Crítica | Carrie (1976)

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“Todos eles vão rir de você”

Indicado para dois Óscares, nas categorias melhor atriz e melhor atriz coadjuvante, Sissy Spacek e Piper Laurie respectivamente. Baseado no homônimo livro do mundialmente renomado escritor Stephen King. Ele afirma que todas as adaptações para o cinema, essa se revela como sua preferida. Pelas camadas, que o diretor; Brian de Palma, atrelou para cada detalhe. O filme apresenta a estreia de grandes estrelas como John Travolta e Sissy Spacek.

Carrie White (Sissy Spacek) é uma jovem solitária que recebe diariamente abusos. Bullying na escola e terror psicológico da mãe; Margaret (Piper Laurie). Uma fanática religiosa. Sem nenhuma rede de apoio concreta. Após a menarca, ela começa a ter poderes sobrenaturais. 

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Adolescência é um período confuso, inúmeras mudanças tanto externas quanto internas. Esse período inicia repentinamente, um momento complicado para todos. Especialmente, para protagonista Carrie que mora em um ambiente instável, desestruturado. 

Sendo esse episódio traumático por si só, que traz uma das cenas de abertura mais memoráveis do cinema. Ilustrando a expêriencia de Brian De Palma, que alinha com maestria assuntos transgressivos com ferramentas da forma. 

O filme começa, com a jovem tímida perante ao seu corpo em frente às outras colegas, aguardando todas tomarem banho. Quando entra para ducha. Quase se aproximando de uma releitura do banho das ninfas, trazendo o erótico. Insinuando, que talvez por algum momento não tenha problema com seu corpo. Quando começa a sangrar, sem compreender que é menstruação, entra em pânico. Demonstrando como a ausência de qualquer forma de diálogo com sua mãe trouxe consequências negativas.

Nesse episódio, muitas alunas são punidas pelo péssimo comportamento perante a colega. Sue (Amy Irving) vê a oportunidade de se redimir com Carrie. Pedindo para que seu namorado; Tommy Ross (William Katt) a convide para o baile, por insegurança logo questiona suas intenções. Já Chris (Nancy Allen), banida do baile, não concordando com o castigo, arquiteta um plano diabólico na companhia de seu namorado.

Na adolescência, muitas inseguranças ficam evidentes. Jovens procuram por validação constante, na tentiva de compreender sua identidade. Alguns, fazem isso sem prejudicar terceiros, outras usam da vulnerabilidade de outros como fraqueza e depositam as suas oscilações.Nesse caso, Carrie servia como um bode expiatório. Infelizmente, isso não se resumia apenas ao ambiente escolar. Em casa, era culpada pelo pai ter abandonado ela e a mãe. Ou sendo encarada como um pecado ambulante, 

Margaret White estigmatiza e reprime a filha em todos os sentidos, a impedindo de ter uma experiência da fase saudável. Especialmente, no questido de qualquer traço da natureza do feminino. Criminalizando seu corpo, ou qualquer gesto que possa ser considerado um comportamento “lascivo”. 

De certa maneira, a natureza misteriosamente (e generosamente) está a favor de Carrie. Entregando esses dons , com intuito de à proteger contra o clima inóspito para sua sanidade mental. Simbolicamente, reforçando o mito do místico feminino conectado com forças maiores.

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Stephen King é o mestre de metaforizar acontecimentos comuns da adolescência em episódios extraordinários, que forma um belo encontro com o tom onírico de Brian de Palma. “Carrie” possui o aspecto de contos de fadas, que rapidamente se torna em episódios nublados e sombrios. Momentos da vida adolescente cotidiana que era para ser rotineiros. Logo se tornam momentos de tensão e violência.

Categorizada como uma história de vingança. Justificada por todos os atos que semearam até seu momento limite; O baile. Ela rebate toda opressão que passou. Inúmeros fatores contam como combustível para sua catarse. A violência se torna bela e erótica, trazendo uma satisfação em que a vive. Tanto Chris como Carrie. 

Isso se expressa no baile, em que após ter tido sua primeira dança, beijo e nomeada rainha do baile ao lado Tommy Ross. Carrie recebe seu momento de glória, tragicamente é roubado quando o sangue de porco é derramado (plano bolado por Chris), e seu acompanhante é gravemente ferido. 

Naquela hora a fúria desperta nela, perante a todas injustiças que já sofreu. Em um transe que a consome e à cega pela sede por vingança. Destruindo todos que cruzam seu caminho. 

Ao retornar para casa, entra no banho. Em posição fetal coberta de sangue a água escorre como um batismo, já que parte dela foi acordada.Sua inocência se esvaeceu . Após essa espécie de ritual, clama pela mãe. Paradoxalmente, Carrie procura por calmaria, parecendo que o único lugar em que obteve foi no útero materno. Log, Sra White, aparece e tenta matar a filha com uma facada, Carrie finalmente rebate com uma chuva de facas. Cortando não só o cordão umbilical, mas toda projeção que tinha sobre uma figura materna positiva inexistente. 

Apesar dos apesares, Margaret morre em paz, por admitir que ter libido não desmerece ninguém. Aceitar que não é um pensamento impuro. Sim, orgânico, fisiológico.

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Crescendo em uma sociedade patriarcal opressiva, mulheres são ensinadas a temerem ao seus próprios corpos. Carrie White em seu primeiro contato significativo com o caráter feminino, um episódio traumático. Demonstrando como a mulher é pintada sob uma luz abominável. 

Sobretudo o filme, denuncia a banalidade de injustiças perante mulheres. Ensinadas que qualquer forma de desejo é algo impuro. Abraçar sua sexualidade, cria um estigma e coloca em uma categoria, uma caixa. É possível vencer a coroa do baile, mas merecer ou será convencidas.

O ato de Carrie abraçar sua feminilidade é crescente, como entender e aceitar seus poderes. Um feito de muita coragem, pois havia perseguição de sua mãe e outros. 

O filme ainda conversa muito com a sociedade atual, trazendo pautas relevantes. Primorosamente, encapsulando a estética da decáda de 70. Evidenciando sua colocação como clássico: Não só de gênero, mas do cinema.

8

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