Crítica | A Grande Mentira
O título clichê entrega o assunto do filme.
Roy Country (Ian McKellen) é um golpista profissional que conhece Betty McLeish (Helen Mirren), uma viúva que apesar de sozinha, guarda uma boa quantidade de dinheiro. O filme dirigido por Bill Condon tem seus bons momentos, em especial aqueles em que podemos apreciar McKellen e Mirren, brilhantes como sempre, mas peca por uma história fraca que erra ao tentar criar um final bombástico para um enredo que poderia ser mais simples. A narrativa se dá durante os sucessos e fracassos de Roy que tenta convencer sua vítima a investir todo seu dinheiro em uma conta conjunta. Ele se envolve completamente no plano o que significa deixar sua casa para morar com a nova “parceira” e mudanças repentinas na sua rotina . O filme traz comentários sobre as maneiras de nos relacionarmos com o nosso passado, principalmente no envelhecimento.
Entre os créditos iniciais surgem clipes dos dois atores, cada um em um computador, enquanto montam seus perfis em um site de relacionamentos. Nome, perguntas sobre personalidade e informações básicas, o recurso não é tão criativo mas é eficiente em termos de roteiro, aí temos contato com o tema principal do filme: mentira. Por exemplo, Roy acende um cigarro e logo depois responde ao site que não fuma. Paralelamente Betty toma um cálice de vinho e marca que não bebe. Já de início está estabelecido que os dois terão mentiras e reviravoltas sobre sua vida. Ao fim dos créditos iniciais vamos direto ao seu primeiro encontro, mais mentiras são confessadas pelos dois, ambos criaram nomes falsos para se conhecer. Ao mesmo tempo que se relacionam pois são viúvos, têm problemas de relacionamento com seus filhos e parecem entender a solidão da velhice no mundo. Também são céticos quanto a relacionamentos que partem da internet, concluem de largada que encontros romantes sempre: “é uma pessoa iludida encontrando uma sem esperança”.
No primeiro ato ainda, vemos Roy em ação ao operar um outro golpe relacionado a fundo de investimentos e temos nuances do que é capaz de fazer e quais seus planos para Betty, que tem um perfil bastante conveniente. É aposentada e, fora seu neto, não convive com muitas pessoas, mora em um subúrbio e possui um património robusto, de herança e investimentos. O neto, Steven (Russell Tovey), assim como a vó, pesquisa história. Conta que sua dissertação é sobre Albert Speer, notório arquiteto nazista julgado em Nuremberg, sobre quem foram feitas muitas discussões sobre culpa e a real possibilidade de alguém consertar os erros que cometeu no passado, ou superá-los. Dos depoimentos dele também aparece a noção de quanto mais alguém está envolvido em algo, menos ela consegue ver. Os questionamentos sobre a prisão e inocência de Speer são trazidos para o filme, assim como opiniões sobre a própria a história. “Não acho que sirva de nada olhar para o passado” diz Roy, ao que Betty responde: “Para tentar entendê-lo”.
“A Grande Mentira” toma inúmeros rumos inesperados, brincando com as expectativas do público, mas talvez não seja competente o suficiente para fazer isso de maneira sensível com os passados de seus personagens, que conhecemos ao longo do filme. Por melhores que sejam os atores, não salvam os buracos que o roteiro deixa ao tentar surpreender o público tantas vezes, e seu último terço é pouco aproveitável por isso. Claro que as maneiras de contar histórias que tratam sobre trajetórias de personagens septuagenários, a partir da premissa que nós não conhecemos elas e que devemos duvidar de tudo são confusas. Longe de mim propôr uma solução para esse problema. Mas a esse filme, como a seus personagens, falta a capacidade de encarar seriamente seus próprios erros e tentar consertá-los.