Crítica | História de um Casamento

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Eventualmente algum diretor acaba se tornando repetitivo ao contar muitas vezes a mesma história, chegando no ponto em que estilo e repetição se confundem. Esse era o caso de Noah Baumbach.

No entanto, seu último lançamento, “História de um Casamento”, nos traz uma história capaz de abordar suas temáticas usuais com um olhar profundo e interessante. O filme conta a história de Charlie (Adam Driver) e Nicole (Scarlett Johansson), respectivamente diretor de teatro e a atriz principal de sua companhia e o fim do casamento entre os dois. Filmes sobre divórcio podem ser bem sensíveis e não é tão comum ou simples fazer uma abordagem complexa que consiga representar os diversos sentimentos possíveis em um casal acabando seu casamento. Mas esse é o compromisso que Noah Baumbach assume desde o início do filme, em que temos uma retrospectiva dos melhores momentos do casamento a partir da lembrança individual de cada personagem daquilo que cada um gosta no outro, essa cena acaba nos revelando que essa leitura é feita dentro de um consultório e a partir daí sabemos que o casal está se separando. 

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O destaque principal são os protagonistas. Os dois atores já num patamar superior em Hollywood, executam os melhores trabalhos de suas respectivas carreiras. A voracidade com que suas vidas são sugadas pelo processo e pela batalha pelo filho, o amor ressentido que os dois têm no começo se transformando em ódio profundo, a vontade de continuar sendo amigos que vira um jogo psicológico e culmina numa disputa judicial. Cada um desses elementos de roteiro vão entrando nas atuações da maneira como um bom drama deve funcionar e causam desconforto e os mais diversos sentimentos no espectador que a cada momento é convidado a mudar de opinião, ou pelo menos entrar no jogo das contradições de cada um dos personagens. Uma estratégia fundamental para isso é que vemos às piores ações de cada personagem pelos olhos do antagonista, é Nicole que nos conta que Charlie a traiu assim como, junto com Charlie que descobrimos que Nicole tenta a guarda integral do seu filho na justiça. Isso serve para que o público nunca sinta que conhece inteiramente os personagens e nunca confie demais em nenhum dos dois. 

A batalha judicial é o ponto de tensão entre os personagens. Trazida de maneira um pouco didática pelo primeiro advogado de Charlie, Bert (Alan Alda), que parece ser a única pessoa envolvida no processo que busca algum tipo de conciliação. A presença dos advogados na vida dos personagens é, na verdade, a principal representação dos seus subconscientes. Nesse ponto, dois atores experientes fazem funcionar muito bem essa relação, Laura Dern, que faz Nora, advogada de Nicole e Ray Liotta interpretando Jay, segundo advogado de Charlie. Os dois representam toda a falta de pudor na disputa que embarcam, não pela guarda do seu filho, mas por uma vitória final em um casamento fracassado. As disputas e exploração profunda de subjetividade causam alguns problemas de ritmo no longa, que se torna lento em alguns momentos, alguns monólogos apesar de bem executados são cansativos e a edição se perde em algumas cenas, deixando dúbia a intenção do diretor. Mas ao mesmo tempo que são problemas, esses são elementos usuais no melodrama, de onde Noah Baumbach tira inspiração para executar seus filmes.

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A narrativa se constrói em várias camadas, se apoiando nos trabalhos de Robbie Ryan (fotografia) e Randy Newman (trilha sonora), dois veteranos de Hollywood. A trilha sonora em piano é precisa, bem construída, o uso majoritariamente do piano é adequado ao gênero e é o principal elemento de desenvolvimento subjetivo, incluindo aí as músicas interpretadas pelos atores. A fotografia explora cada espaço para indicar o momento que seus personagens estão, se destacando a cena da negociação entre os advogados de cada um. A sala da advogada de Nicole é confortável e bem iluminada e a de Charlie é escura e causa incômodo, apesar de contracenarem em muitas cenas, a relação deles vai se juntando e separando em tela visivelmente conforme o momento de cada um na narrativa. Méritos ao diretor que usa os recursos técnicos para nos contar as nuances da separação e tentar criar no público as sensações confusas dos seus protagonistas. Esse é um grande avanço na sua filmografia, que costumava criar histórias de disputas com narrativas únicas que usavam de pouca contradição e muita ironia para explorar os fracassos pessoais dos personagens. Em “História de um Casamento” temos muita maturidade da parte do diretor ao nos deixar fluir entre os momentos de cada ator na tela. 

Um bom drama psicológico depende inteiramente da intensidade da reação que ele causa, da capacidade de nos fazer relacionar com os dramas e dilemas dos personagens e mesmo entendendo suas falhas de caráter nos fazer querer rir e chorar com eles. Nesse sentido, Noah Baumbach foi mais competente do que nunca, abrindo mão dos caminhos fáceis e intelectuais para uma história mais universal e profundamente triste, que lida com experiências mais duras e mesmo assim é capaz de tirar bons e inspiradores momentos, nos fazendo embarcar na jornada de personagens muito humanos lidando com seus sentimentos e frustrações. 

7.5

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