Crítica | Nicki Minaj - Queen

Ah Nicki Minaj.

Faz oito anos desde que a rapper, nascida em Trinidad e Tobago e naturalizada norte-americana, conquistou a todos com seu verso em "Monster" e seu bom disco de estreia, "Pink Friday", desde então, construiu seu reinado como a principal (e, por muito tempo, única) rapper de destaque no mainstream. Mas então, Cardi B chegou e a velha sina voltou a tona: podemos ter duas rainhas do rap juntas, ao mesmo tempo? 

Nicki não sumiu, se aposentou ou perdeu sua relevância como outras antes dela. Muito pelo contrário, ela é tão presente no cenário musical atual que praticamente qualquer artista de destaque tem pelo menos uma colaboração a seu lado. Sua imagem já está impregnada na cultura pop, ela é um ícone, mesmo que nem sempre da forma que merece ser. Muitos a consideram superficial, acreditam que ela não tem talento e não é uma "mulher natural" fisicamente por conta da exuberância de seu corpo. O jeito certo de ver Nicki, no entanto, é como uma mulher negra, imigrante, que sucedeu em um meio inteiramente dominado por homens e, recentemente, por brancos. Ela é um exemplo de sucesso, inteligência, transborda talento e personalidade. 

Porém, a já comentada chegada de Cardi B abalou o mundo intocável de Nicki. Seu reinado foi o mais longo de uma rapper, mas o fenômeno responsável por "Bodak Yellow" conseguiu com seu primeiro grande single algo que Nicki ainda procura: um hit n° 1 nos EUA. Seu álbum de estreia, "Invasion Of Privacy", foi aclamado criticamente (o que é um exagero, pois é hit+fillers), seu relacionamento conturbado com Offset, do Migos e sua personalidade inusitada a tornam um prato cheio. Não é certo falar isso, mas a cor de sua pele é claramente mais clara que a de Nicki, o que apela, sim, para o novo público do hip-hop.

Então quando Nicki Minaj lança um novo álbum, seu quarto, com o título de "Queen", não posso deixar de pensar que é uma tentativa de proteger a si mesma.

Acredito, também, que haja espaço para duas rappers, mas até que surjam três, quatro, cinco, vinte relevantes ao mesmo tempo, estas duas serão comparadas de forma incessante. Infelizmente, Nicki não usou o que tem de vantagem sobre Cardi a seu favor. "Queen" não mostra a experiência de uma década que ela tem e não é uma melhoria em relação a "Pinkprint", de 2014. Na verdade, parece uma tentativa extensa de emplacar um hit atrás do outro, mas já temos anos de Nicki Minaj, o caminho certo seria entregar um trabalho que nos fizesse ver algo a mais, e não mais do mesmo.

A grande variedade de produtores funciona para tornar o álbum colorido, mas Nicki poderia ter sido um tanto mais seletiva. A impressão que fica é de um projeto desfocado como um todo. Se o objetivo é entregar algo digno da realeza do rap, então ela não pode se ater a produções genéricas e reutilizadas, e deveria, de alguma forma, ter um conceito definido. 

"Ganja Burns" é uma ótima abertura, misturando elementos de dancehall e oferecendo uma atmosfera crescente e calorosa, combinando com a acidez em seus versos que inclusive questionam a ascensão meteórica de pessoas que não nomeia. Porém, "Majesty" conta com notas sem graça de piano, um refrão e produção afetados de Labrinth que lembram muito a falta de brilho de "Revival". O que não lembra "Revival" é justamente seu artista, pois este é um dos melhores versos de Eminem em anos, torcendo sua língua como em seus melhores dias. Ainda assim, a coisa mais interessante sobre a faixa é o fato de, anos atrás, Eminem ter falado sobre Minaj em "Fast Lane" de forma bem mais direta que Kanye para Taylor em "Famous". 

Talvez o auge do álbum esteja na sequência, "Barbie Dreams", onde Nicki pega a batida de "Just Playing (Dreams)" e inverte as letras, para falar sobre rappers com quem iria, ou não, para a cama. Sua performance é destruidora e suas letras hilárias, com destaque para a menção à Drake. Porém, "Rich Sex" tem um verso reutilizado de Lil Wayne, como quase todos em sua carreira, e entra em território que, apesar de ousado, pouco interessante ou explorador. 

O lado bom está no fato de que é bem possível que essa seja a melhor Nicki Minaj que já ouvimos. A variedade de técnicas, flows, vozes e estilos que ela esbanja aqui é algo excepcional. O lado ruim é que a má organização do álbum limita seu proveito.

Ela está claramente melhor e mais em casa quando o tom fica mais descontraído, algo que não vemos em toda a sequência que vai desde "Rich Sex", passando pela genérica "Hard White"; o superficial single "Bed" com Ariana Grande; a típica aparição de The Weeknd, obrigatória em todos os álbuns de rap de 2018, na previsível "Thought I Knew You"; uma faixa R&B versão Drake em "Run & Hide"; até finalmente sairmos do limbo após "Chun Swae" que, apesar de contar com a magia de Metro Boomin em misturar uma batida trap e a voz de Swae Lee em uma semi canção de ninar, não atinge nenhum tipo de auge, nem com a performance cheia de personalidade de Nicki.

O álbum reencontra então reencontra sua força. A eficaz banger "Chun-Li" se utiliza bem das influências japonesas no som, e rebate a parte mais arrastada com um refrão contagiante e uma performance energética de Nicki. "LLC" é uma diss altamente inteligente, se apoiando em uma batida minimalista e infectada com uma atmosfera venenosa graças à seus versos ácidos. "Good Form" tem uma energia inegável graças à excelente produção de Mike Will Made It, mesmo que, apenas dessa vez, Nicki não a use da melhor forma. "Nip Truck", "2 Lit 2 Late" e "Come See About Me" são partes 1, 2 e 3 de um momento sentimental, voltando brevemente ao R&B dos anos 2000 de forma eficaz e sincera. 

Um editor seria essencial para saber a hora de finalizar o álbum, coisa que Nicki não faz o alongando por mais duas faixas. "Sir" e "Miami" são ok, mas praticamente a mesma coisa que já estamos ouvindo a quase uma hora. Se sua parceria com Foxy Brown, "Coco Chanel", fosse adiantada, seria o momento perfeito para fechar o projeto, porém ela vem quase como uma recompensa para os ouvintes mais dedicados.

"Queen" é um álbum que falha em não atingir todo seu potencial. Seu título se justifica, Nicki Minaj é a melhor coisa de todo o álbum, mas faltou alguém para ajudá-la a confeccionar a melhor coroa possível. Sendo o que é, deve colocar mais lenha na fogueira nessa batalha infantil que a mídia insiste em fazer dela e de Cardi - que Nicki abraça em vários momentos aqui, é verdade -, mas poderia servir muito bem como um ponto de exclamação para suas declarações. 

Nicki Minaj não está afim de desistir de seu trono, conquistado com trabalho duro durante todos estes anos, mesmo que ainda não tenha conseguido o que precisa para ter seu nome nele para sempre. O que seria isso? Fácil: um clássico. "Queen" é bom, mas não é um.

6.7

Anterior
Anterior

Crítica | Brooklyn Nine-Nine (1ª e 2ª Temporadas)

Próximo
Próximo

Crítica | Mentes Sombrias