurado de vez, altamente influenciado pela trap music, flow já cansado e vocal monotônico. O primeiro momento realmente empolgante quando se trata de produção é a quarta faixa, “Emotionless”, um sample absolutamente magnifico acompanha e dá o tom da música, numa entrega vocal um pouco mais decente. É o mais perto que chegamos do estilo de narração mais sincero e aberto de Drake que vimos em algumas faixas no último projeto “More Life”, como “Lose You” e “Do Not Disturb”.

Mas é apenas a sombra de um Drake que vinha numa ascensão lírica no último projeto. Esse Drake não é reconhecível em "Scorpion".

“Can’t Take a Joke”, “In My Feelings” e “That’s How You Feel” são discutivelmente umas das piores faixas do de seu extenso catálogo. “God’s Plan” está aqui! A sequência que parece um oásis nesse deserto de ideias e pouca inspiração de Drake e 40, é terrivelmente interrompida por “I’m Upset”, o que me levou a perguntar: o que diabos aconteceu com Noel “40” Shebbib?

“8 Ou of 10” é definitivamente um ponto alto no disco, beat e entrega que lembra muito seus primeiros trabalhos como “So Far Gone” e “Thank Me Later”. Drake se orgulha de tomar a posição da pessoa mais madura da discussão, referencia a entrevista de J Prince sobre a escolha de não publicar a faixa resposta para Pusha, que sejamos sinceros, nós sabemos que realmente nunca existiu.

“Mob Ties” é outro momento altamente influenciado pelo trap, um tanto mais interessante do que “Nonstop”, mas mesmo assim sem muitos pontos altos. “Can’t Take a Joke” tão genérica quanto as duas, abre espaço para a bonita “Sandra’s Rose” música direcionada para Sandra, mãe de Drake. “Talk Up” traz o feat inesperado de Hov, depois de um principio de beef, o rapper nova-iorquino colabora novamente com Drake depois de 3 anos. O flow de Drake é facilmente ofuscado pelo de Jay-Z, mas figura como outro ponto alto, raro nesse lado A do disco. “Is There More” encerra o lado mais agressivo e irracional do álbum.

“I only tell lies to who I gotta protect / I would rather have you remember me how we met / I would rather lose my leg than lose their respect / But that’ll never happen the way I’m watchin’ my step / That ain’t what I’m ‘bout / I’m in control of my destiny, never in doubt / If I can’t make it with you, I’ll make it without
— https://genius.com/Drake-is-there-more-lyrics

O lado B começa tão apático como seu predecessor. “Peak” falha no trabalho de animar os fãs que estavam entusiasmados para um álbum inteiramente R&B, talvez algo semelhante a “Take Care” ou bons momentos em “So Far Gone”. Eu particularmente fiquei entusiasmado com essa perspectiva, mas não foi isso que aconteceu. “Summer Games” conta com elementos de EDM na beat, cortes pontuais nos vocais entregam a vertente mais Pop do que R&B que o lado B virá a tomar. “Jaded” conta com uma produção mínima que particularmente me agrada, e se repete em “Finesse” e “Final Fantasy”, a intensidade do flow na reta final da música me agrada e lembra um pouco “U With Me” um dos pontos altos em "Views".

Inusitado é a produção de “Ratchet Happy Birthday”, uma música bizarra com entrega bizarra que acaba sendo agradável aos ouvidos. “Nice For What”, o segundo single de divulgação de Scorpion é – por incrível que pareça – a melhor faixa do álbum, injeta o animo necessário para não cochilar durante a sequência do lado B.

“Blue Tint” é uma ótima música com participação de discreta de Future e um destaque da produção, conta também com punch lines características de Drake principalmente em “Nothing Was The Same” e “Take Care”. “In My Feelings” e “Don’t Matter to Me”, a polêmica música com participação póstuma de Michael Jackson, são duas músicas incrivelmente esquecíveis e passam batido rapidamente na execução. “After Dark” tem Maxwell entre os compositores, e é uma das melhores músicas do lado B e do projeto como um todo, “After Dark” e “Final Fantasy” foi como projetei na minha mente como seria um álbum inteiramente R&B de Drake. A primeira parte de “Final Fantasy” que flui muito bem acaba precocemente, aos 1:30 de música, infelizmente.

E é apenas no fechamento do álbum que , “March 14”, que Drake dá mais informações sobre seu filho, e também sobre Sofi, a mãe do menino Adonis. Drake não passa segurança ou veracidade durante a curta faixa, além de entregar um storytelling fraquíssimo sem qualquer riqueza de detalhes.

No one to guide me, I’m all alone
No one to cry on
I need shelter from the rain
To ease the pain
I’m changing from boy to a man
— https://genius.com/Drake-march-14-lyrics

No todo, Drake nunca ficou tão longe da coroa do hip-hop que ele tanto clama possuir, ele necessita ter conhecimento que enquanto estiver buscando o público que vem buscando com seus últimos hits e com sua nova sonoridade apropriada para dancehalls, nunca vai estar na competição. Drake necessita escolher entre ter seu trabalho levado a sério entre os seus colegas de profissão, ou continuar apenas acumulando “Blue Tints” em seu império bilionário.

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