Crítica | A$AP Rocky - Testing

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Em seu novo álbum, A$AP Rocky traz um pouco de cada um de seus contemporâneos, não de forma genérica, mas como um leque de habilidades que pouquíssimos rappers possuem hoje em dia. 

Rakim Mayers não é nenhum garoto. Prestes a fazer 30 anos, o rapper de Nova York está na cena faz um bom tempo, desde sua aclamada mixtape "Live.Love.A$AP" em 2011 e a fundação do grupo A$AP Mob, que fez com que todos os A$APs que você vê por aí surgissem para o mundo do hip-hop não apenas como um ideal de música, mas como um estilo de vida. Dentre todos, Rocky foi, de longe, o mais bem sucedido. Em "Testing", seu terceiro álbum de estúdio, ele se permite ir em busca de sua magnum opus, alçando vôos que muitos acreditavam não se possíveis, justamente quando ainda é jovem o suficiente para ter a ambição e já tem experiência para saber aonde ir. 

"Testing" soa justamente como uma jornada, de um artista não procurando sua voz, mas em busca de algo maior. Em seus melhores momentos todas suas tendências musicais e pessoais se encontram, desde sonhos profundos à lembranças impactantes à dificuldade de lidar com o conturbado presente que a fama traz. "Distorted Records" é uma ótima abertura, trazendo uma produção propositalmente distorcida, climática e praticamente se transforma em "A$AP Forever (Remix)" de forma extremamente efetiva. Ambas as faixas trazem comentários sobre a superficialidade da vida de rapper, introduzindo novos níveis de introspectividade às letras de Rocky. Apesar de suas letras normalmente circularem os mesmos assuntos, pequenos momentos em cada faixa oferecem insights profundos sobre tudo que passa na cabeça de Rocky.

Pegue a mediana "OG Beeper", onde ele fala no garoto que sempre quis se tornar um rapper, e perceba como isso é algo possível apenas para uma geração pós Tupac, que vê no rap uma forma de ter uma vida melhor. Na cadente "Tony Tone" ele sabe que muitos o consideram um idiota, mas continua a expressar sua mente de forma livre. "Gunz N Butter" é completamente enganadora por seu nome, trazendo reflexões sobre a religião a sua volta assim como comentários sobre o histórico racismo na América. Não é nem de perto o álbum mais profundo do gênero, mas a habilidade de falar muito com pouco é extremamente valiosa no hip-hop.   

Rocky desfila todas as suas habilidades neste álbum, desde suas habilidades como compositor à suas energéticas e emocionadas performances.

A produção que poderia se caracterizar como algo entre experimental e psicodélico traz influências de diversos projetos, empresta um pouco da homogeneidade de "Blonde", da tropicalidade de Drake, talvez até um pouco da introspectividade de "4:44". O dedo de Rocky está em todas as faixas sonoramente, fica claro que ele nunca tenta ter controle absoluto de que tipo de som vai sair, mas mesmo assim consegue construir um álbum muito bem estruturado, com sua primeira metade primando pela consistência e a segunda pela liberdade criativa.  

Talvez os piores momentos sejam quando ele foge demais para algum lado. "Praise The Lord" soa um pouco barata e simplória, "CALLDROPS" é uma estranha colaboração que pede liberdade à Kodak Black e "Buck Shots" parece uma faixa feita para "Die Lit", se apoiando demais no trap, ofuscando sua interessante e relevante mensagem sobre violência no gueto. Ajuda e atrapalha que estas estão todas sequenciadas, o que quebra um tanto a continuidade do álbum, mas permite que suas primeira e segundas metade excedam. 

É um projeto que não tenta em momento algum ser econômico, e isso é tanto sua maior qualidade como seu maior contra peso (sorry for that). 

"Gunz N Butter" é um banger extremamente contagiante, coloca as coisas de volta em ordem e é seguida pela gloriosa "Brotha Man", onde French Montana troca bars com ninguém menos que Frank Ocean (e um cameo de Snoop Dogg) em uma faixa que chama a todos para lutarem por algo. Esta colaboração sendo até mais inusitada do que o bragging da maravilhosa FKA Twigs em "Fukk Sleep", fazendo com que "Testing" já seja o álbum com a tracklist mais curiosa do ano. A confortante "Kids Turned Out Fine" segue os comentários de Rocky sobre sua infância, alertando a todos os pais que tudo que seus filhos fazem é normal, mas o ponto principal é a mudança drástica que a faixa provoca no álbum.

"Hun43rd" talvez seja sua melhor tentativa de contextualizar a vida no gueto antes e depois da fama e "Changes" é uma belíssima faixa regada a violão onde ele utiliza amores passados para refletir sobre as mudanças na sua vida. É algo corajoso para um rapper com uma imagem tão estabelecida como a dele. "Black Tux, White Collar" é uma impactante e madura dissertação sobre a violência policial, contornada por trap da mais alta qualidade, e termina com Rocky finalmente reconhecendo que a vida que escolheu parece certa para ele, pois o manteve vivo.

Mas o álbum atinge seu ponto mais alto justamente no final. "Purity" é construída em torno de um alterado sample de Lauryn Hill, onde sua voz distorcida canta "I gotta find peace of mind" sobre cordas de um violão extremamente triste. A jornada turbulenta de Rocky vai além do externo, está dentro de si próprio e isso pode ser percebido aqui. Além disso, Frank Ocean prova que poderia facilmente ser um dos melhores rappers do planeta se tentasse, fazendo de "Purity" uma das melhores músicas de 2018 até agora. 

A beleza deste álbum está em diversos momentos mágicos que vão além do que está na superfície. O time de estrelas que Rocky juntou eleva diversas faixas, mas seu carisma e delivery durante todo o álbum são o que o tornam especial. Talvez demore um pouco para que seu valor seja realmente entendido, mas é um grande trabalho de um artista que não se contenta com pouco. 

8.1

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