CRÍTICA | CONCLAVE

a Sucessão papal filmada.

“Conclave” tenta usar a Igreja para defender ideias ocas sobre o mundo, mas esquece de filmar isso.

Partindo de uma ideia bastante ruim, o filme de Edward Berger tenta demonstrar o que existe de profano dentro da Igreja Católica. “Conclave” mostra os momentos de tensão quando todos os cardeais se encontram para escolher o novo líder da Igreja, navegando pelas dificuldades enfrentadas pelo decano da reunião em garantir que o processo ocorra de acordo com a vontade de Deus. A principal questão que interessa ao diretor é a tensão entre os problemas do mundo atual e a liderança da Igreja, a partir da disputa entre uma corrente progressista e uma conservadora pelo próximo papado.

O longa começa com a morte do velho papa, muito próximo dos personagens de Ralph Fiennes, que nos conduz pelo filme, e Stanley Tucci, um dos candidatos à sucessão papal. No velório que se segue, Berger demonstra as principais dificuldades que encontrará para filmar as longas duas horas de “Conclave”, quando coloca Fiennes em primeiro plano com o rosto inclinado a 45º em uma cena que deveria ser o momento de entendermos os sentimentos do herói da trama, mas na qual não conseguimos olhar em seus olhos. Essa dificuldade de elaborar um visual para o mundo católico e, especialmente, para quem o habita é uma constante ao longo do filme, que emprega um excesso de planos-detalhe e closes inclinados, sem, no entanto, fazer muito com eles.

Essa dificuldade de Berger em pensar o filme em termos visuais demonstra quão pouco ele está interessado em explorar qualquer possibilidade além do panfleto liberal que filma. O próprio personagem de Fiennes, um cardeal infinitamente bom e valoroso, é tratado como um objeto de cena pelo diretor, conduzindo o roteiro de um lado para o outro para que o espectador nunca pare para refletir sobre o que está vendo, mas sendo incapaz de qualquer grau de agência frente à imagem ou ao texto. Ironicamente, o único ator que faz algo diferente em tela é o vilão, interpretado por Sergio Castellitto, um cardeal ultraconservador que divide seu tempo entre dizer as frases mais retrógradas do universo e tragar o vape que nunca sai de suas mãos.

A única razão de ser de “Conclave” é nos contar, ao final, que a Igreja Católica tem salvação. Apesar de alguns cardeais ruins que a habitam, existe o amor, que certamente vencerá, segundo Berger. Além do discurso de autoajuda, o diretor parece nunca pensar por mais de um ou dois segundos sobre o sentido do que quer dizer. O maior exemplo disso é que, ao final, o papa eleito escolhe o nome de Inocêncio, o que me chamou atenção, já que é um nome muito mais associado às Cruzadas do que à tolerância. No entanto, depois descobri que Berger pensou nesse nome apenas porque acredita que a inocência do personagem salvará a Igreja.

A falta de reflexão sobre o mundo, que esse detalhe revela, se aplica à totalidade de um filme que, por 120 minutos, nunca tem qualquer dúvida sobre si mesmo. É um panfleto liberal da Igreja Católica do início ao fim e, além disso, um panfleto filmado como uma série de TV muito brega. O pouco que há de bom, além do vilão vaper, é alguma vontade de criar gags visuais em cenas de transição, como os cardeais entrando nos micro-ônibus, mas isso não é elaborado, parecendo algo que está ali por acaso. “Conclave” nunca desafia a ordem vigente: tem um discurso anti conservador, mas é bastante preso ao que já existe, sem se permitir elaborar nada novo ou progressista — apenas a vontade de manter a Igreja Católica viva no século XXI.

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