Crítica | Okja

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Como é a relação que você tem com o seu bichinho de estimação (caso tenha ou teve um)? Imagino eu, que seja uma amizade baseada em um amor muito maior do que poderíamos imaginar que um dia sentiríamos por um animalzinho que come, dorme, faz cocô onde bem entende e nos ama independente do nosso humor. 

Agora entra uma questão importante, um tanto cruel e talvez impossível de responder. Você comeria seu bichinho de estimação, se ele estivesse inserido dentro da nossa cultura de consumo alimentício?

A realidade é que é muito difícil falar sobre a mensagem do longa. É difícil botar em um texto tudo aquilo que o original da Netflix provoca em seu espectador. É apelativo para quem ama animais ou não, mas não se trata só disso. Fala sobre o capitalismo e o que pessoas e corporações se dispõe a fazer para alcançar seus desejos; abre discussões sobre animais transgênicos e ao que são submetidos; abre espaço para falar sobre o ativismo e principalmente de onde sai a carne que comemos.

Okja ganha peso e importância principalmente por, mesmo sendo um filme de ficção, estar tão próximo da nossa realidade. 

Okja é extraordinário. Sim, o filme também, mas esse parágrafo é dedicado exclusivamente para a porquinha. Porquinha não, um super porco, leal e devoto a sua dona e parceira, Mija. O mesmo serve para a menina, que ama incondicionalmente sua melhor amiga. O primeiro ato, que trabalha com a relação das duas, quase sem falas, é fascinante. Okja, que possui o tamanho de um elefante, é extremamente inteligente e sagaz, e o mais importante, é  verdadeiramente crível. Não é normal alguém ter vontade de criar um animal com seis toneladas, mas é uma tarefa árdua não se apaixonar por ela. E tudo isso porque o trabalho de CGI é perfeito. O sombreamento, o tamanho, as expressões. Tudo em Okja é primoroso e ela foi feita com o intuito de tentar estabelecer uma conexão instantânea com o público.

Joon-ho Bong é, com certeza, um dos melhores diretores ativos que o cinema possui. Com certeza muitos não o conhecem ainda, mas "Snowpiercer" e "Mother" são duas excelentes obras. Ele tem tremenda facilidade em ser versátil e a prova disso é a dificuldade de definir algum gênero específico para seus filmes. Aqui, ele consegue trabalhar comédia, drama e ficção científica de forma perfeitamente harmônica. Bong, além de dirigir, escreveu o filme e desenhou Okja. Em entrevista, o diretor disse que os dois pontos iniciais para ela dar certo eram que o animal deveria ser imenso e tinha que parecer amável, introvertido e triste. Tudo para nos relacionarmos facilmente.

Junto com "Okja", a dona do show é Mija (Seo-Hyun Ahn). A inocência transformada gradativamente em uma maturidade anormal, devido a pouca idade, é trabalhada de forma perfeita. Muito do peso emocional do filme se deve a relação da menina com a porca. Cultiva-se amor e confiança sem muitas palavras ditas e, através da pequena menina, podemos entender que, mesmo saindo de nossa zona de conforto, crescendo e vendo como o mundo realmente é, não precismos abdicar do amor e do cuidado que temos com quem nos preocupamos.

Tilda Swinton e Jake Gyllenhaal são o que podemos chamar de antagonistas aqui, se não considerarmos que o real vilão é o sistema. Ambos possuem uma excentricidade instigante e divertida, embora incômoda, como deveria ser. Estão bem, mas não empolgam. Nenhum personagem coadjuvante o faz. Paul Dano, Lily Collins e Steven Yuen agradam e se esforçam, mas não houve muito material para o desenvolvimento de seus personagem, o que não é necessariamente ruim, pois o foco deveria mesmo permanecer em Okja e Mija, mas isso acaba tornando os personagens secundários facilmente esquecíveis.

Okja é muito importante. É reflexivo, relevante e muito mais que um filme. É uma forma de protesto e uma luta em forma de arte. Seu primeiro ato é majestoso, e seu terceiro ato irrepreensível. É o auge do impacto que uma história pode ter sobre o psicológico de uma pessoa, e quem sabe, até mudá-lo.

8,5

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